Quem só tem o martelo da justiça social pensa que tudo é prego de política identitária. Pelo menos é o que a ex-secretária de Estado americana Hillary Clinton deixou claro dias atrás.
Enquanto promovia seu novo livro, The Book of Gutsy Women (“O livro das mulheres de fibra”, ou “corajosas”), escrito em parceria com a filha, Chelsea Clinton, a ex-candidata à Presidência explicou por que elas decidiram não incluir a ex-primeira-ministra britânica Margaret Thatcher: ela não fez o suficiente no cargo para quebrar barreiras em prol das mulheres.
Quando questionada sobre a ausência de Thatcher por uma confusa Emma Barnett, Hillary disse, a respeito da primeira mulher a ser premiê do Reino Unido, que “em nossa opinião, ela não se encaixa na outra parte da definição de ‘mulher de fibra’, que é derrubar obstáculos para as demais e tentar fazer uma diferença para o bem”.
Talvez as Clintons ignorem o currículo de Lady Thatcher, ou talvez simplesmente não estejam nem aí. De qualquer forma, esnobar Thatcher desse jeito não seria, podemos dizer, deplorável?
Se Thatcher tivesse defendido as causas e partidos “certos”, seu legado estaria sendo celebrado pela esquerda agora?
Uma olhadinha nos livros de história basta para demolir a fraca argumentação de Hillary. Quando Thatcher assumiu o poder em Londres, em 1979, o Reino Unido, assim como os Estados Unidos na mesma época, estava atolado em uma época ruim para a nação. O desemprego estava alto, o orgulho nacional estava em baixa e a ameaça soviética continuava presente como nunca.
Foi a liderança de Thatcher que causou uma virada radical. Entre 1979 e 1997, quando os trabalhistas retomaram o poder, a classe média britânica cresceu 17 pontos porcentuais, a posse de residências subiu 18 pontos e o número de trabalhadores por conta própria dobrou. No cenário internacional, Thatcher ficou famosa por sua parceria com Ronald Reagan, revigorando o relacionamento especial entre Estados Unidos e Reino Unido. Juntos, Reagan e Thatcher enfrentaram a União Soviética e colocaram Moscou de joelhos.
Thatcher não se dobrou diante da intenção da ditadura argentina de violar a lei internacional ao invadir as Falklands, território britânico. Ela resistiu aos burocratas da União Europeia e lutou incansavelmente pela soberania e autodeterminação britânicas. E, enquanto Clinton alegou (falsamente) em 2008 ter pousado “sob fogo de franco-atiradores” na Bósnia, em 1996, Lady Thatcher sobreviveu a um atentado real contra sua vida em 1984, no ataque a bomba em um hotel de Brighton.
É este legado que as Clintons acham indigno de ser incluído em seu livro sobre mulheres corajosas. Mas, mesmo pelas regras desenhadas pela dupla, Thatcher se encaixa, sim, na definição de “mulher de fibra”.
Depois de perder as primárias democratas em 2008 para Barack Obama, Hillary disse a seus apoiadores que, “embora não tenhamos conseguido quebrar aquele teto invisível, alto e rígido desta vez, graças a vocês conseguimos 18 milhões de rachaduras nele. E a luz está brilhando por elas como nunca antes, enchendo-nos de esperança e certeza de que o caminho será mais fácil da próxima vez”. Em 2016, ao conseguir a indicação democrata para disputar a Casa Branca, ela afirmou na convenção nacional do partido: “Ainda não posso crer que tenhamos aberto a maior das rachaduras nesse teto”. De fato, um tema central de sua candidatura foi justamente esse.
Pois uma parte central do legado de Thatcher foi exatamente colocar abaixo esse teto. Após a morte da britânica, em 2013, a ex-primeira-ministra canadense Kim Campbell – a primeira chefe de Estado do Canadá – afirmou a seu respeito, talvez melhor do que ninguém: “Eu acho que ela realmente abriu um espaço para que, em outras nações, as mulheres sejam consideradas confiáveis para liderar, mostrou que há coisas que não é preciso ceder, desmentiu a ideia de que não é possível ser dura e ao mesmo tempo feminina, ou de que, de alguma forma, não se é realmente uma mulher quando se quer liderar um país, ou estar preparada para mandar gente para a guerra. As coisas não são assim, e ela mostrou isso de uma vez por todas”.
Então, com base em que as Clintons negam a Lady Thatcher o reconhecimento mais básico? Como disse meu amigo e colega Nile Gardiner à Fox News, a resposta parece ser “preconceito e intolerância esquerdistas”. Thatcher, afirma ele, “sem sombra de dúvida é a mais importante líder dos tempos modernos, anos-luz à frente”, uma líder que “teve impacto incrivelmente positivo não apenas para as mulheres, mas para todo mundo, o povo britânico e todas as pessoas no mundo livre”.
De fato, e você há de se perguntar: se Thatcher tivesse defendido as causas e partidos “certos”, seu legado estaria sendo celebrado pela esquerda agora?
Felizmente, ainda hoje milhões de pessoas mundo afora, especialmente nos Estados Unidos e no Reino Unido, se lembram desse legado e lutam todo dia para continuar o trabalho que ela iniciou. Sua bravura foi sem igual; sua liderança, inquestionável; seu legado, jamais apagado.
O mundo reconhece isso. É lamentável que as Clintons tenham escolhido ignorá-lo.
John Cooper é gerente de comunicações sênior do Instituto Davis para Segurança Nacional e Política Externa da Heritage Foundation e foi oficial da Força Aérea dos Estados Unidos entre 2010 e 2014.
Tradução: Marcio Antonio Campos. © 2019 The Daily Signal. Publicado com permissão. Original em inglês.
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