No cenário político-institucional há toda uma discussão acerca das condições gerais dos municípios, dada sua importância no processo de desenvolvimento econômico e social e por ser tema que percorre a história do país.
Não se desconhece a relevância das células municipais, a grande influência de suas ações e seu compromisso com a sociedade. No entanto, em que pese o discurso, as reverências oportunistas e a retórica continuada, especialmente em período eleitoral, há uma realidade que, de maneira recorrente, acaba por desnudar problemas que são em geral relegados a um esquecimento conveniente.
Deveras, é triste que os gestores municipais tenham que se submeter à vassalagem política em Brasília, a marchas comprometedoras e a reivindicações que, via de regra, são sintomáticas e geralmente transferidas para época oportuna, num claro amesquinhamento da atividade política.
Nesse contexto, é preciso resolver de vez a questão do aumento porcentual das transferências do Fundo de Participação dos Municípios. A demora em se desatar assunto de tamanha magnitude, além de representar omissão política do Congresso e da União, acaba por gerar descontrole nas finanças locais, pressionadas pelo desmesurado crescimento das demandas sociais. É difícil encontrar cidade em que não há visível descompasso entre disponibilidades financeiras e prestação de serviços públicos, agravado pela impossibilidade de geração própria de receitas em face do baixo nível de renda da população.
Num resumo sintético de propostas, é preciso aprovar rapidamente o Fundeb, instrumento fundamental de política educacional e que representa a garantia de maior aporte de recursos financeiros nessa área estratégica, a ampliação do espaço do aprendizado, a redefinição de conceitos e a maior agregação de pessoas envolvidas, tanto de profissionais como de população escolar. Esse Fundo será a argamassa de sustentação do avanço da educação e por isso, mesmo, sua procrastinação é uma afronta ao estrato social.
Outra questão relevante é a necessidade de se definir critérios objetivos e limite anual para o pagamento de precatórios. Esses gastos, decorrentes geralmente da imprecisão decisória do Estado, estão adquirindo volume assustador, abalando o orçamento e causando sérias preocupações na programação de despesas.
Por seu turno, os dispêndios com saúde, por sua transcendência e implicações nas camadas sociais, necessitam ser devida e objetivamente regulamentados. Há dúvidas conceituais, áreas abrangidas, problemas logísticos e de interpretações unilaterais, o que acaba repercutindo nos limites porcentuais de aplicações e nas contas do setor.
Na construção de políticas de sustentação dos municípios, é oportuno defender a isenção do ICMS para a aquisição de máquinas e equipamentos. A desoneração da incidência tributária sobre esses bens permitirá maiores investimentos para melhorar a qualidade dos serviços públicos, ampliar o desenvolvimento urbano, abrir caminhos para a modernidade e evitar a legitimação do atraso. Malgrada essa constatação, é urgente, igualmente, a edição de legislação simplificada para a aquisição de bens e contratação de serviços para os pequenos municípios. É difícil conceber que a norma aplicada seja linear para todo o universo municipalista. As disparidades regionais, os fatores econômicos, as diferenças e dificuldades operacionais são evidentes demais e próprias de um país continente como o Brasil. Refletem, sobretudo, desigualdades flagrantes e possibilidades díspares. É necessário, portanto, razoabilidade e visão concreta da situação, para se evitar o engessamento da administração e a consagração do abuso legiferante.
Por isso a causa municipalista deve se constituir em prioridade da política governamental. Os rumos do avanço democrático e dos indicadores econômicos transitam necessariamente pelos municípios, raízes reconhecidas da nacionalidade e da afirmação político-social.
Rafael Iatauro é advogado, conselheiro aposentado do Tribunal de Contas do Paraná e chefe da Casa Civil.