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Dia da Logística: temos algo a comemorar?

Sabia que existe um dia dedicado à logística? No dia 6 de junho é comemorado e a origem da data deriva-se as operações militares e de guerra. Foi justamente nessa dia, no ano de 1944, que as forças aliadas desembarcaram na Europa, onde possivelmente ocorreu o maior movimento logístico já conhecido da história, o dia conhecido como Dia D. É história e é bom lembrá-la, mas como profissional da área, frequentemente, sou abordado por alguns questionamentos. A logística está evoluindo? Nosso país está evoluindo? Quais são os nossos principais desafios? Para responder aos questionamentos, vamos retroceder para uma época não muito distante, em que a maioria trabalhou ou trabalha com pessoas dessa época, vamos à década de 80.

O Brasil vivia um momento de inflação alta, recessão mundial e reserva de mercado, a tecnologia que encontrávamos lá fora tinha uma grande barreira de entrada em nosso país. Nesse cenário, que também não tinha uma concorrência interna ou externa forte, os desperdícios na cadeia produtiva não eram destaques, pois o foco era direcionado para as operações financeiras, cujo rendimento ditava o resultado das empresas. A aplicação financeira chamada over night chegou a render mais de 3% em um único dia, isso acontecia no fim do governo Sarney. Entre o final dos anos 80 e início dos anos 90 começou, sem grande alarde, um movimento de várias empresas bem posicionadas estrategicamente, que começaram a falar mais intensamente no tema logística. Não dizemos que não havia logística antes, apenas que o conceito era realizado de forma mais intuitiva do que planejada. Bem, nesse período começou um trabalho de padronização no mercado em que o destaque foi o surgimento do bom e famoso, Palete Padrão Brasil (PBR) em 88, criado em conjunto com a Abras (Associação Brasileira dos Supermercados) e com o GPD (Grupo Palete de Distribuição), logo depois vieram o grupo ECR Brasil e tantos outros, que ajudaram o mercado a padronizar os processos, operações e as trocas de informações.

Na segunda metade dos anos 90, o conceito de logística integrada ganha força e grandes universidades no mundo começam a dar mais "musculatura" para as disciplinas de logística, e, nessa fase, o professor Douglas Lambert criou um diagrama famoso até hoje, com os conceitos de trade off de custo e a interface entre logística e marketing. Ainda naquela década, inicia-se a divulgação do rastreamento via satélite nos veículos com a entrada da Autotrac no mercado nacional, que originalmente, tinha uma proposta de controle logístico para o equipamento onde fosse instalado, mas com o decorrer do tempo, foi adaptado para um instrumento indispensável de gerenciamento de risco. Soma-se a este histórico do segmento, a consolidação de termos no mercado, tais como: Cross Docking, CDA (Centro de Divulgação Avançada), WMS, TMS.

Contudo, nossas escolas ainda não preparavam profissionais para esse novo mercado e encontrávamos estudos mais específicos, apenas nas cadeiras de pós graduação. Passada a década de 90, entramos no novo milênio com novas tecnologias e as grandes corporações começaram a implantar ERP integrados como o SAP, Oracle e Microsiga. Obter dados começou a deixar de ser um problema e o foco passou para a forma como seriam tratadas as informações. Tenho muitos conhecidos que celebraram quando uma nova versão do Excel começou a ler mais de 65 mil linhas. Nos anos 2000, as faculdades já apresentavam cursos de graduação na área de logística e os cursos e seminários especializados multiplicavam-se por todo o Brasil. Toda esta dinâmica foi positiva, mas o conceito de logística continuou evoluindo e passou-se a analisar toda a cadeia de abastecimento. Nos últimos 30 anos, o mercado se mobilizou e trabalhou muito no sentido de valorizar profissionais, buscar boas práticas (algumas internacionais) e aperfeiçoar conceitos. Quem acompanhou e vivenciou essas décadas viu uma evolução constante nos processos e profissionalização do mercado, porém, quando olhamos para a infraestrutura, o negócio é totalmente diferente.

O governo não fez a parte dele e não trabalhou no mesmo ritmo. Faltam estradas, planejamento urbano, segurança, apenas para dizer alguns pontos. Cidades como Rio de Janeiro e São Paulo vivem um verdadeiro caos urbano e a distribuição física já chega a ser mais cara do que no interior de seus estados, por onde a distância percorrida é maior. Não estamos falando de sentimento e sim, uma constatação vivida por todos os profissionais de logística diariamente. Essas situações não são monitoradas somente no ambiente doméstico. Recentemente, em uma pesquisa realizada pelo Banco Mundial, constatamos o resumo de nossa inoperância na infraestrutura logística nacional. O Brasil caiu 20 posições no ranking mundial do índice de logística. Esse índice avalia vários fatores para montar o ranking geral – qualidade da infraestrutura de transporte, de serviços e a eficiência do processo de liberação nas alfândegas, rastreamento de cargas, cumprimento dos prazos das entregas e facilidade de encontrar fretes com preços competitivos. Podemos concluir que por um lado temos muito o que celebrar com os avanços da área. Fizemos profissionais mais preparados, aperfeiçoamos a forma de atender um país com dimensões continentais. As empresas tornaram-se especialistas no trato e na prevenção de atividades criminosas com processos de gerenciamento de risco mais robustos. Contudo, na mesma medida temos muito a lamentar quando olhamos a evolução de nossa infraestrutura e todos os gargalos que somos submetidos diariamente. Os desafios são muitos e não deixa de passar por uma pressão maior do Estado brasileiro para concluir os projetos que resolveriam os gargalos logísticos, tanto do ponto de vista de investimentos quanto de legislação. Porém, como profissionais da área, não devemos transferir os nossos desafios, exclusivamente, para outros segmentos. O foco deve ser sempre de buscar novas alternativas para transpor as dificuldades diárias. Entre as boas alternativas para superar os desafios, a educação deve ter um papel fundamental. Melhoramos muito a quantidade de graduações, mas é hora de melhorar a qualidade dos cursos e seguirmos em frente. O Brasil é o país do futuro? Sim, mas esse futuro já chegou.

Rogério Torchio, diretor da Prosperity Consulting

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