Escolas, professores e alunos envolvem-se cada vez mais em atritos, e muitos deles terminam sobrecarregando nosso já superlotado sistema judiciário, e não por desavenças envolvendo desacordos trabalhistas, ofensas raciais e outras questões de fundo, mas por desentendimentos sobre diferenças partidárias, de opiniões políticas, de avaliações educacionais – em suma: pequenas querelas domésticas que poderiam perfeitamente ser resolvidas com um pouco mais de paciência e bom senso de parte a parte.
Aparentemente, esquecemos que a primeira regra de convivência é baseada na gentileza, no ouvir os demais com empatia e falar com amabilidade, no expor pontos de vista que, embora divergentes, não firam suscetibilidades. Firmeza não é sinônimo de deselegância ou grosseria.
Quando essas regras simples não prevalecem, é ainda possível apelar para a moralidade, já que ela representa o conjunto de valores, individuais ou coletivos, universalmente reconhecidos como norteadores das relações sociais e da conduta dos homens, ou seja, os princípios éticos que organizam a vida das comunidades, definindo comportamentos desaconselhados ou permitidos.
O apelo aos profissionais do direito, em lugar de último recurso, termina sendo o primeiro em qualquer desavença
Não é o percebido atualmente: o apelo aos profissionais do direito, em lugar de último recurso, termina sendo o primeiro em qualquer desavença. Segundo Luís Roberto Barroso – em texto escrito ainda antes de se tornar ministro do Supremo no qual abordava a crescente judicialização da área da saúde –, a Constituição brasileira tem conquistado força normativa e efetividade, dado que a norma constitucional não está mais sendo considerada apenas parte de um documento meramente político, e sim como código normativo para aplicação direta e imediata por juízes e tribunais; e, portanto, os direitos sociais transformaram-se em plenos direitos subjetivos, que comportam tutela judicial específica. Mas este mesmo jurista observa que “o sistema, no entanto, começa a apresentar sintomas graves de que pode morrer da cura, vítima do excesso de ambição, da falta de critérios e de voluntarismos diversos”.
A ausência de diálogo, a inexistência de adequada mediação, os ânimos acirrados têm provocado inúmeras crises escolares, com pais processando escolas, professores processando pais, acusações discente-docente em mídias sociais, e toda sorte de desentendimentos que terminam em tribunais pela incapacidade mútua de resolução nas esferas comunitárias.
Evidentemente, multiplicam-se os gastos, distorcem-se as capacidades educativas para defesas e acusações com auxílio de advogados ou defensores públicos, reduz-se o tempo dispendido na área educacional; o excesso de ações motivadas por incompreensões de parte a parte, pela dificuldade de encarar o dissenso e, muitas vezes, pela perda total da hierarquia ou senso de valor, pela dificuldade de aceitar (ou exercer) a autoridade sem que esta se confunda com autoritarismo, desorganiza a gestão escolar e impede, muitas vezes, que recursos públicos (como os Tribunais de Pequenas Causas) sejam corretamente utilizados pela comunidade.
Sem, portanto, desmerecer eventual necessidade de contenda fora do âmbito escolar, tem sido cada vez mais urgente exercitar a prática da conciliação, cada vez menos valorizada quando recorrermos à Justiça por todo pequeno problema.
A instituição de ensino sempre esteve imersa num caldo cultural típico de sua atuação, e nela a conversação ocupa lugar de destaque no convívio; é falando que professores, alunos e dirigentes transmitem seus conhecimentos, discutem os possíveis avanços tecnológicos e científicos, debatem temas e apresentam versões contraditórias das mesmas verdades, muitas das quais prevaleceram em determinadas épocas, porém hoje não valem mais, ou vice-versa. Assim, renunciar à mediação, ao colóquio, representa a destruição dos preceitos em que, teoricamente ao menos, baseamos nossas vidas e todo o arcabouço do sistema educacional.
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