Dialogar é preciso. Excelentes pautas nascem de um bom bate-papo. Conversar, sobretudo com os jovens, abre a cabeça e aponta caminhos. Eles são o presente que se faz futuro. Eu, pessoalmente, converso muito. Só é capaz de opinar, sem pontificar com altivez ou fulminar com radicalismo, quem está disposto a ouvir com interesse.
Compartilho com você, amigo leitor, o texto de um jovem promissor. Gosta de escrever. Tem potencial. Envia-me suas crônicas com regularidade. Quer submetê-las ao crivo da experiência que ainda lhe falta. Batemos bons papos. É um leitor voraz. O gosto pela literatura foi estimulado por professores do colégio Catamarã, uma iniciativa educacional e pedagógica moderna e muito interessante. O texto de Lucas Brasil, meu jovem amigo, pautou este artigo.
“Em visita à Zona Franca de Manaus”, escreve Lucas Brasil, “poucas atrações capturaram tanto minha atenção quanto um instituto técnico no qual produtos eletrônicos e eletrodomésticos eram montados e testados em relação à durabilidade, resistência e outros aspectos. Em conversa descontraída com um dos engenheiros do instituto, levantei um questionamento sobre a obsolescência programada, prática adotada por empresas (geralmente multinacionais) para que a lucratividade de seus produtos seja impulsionada em detrimento de sua durabilidade. Em suma, alguns bens de consumo são produzidos para se desgastarem com facilidade, sendo substituídos e gerando mais receita para a companhia. É a causa central da famosa frase: antigamente as coisas duravam mais.
Alguns bens de consumo são produzidos para se desgastarem com facilidade, sendo substituídos e gerando mais receita para a companhia
O engenheiro afirmou que essa prática é uma realidade cruel na indústria: Os funcionários são instruídos, testando os protótipos em câmaras térmicas e cinéticas, a construírem a estrutura dos eletrônicos com períodos mínimos e máximos de durabilidade. Computadores pessoais, por exemplo, são montados para durarem 5 anos, enquanto smartphones devem durar 2 anos.
A exposição a todas essas informações e ideias resultou na constatação de que os atos de descartar e substituir tornaram-se automáticos e banalizados. Coisas que podiam ser duradouras e de firme estrutura servem ao seu propósito de forma medíocre e por curto período em nome do dinheiro e da competitividade mercadológica.
Esse problema já é suficientemente grave por si só, mas minha percepção é que a Cultura do Descarte não se restringe apenas às indústrias e ao comércio, mas atinge também um aspecto fundamental da vida humana: as relações interpessoais. Tomemos aqui como exemplo os relacionamentos românticos entre homem e mulher: namoros e casamentos.
Em épocas de Tinder, pornografia generalizada e hipersexualização, as relações também são criadas com obsolescência programada: muitos namoros nascem com número de série e data de validade. Pessoas são usadas como produtos, como meios para satisfazer uma necessidade ou aumentar o conforto. Após a concretização desses objetivos, o usuário se desfaz do companheiro, partindo para o próximo e reiniciando esse ciclo interminável.
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Cegos por seus egoísmos e cada vez menos dispostos a resolver as questões que afligem matrimônios e namoros, os casais preferem a solução fácil e confortável: o término e o divórcio, que são muitas vezes prejudiciais aos filhos e à situação financeira e econômica do casal.
Além disso, esse descarte e reposição compulsivos acarretam muitas outras questões que influenciam muito na saúde da sociedade e da civilização como um todo: explosão da gravidez na adolescência, avanço no número de portadores de DSTs, aumento de abortos e a falta de humanidade nos relacionamentos.
Ver o parceiro como um ser humano, composto de corpo e alma, e respeitá-lo por isso, é essencial. A visão materialista resulta na percepção do homem como apenas um corpo. E, se o homem é apenas um corpo, pode ser, assim como uma garrafa de refrigerante ou um computador que pifou após um ano e meio de uso, descartado”, conclui Brasil.
Achei sensacional. Um adolescente é capaz de fugir da mesmice, escrever um bom texto e argumentar com articulação. Sua crônica mostra uma juventude que está na contramão das algemas politicamente corretas. Pensa e escreve com liberdade.
Ouvir os jovens é preciso!
Carlos Alberto Di Franco é jornalista.