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Distribuição de remédios contra o câncer desafia seguradoras

Embora a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) há algum tempo já viesse estudando essa possibilidade, e no Congresso esteja em trâmite projeto de lei que caminha na mesma direção, deve ter sido uma "grande surpresa" para as empresas de planos de saúde a decisão da agência reguladora em obrigá-las a fornecer a seus beneficiários em tratamento oncológico nada menos que 36 medicamentos orais para tratar diferentes tipos de câncer. Até então, vale lembrar, as operadoras estavam obrigadas somente a cobrir os medicamentos ambulatoriais.

A decisão da ANS impacta, de forma distinta, todos os públicos vinculados ao tratamento do câncer. Para uns, de forma muito positiva; para outros, nem tanto. São várias as razões que motivam essas diferenças de percepções, mas não temos como abordá-las sob todos os ângulos de que gostaríamos. Porém, aproveitando experiências levadas a cabo nos Estados Unidos, onde já ocorre a distribuição desses medicamentos, considero importante a reflexão de alguns pontos.

Estudo publicado na Oncology Business Review de março de 2008 (a defasagem de tempo não invalida a lição) e assinado por Jessica Wapner mostrou que entregar o medicamento ao paciente e deixar que ele mesmo administre o consumo conforme prescrição de seu médico não produz o resultado desejado. Foram constatados problemas sérios de aderência ao tratamento, assim como ausência de estrutura nos consultórios médicos para monitorar, na casa dos pacientes, o uso correto dos agentes orais. De acordo com o estudo, muitos oncologistas deixaram de prescrever os agentes orais por causa do risco de não aderência ao tratamento por parte dos pacientes.

A hesitação dos oncologistas em prescrever os agentes orais, mostra o estudo do OBR, afeta de maneira contundente a indústria farmacêutica, que gasta milhões desenvolvendo as formulações, e as empresas de planos de saúde, que terão seus custos ampliados pela não aderência ao tratamento por parte de seus beneficiários. Neste sentido, sem dúvidas o cenário é cinza, e parece que nos deixa numa encruzilhada. Sorte que o estudo foi realizado há cinco anos e as lições que deixou (conforme frisei acima) apontam para soluções eficazes nos dias de hoje.

A determinação da ANS deve entrar em vigor a partir de janeiro de 2014. Até lá as operadoras de saúde têm de estar devidamente estruturadas de forma a atender com qualidade e eficácia a nova determinação. A ANS não definiu a forma de distribuição dos medicamentos, função que ficará a cargo das próprias operadoras. Até onde se sabe, estão em estudo duas possibilidades: a primeira é a entrega direta ao usuário, por meio de farmácias conveniadas; a segunda, por reembolso do recurso dispendido na compra do medicamento. O trabalho desenvolvido pela OBR mostra de forma cabal que as duas opções de distribuição dos medicamentos que estão sendo avaliadas pelas operadoras de saúde apresentarão os mesmos problemas detectados pelo estudo em 2008, nos Estados Unidos: a falta de aderência ao tratamento pelo paciente.

A solução encontrada no mercado americano, e que também já é oferecida no mercado brasileiro, foi destinar o controle sobre a distribuição dos agentes oncológicos orais a empresas especializadas no benefício-farmácia e que também oferecem o serviço de supervisão do tratamento, função não encontrada nas farmácias de varejo. Adicionalmente, de acordo com o estudo da OBR, o gerenciamento da terapia medicamentosa e de programas de acompanhamento instituídos pelas empresas especializadas nessa área requerem protocolos específicos de tratamento, que aumentam sua eficácia e garantem a segurança do paciente.

A experiência nos EUA, além de servir como alerta, aponta caminhos interessantes que merecem ser avaliados pelas operadoras de saúde que operam no Brasil. A escolha certa pode lhes propiciar redução considerável de custos e tratamento oncológico mais seguro e potencialmente mais custo-efetivo para os seus beneficiários, vindo a colher de fato os frutos que a iniciativa pode oferecer aos pacientes com essa necessidade.

Gustavo Guimarães, médico infectologista e especialista em estudos clínico-epidemiológicos.

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