O abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes, dentre outras formas de violência praticadas contra estes, constitui-se numa das mais graves e atrozes violações de direitos humanos, sendo fonte de profundo sofrimento e de traumas que podem se estender por toda vida do vitimizado. E a investigação dos casos suspeitos de violência contra crianças e adolescentes, notadamente de natureza sexual (em todas as suas formas), por sua vez, é tarefa das mais complexas, que não pode ser relegada a pessoas ou profissionais que não possuam habilitação técnica específica para tanto, nem ser executada de forma improvisada, sem o devido planejamento e preparação das vítimas e suas famílias.
O abuso de crianças e adolescentes constitui-se numa das mais graves e atrozes violações de direitos humanos
É fundamental, portanto, a adequação ou mesmo a criação de programas ou serviços especializados, que estejam devidamente preparados para prestar, a qualquer momento, o atendimento qualificado a crianças e adolescentes que se suspeita tenham sido vítimas de violência, em especial de natureza sexual. Essa necessidade é justificada também pelo fato de as estatísticas demonstrarem que as violações de direitos infantojuvenis, sobretudo os crimes de natureza sexual, ocorrem com maior frequência justamente à noite, nos finais de semana e feriados, períodos em que muitos dos órgãos públicos encarregados do atendimento de crianças, adolescentes e famílias estão fechados.
Vale dizer que a obrigatoriedade da criação, pelos municípios, de programas e serviços com essas características já foi reconhecida inclusive pelo Supremo Tribunal Federal (STF), diante da constatação de que sua instituição constitui-se numa verdadeira exigência da Constituição Federal, que prevê, em seu art. 227, §4º, que haverá “severa punição” aos autores de crimes de natureza sexual contra crianças e adolescentes. Cabe ao poder público, tanto na esfera estadual quanto municipal, investir na qualificação e eventual contratação de profissionais, assim como na criação e adequação de espaços e equipamentos destinados à “escuta qualificada” de crianças e adolescentes vítimas de violência, assim como promover a articulação de ações entre os órgãos e agentes encarregados tanto da proteção das vítimas quanto da responsabilização dos vitimizadores, de modo a evitar a chamada “revitimização” e garantir que a coleta da prova ocorra de forma rápida (porém sem precipitação) e tecnicamente correta, assegurando sua validade em todos os processos e procedimentos que serão instaurados em relação ao caso.
Esforços neste sentido já vêm sendo despendidos pelo Poder Judiciário, que por força da Recomendação 33/2010, da Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça, tem criado “salas de depoimento especial” em todo o Brasil. Mas é preciso ir além, até mesmo para evitar que, até ser ouvida de uma forma qualificada pela Justiça, a criança ou adolescente seja ouvida repetidas vezes por pessoas despreparadas para tanto, o que pode trazer prejuízos à vítima, além de comprometer a qualidade da prova produzida. Afinal, o atendimento de vítimas de violência não está adstrito ao Poder Judiciário, e todos os profissionais que atuam na área precisam saber ouvi-las de forma adequada – ou deixar essa difícil tarefa para quem saiba.
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