Uma pesquisa realizada pelo Instituto Dataqualy mostrou: 75% do eleitorado de Dilma Rousseff em Salvador se arrepende do voto dado a ela. O Ibope, por sua vez, estima que apenas 9% da população brasileira considera o governo Dilma bom ou ótimo. É fato que muitos brasileiros se arrependeram de votar em Dilma. Mas, longe da autocrítica de alguns, especialmente dos mais fanáticos, a justificativa muitas vezes é: “você acha que se Aécio tivesse sido eleito a situação estaria diferente? Claro que não...”
Antes de dizermos o porquê de esse eleitor estar enganado, os nossos hermanos argentinos são um ótimo exemplo do que pode acontecer quando um candidato pró-mercado vence as eleições em um país que teve 12 anos de populismo. Mauricio Macri tomou posse no ínicio de dezembro de 2015. Com um mês de governo, Macri já tomou diversas medidas que afastam a Argentina do populismo com que Cristina Kirchner e seu marido, Néstor Kirchner, governaram o país nos últimos 12 anos.
Uma das primeiras medidas do novo presidente foi reduzir o imposto sobre a exportação do trigo e milho de aproximadamente 20% para zero. Essa medida beneficia os produtores nacionais e incentiva a produção de trigo e de milho, pois torna esses produtos mais baratos e mais competitivos. A segunda grande medida foi eliminar as barreiras às importações. Melhor do que controlar os institutos de estatística, como fez a sua antecessora, essa medida contribui para reduzir a inflação crescente no país, à medida que torna os produtos mais acessíveis à população.
Em seguida, o presidente colocou uma pessoa do setor privado para comandar uma das maiores estatais do país, a Aerolíneas Argentinas, para reestruturar a empresa. A empresa, estatizada em 2008, teve até então perda de aproximadamente US$ 2 milhões ao dia, segundo o jornal Clarín . Para mudar essa trajetória decadente, a escolhida foi a brasileira Isela Constantini, que antes ocupava a posição de CEO da General Motors para Argentina, Uruguai e Paraguai.
Mas, se Macri reduziu os impostos para exportações e importações, ele sabe que o governo terá menos receita e, portanto, menos verba para os gastos do governo. Mas ele não deixou de fazer a lição de casa. Para dar o exemplo, ele irá substituir os carros usados pelo governo (limusines da Audi) por carros mais baratos. Claro que não deixa de ser uma medida simbólica, mas importante para recuperar a confiança no governo.
Se pudéssemos resumir esse primeiro mês de governo Macri, poderíamos dizer que ele quis acabar com o modo de fazer política de alguns governantes populistas, que “pensam como Marx, governam como Stalin e vivem como Rockefeller”.
Todas essas medidas foram, no entanto, acompanhadas de muito diálogo com empresários, oposições e lideres regionais. O resultado é que mais de 40 empresas internacionais estão querendo voltar para a Argentina, como Louis Vuitton, Dolce & Gabbana e Calvin Klein. Desnecessário dizer que o mercado já espera que a economia volte a crescer vigorosamente. Tudo isso em pouco menos de um mês.
Mas... e Aécio Neves?
Não estamos dizendo que o candidato do PSDB seja o salvador da pátria, o messias que estávamos esperando. Pelo contrário: com disputas internas entre ele, Serra e Alckmin, Aécio não conseguiu unir totalmente o PSDB em torno de sua candidatura. Por vezes não teve um posicionamento firme quando era necessário, como no caso do impeachment. E não conseguiu se apropriar politicamente da maior crise política que o país vive nos últimos 30 anos. Feito esse necessário contraponto crítico, ainda é muito fácil afirmar que, se Aécio tivesse sido eleito, sem dúvidas o Brasil estaria melhor. Vejamos quatro grandes explicações.
A primeira é a do apoio dentro do próprio partido. Dilma, ao contrário de Lula, não conta nem sequer com o apoio dos petistas. A ala radical do partido confronta diariamente as suas medidas econômicas. O presidente do PT, Rui Falcão, a critica publicamente. E o próprio partido não apoia as suas escolhas de ministros. Caso Aécio tivesse sido eleito, não é exagero dizer que o PSDB estaria unido em torno das políticas a serem adotadas. Ainda que com certa dificuldade, Aécio tem liderança dentro do partido. Como um governo que não tem liderança, e que não possui nem sequer um vice-presidente que o apoia, pode aprovar medidas – sobretudo em tempos de crise?
A segunda razão está ligada à rotatividade de ministros. Não é exclusividade do PT utilizar alguns ministérios como moeda de troca por apoios. Mas, após 12 anos no governo, o PT vem utilizando esses ministérios para esses fins em níveis jamais vistos. Mesmo assim, com um governo extremamente desgastado, essa estratégia mostra-se sem efetividade alguma. O resultado disso é uma altíssima rotatividade nos ministérios, com eficácia tendendo a zero. Para dar um exemplo, no governo cujo lema é “Pátria Educadora”, somente em 2015 o Ministério da Educação teve quatro pessoas no comando da pasta: Cid Gomes, Luis Cláudio Costa, Renato Janine e Aloizio Mercadante – média de um ministro a cada três meses. Como pode um país levar a sério a educação e realizar mudanças de longo prazo quando um ministro passa em média três meses no cargo? O ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy durou menos de um ano no cargo. E o seu sucessor, Nelson Barbosa, a contar pelas críticas que já vem sofrendo do próprio PT, parece ter prazo de validade também.
Economia se baseia única e exclusivamente em confiança. E Dilma quebrou a confiança de todos (inclusive dos que votaram nela)
Caso Aécio tivesse sido eleito, como o PSDB não estaria sob esse desgaste, poder-se-ia esperar uma rotatividade muito menor nos ministérios. Armínio Fraga, o suposto ministro da Fazenda, teria carta branca pra tomar as medidas necessárias. E certamente estaria blindado das críticas internas do PSDB, algo que não vemos atualmente.
O terceiro fator é o da reação dos mercados. “Vocês plantam juros para colher inflação”, disse Dilma Rousseff a Aécio durante um debate eleitoral. Resultado é que hoje a inflação está em 11% e os juros, em 14,25%. Uma coisa marcou esse primeiro ano do segundo mandato Dilma: ela disse que governaria de uma maneira, mas governa de maneira totalmente oposta. Disse que não reduziria programas sociais e os reduziu. Disse que não aumentaria os juros e os aumentou. Para ficar em apenas dois exemplos. Há quem acredite que dê no mesmo – afinal, Aécio também adotaria políticas austeras, cortes de gastos, aumento dos juros etc. Mas há uma grande diferença entre a situação de Aécio e de Dilma. Economia se baseia única e exclusivamente em confiança. E Dilma quebrou a confiança de todos (inclusive dos que votaram nela).
Pode parecer mero detalhe, mas quebrar a confiança gera incertezas. Que empresário irá investir e ampliar a produção em um governo que altera as regras do jogo com a bola rolando? Que banco irá conceder crédito quando não consegue saber como estará o país em um ano? Caso Aécio tivesse sido eleito, não haveria quebra de confiança. Em seus discursos, em seus debates, as políticas de austeridade que o governo está tentando realizar já haviam sido anunciadas pelo candidato do PSDB.
E, por fim, há o caso do impeachment. Em 1.° de setembro, Hélio Bicudo, fundador do PT, protocolou um pedido de impeachment. Desde então (ou seja, há quatro meses e meio), Dilma e o PT não fazem outra coisa senão lutar contra o impeachment. Como um governo que apenas luta para se manter no poder tem condições de realizar as mudanças de que um país precisa para retomar o caminho do crescimento? O próprio vice-presidente Michel Temer – aquele que supostamente deveria ser o maior apoio de um presidente – escreveu uma carta de desabafo. A contar pelos meses seguintes, não nos parece que a situação mude muito.
Caso Aécio fosse eleito, é bem provável que não houvesse essa pressão vinda das ruas e dos próprios políticos. O novo governo poderia colocar todas as energias, portanto, no que realmente importa: tomar as medidas necessárias para melhorar a vida dos brasileiros e não apenas tentar manter o mandato.
E como isso afetaria em termos práticos a situação atual? Voltamos ao caso argentino. Mauricio Macri tomou posse há pouco mais de um mês. É fato que em um mês não há como mudar um país como um todo. Mas, em economia, tudo se trata de expectativas, e expectativas se mudam em apenas um discurso – para aqueles que têm credibilidade, claro! É o que Macri tem feito.
A realidade brasileira é que toda essa instabilidade política fez com que o câmbio desvalorizasse 35% em um ano. O real foi a moeda que mais perdeu valor em relação ao dólar. Uma suposta eleição de Aécio, claro, não evitaria a desvalorização do câmbio, uma vez que isso é uma tendência mundial à medida que o governo americano reduz os programas de estímulos fiscais. Mas não há a menor dúvida que essa desvalorização seria de uma magnitude muito menor, pois grande parte dela se refere à instabilidade política e aos ajustes fiscais que o governo não fez.
Um câmbio mais apreciado, no momento atual, pressionaria menos os preços dos importados, o que se traduziria em uma inflação menor, em vez dos 11% que temos. Uma inflação menor permitiria que o Banco Central deixasse os juros em níveis menores e não em 14,25% atuais. Juros menores tornariam alguns investimentos mais viáveis e permitiriam aos empresários investir mais. Mais investimentos significam mais empregos, mais consumo e um PIB maior, em vez da queda de 3,7% prevista para 2015. Com o PIB maior, a arrecadação do governo também seria maior e seriam necessários menos cortes que os R$ 25 bilhões cortados em gastos sociais.
Aquele, portanto, que diz que a eleição de Aécio não significaria muita coisa provavelmente está colocando maior peso na simpatia que tem pelo candidato do que em entender como funciona a economia como um todo. A estes, nada nos resta além de afirmar categoricamente: se Aécio tivesse sido eleito, a situação estaria diferente? Sem sombra de dúvidas! O Brasil estaria crescendo já em 2015 e 2016 cerca de 2,5% ao ano, o seu PIB potencial? Não – seria desonestidade intelectual dizer isso. Mas, sem dúvida, o país teria uma recessão muito mais amena, e a luz do fim do túnel (que ainda não vemos) estaria muito mais próxima. Novamente, pode parecer mero detalhe, mas certamente não é essa a opinião de alguns dos 1,5 milhão de brasileiros demitidos em 2015.
Em tempo: troque “Aécio Neves” por “Marina Silva” e as conclusões serão praticamente as mesmas.