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Opinião 2

Educação, cultura e inundação

Todo início de ano temos uma visão panorâmica das consequências da falta de planejamento e atitudes de nossos administradores públicos. Junto com as festas e comemorações, somos bombardeados pelas notícias de enchentes, quedas de barreiras, pessoas que perdem suas casas, seus bens e até mesmo suas vidas. Ouvimos declarações cândidas, a culpa é posta no excesso de chuvas (como se isso fosse exceção e não regra), nos cidadãos (como se orientar a comunidade e manter bueiros limpos não fosse obrigação de quem administra as cidades) e nas maiores vítimas, as pessoas que moram em lugares insalubres e perigosos (como se isso fosse mera escolha pessoal).

Na área educacional também se prepara, há décadas, uma tragédia: na base de todo ato educativo exercido por professor, pai, dirigente corporativo, prefeito, vereador ou qualquer pessoa em posição de poder que sabe utilizá-lo para instruir, revela-se a concepção cultural do que significa educação. Nas políticas públicas voltadas ao setor, ainda mais.

Educação de qualidade, aquela capaz de propiciar o desenvolvimento da imaginação, interpretação do vivido e um bom exercício profissional, envolve não apenas alfabetização, incompleta e deficiente em nosso país, mas também a capacidade de compreender a si mesmo e ao entorno, além de desempenho satisfatório no trabalho. A isso denominamos cultura. Embora cada estudante já traga muito de sua formação cultural da vivência familiar, a compreensão das normas e dilemas éticos ao longo da história humana, o desenvolvimento da consciência moral e os conflitos recorrentes nos intercâmbios sociais podem ser trabalhados no âmbito escolar, para o compartilhamento da herança cultural pública, apurando seu capital cultural privado. A sociedade contemporânea é profundamente marcada pela multiculturalidade, e a disposição para o diálogo e comportamentos inclusivos tornam o olhar mais cosmopolita, essencial na integralidade da preparação para a vida extramuro escolar.

A ampliação cultural melhora o senso lúdico, aumenta a autonomia moral e intelectual, aprimora a convivência e, ao privilegiar a integração entre cada pessoa e seu meio social, garante a construção de relacionamentos solidários para a prática da cidadania. Dentro do contexto comunitário, investir na cultura propicia o aumento da capacidade de compreensão do outro, das outras formas de viver e desempenhar papéis sociais.

Num país em que livros são caros e, em muitas regiões raros – pela inexistência de livrarias ou bibliotecas públicas em grande parte das cidades brasileiras –; onde não há possibilidade de assistir a obras teatrais, concertos ou palestras de pessoas significativas da vida intelectual pela dificuldade de acesso e falta de verbas para custeio, é urgente a consciência de nossos novos prefeitos e vereadores empossados sobre o assunto.

Enquanto não tivermos clareza sobre a relevância destes tópicos para a educação das crianças, jovens e mesmo adultos, o Brasil estará fadado aos últimos lugares no rol dos países capazes de prover boa qualidade de vida a seus cidadãos, e repetiremos nesta área os mesmos erros de ausência de planejamento quanto às inundações.

Wanda Camargo, educadora, é presidente da Comissão do Processo Seletivo das Faculdades Integradas do Brasil (UniBrasil).

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