Distinguir proteção de superproteção é desafio para os pais, já que a linha que as separa é tênue. Vivemos em um mundo onde a violência penetra na escola, invade as noites e se abriga, inclusive, nos lares. Como, então, não cair na superproteção? As melhores intenções dos genitores nem sempre são suficientes, já que em matéria de educação, além de bons propósitos, muitas vezes são necessários conhecimentos específicos para que o processo educativo seja levado a bom termo.
O desenvolvimento humano ocorre em diversas dimensões: física, intelectual, socioemocional e espiritual, para falar nas mais abrangentes. Quando os pais são superprotetores em uma área, correm o risco de o serem nas demais; as pessoas com percepção de que o mundo é hostil e inimigo têm probabilidade de serem superprotetores.
A um bebê se dão a mamadeira e a papinha na boca, trocam-se fraldas, limpa-se o bumbum, calça-se o sapatinho e se o agasalha conforme a temperatura. Ocorre, contudo, que o neném cresce; seus ossos se fortalecem e ele ganha estrutura muscular, o que o leva a engatinhar, ficar de pé, caminhar, coordenar movimentos, aprender a falar. Haverá um momento em que se tornará capaz de pôr os próprios sapatos, amarrá-los, fazer sua higiene quando vai ao banheiro, vestir-se, comer usando talheres e uma série de atividades que sua estrutura muscular e neurológica lhe permitem; as crianças, chegadas a essa fase, precisam ser estimuladas a realizar essas ações e ganhar autonomia. Superprotetora é a mãe que continua fazendo pelo filho aquilo que ele é capaz de realizar. Ou o pai.
A mensagem dos pais superprotetores ao filho é a de que ele é incompetente para realizar determinada tarefa que a maioria das crianças já faz. E os sentimentos do filho serão de inferioridade, de incompetência, de falta de iniciativa.
Outro exemplo de superproteção é o pai que faz pelo filho as tarefas escolares, em vez de estimular nele a capacidade de resolver problemas, fazendo-lhe perguntas, dando-lhe dicas e trazendo questões semelhantes às que deve resolver – estratégias que abrem caminhos para o desenvolvimento intelectual e, também, para a autonomia intelectual, ou seja, o indivíduo aprende a encontrar respostas para as questões que suscita, inclusive indo à pesquisa, e não depender de terceiros.
Pais superprotetores darão sempre, ou na maioria das vezes, a solução para as questões que o filho propõe; pais protetores estimulam o filho com perguntas e pistas que o ajudem a encontrar a resposta; mas há questões (urgentes) que os pais precisam responder na hora.
Tomar decisões é outro terreno em que a criança progressivamente deve ser introduzida, sabendo que se torna responsável pelas mesmas. Exemplos de situações que ocorrem nos lares: em dia de frio a criança quer ir para a escola pouco agasalhada; quer fazer as tarefas escolares à noite, quando já está cansada; quer passar três horas por dia no smartphone etc. Nessas situações, os pais poderiam simplesmente concordar ou negar – estariam, assim, perdendo oportunidade de educação –, ou poderiam aproveitar a ocasião para ajudar o filho a avaliar as decisões possíveis em dada situação, os prós e os contras, vantagens e desvantagens, e consequências. O filho desenvolverá sua capacidade reflexiva e de análise que lhe permitirá perceber os valores embutidos em suas decisões, assim como riscos e consequências. Importante é aprender a decidir, com a ajuda dos pais, para exercer sua liberdade com responsabilidade.
Os genitores que decidem comumente pelos filhos, sem considerar idade e contexto, estão impedindo a eclosão da maturidade afetiva. Não se nega que, em casos de grande risco não percebidos pelo filho, ou de filhos com forte dose de rebeldia, os pais façam valer suas decisões e não a de seus tutorados.
A superproteção, também não é uma questão de tudo ou nada, mas de grau. Há pais mais superprotetores e outros menos superprotetores. Os filhos estão sendo criados para viver neste mundo e não em outro. Não podemos evitar todos os riscos, as dores que envolvem o processo de desenvolvimento. Podemos acompanhá-los amorosamente, analisando com eles as situações para desenvolver a capacidade reflexiva que os ajudará a exercer sua liberdade com responsabilidade, das quais precisamos ser exemplo para eles.
Jorge La Rosa é doutor em Psicologia Social, terapeuta de casal e família e professor universitário aposentado da UFRGS.