Candidato republicano à presidência, Donald Trump. durante discurso em Grand Rapids, no Michigan| Foto: Allison Dinner/EFE
Ouça este conteúdo

A expectativa acerca da desistência de Joe Biden em tentar sua reeleição nas eleições norte-americanas foi confirmada no último domingo, 21 de julho, após uma grande resistência por parte do agora ex-candidato democrata. Para além das críticas ao seu governo, o que se via nos últimos meses era uma questão de caráter mais humano do que político. O cidadão Joe Biden demonstrava em diversos momentos total incapacidade cognitiva para se manter no cargo político mais importante do mundo.

CARREGANDO :)

Preservar sua imagem significava realmente desistir das eleições. Em poucas horas, de uma pessoa teimosa, Biden passou a ser reverenciado por sua coragem, inclusive, com homenagens previamente preparadas. Em seu lugar, a expectativa mais provável é que assuma Kamala Harris, vice-presidente, que conta com o apoio da maioria do establishment do Partido Democrata.

Dissuadir o inimigo significa fazê-lo repensar em sua estratégia de ataque. O que Trump proporcionou em seus quatro anos de mandato foi exatamente isso

Publicidade

Independentemente do candidato escolhido pelos democratas para disputar as eleições, o que se configura nos EUA é uma disputa entre vencedores e vencidos no atual processo de globalização, liderado pela primeira vez por atores não ocidentais, como China e Índia. O modo como os norte-americanos enfrentarão essa disputa geopolítica é o que norteará a escolha de seu próximo presidente. Como ambos os candidatos estão ou estiveram à frente do poder, caracterizá-los e analisá-los não é uma tarefa para jogo de apostas.

Kamala Harris representa um grupo político que, após o fim de um desastroso governo republicano, liderado por George W. Bush, ascendeu ao poder por meio da liderança de Barack Obama, com a promessa de um maior engajamento do país frente aos dilemas vindos com a Crise de 2008 e a ascensão da China enquanto player global. O ativismo dos democratas contribuiu para que umas séries de conflitos continuassem ou surgissem, como ocorreu na Líbia.

Após o mandato de Donald Trump, quando o mundo enfrentou uma grande pandemia, Joe Biden, antigo vice-presidente de Obama, venceu as eleições e assumiu a presidência com uma política similar ao primeiro presidente negro dos EUA. Em seu mandato, a Europa se viu ameaçada com a invasão da Rússia na Ucrânia e os conflitos aumentaram no Oriente Médio, principalmente com a guerra entre Israel e Palestina. O mundo tornou-se mais inseguro com Joe Biden na presidência.

Por outro lado, a diplomacia superficialmente nacionalista de Donald Trump foi responsável por apaziguar diversas tensões ao redor do mundo. Vladimir Putin não fez ataques em seu governo, como fez antes e depois, em países como Geórgia e Ucrânia. Com ofensivas pontuais, o Oriente Médio não enfrentou uma crise como a que vem passando nesses últimos dois anos. Portanto, para além da caracterização pessoal que permeia o imaginário do político Trump, sua diplomacia foi calcada em acordos e coerções, que amorteceram tensões em diversas partes do mundo.

Na literatura clássica da guerra, de Sun Tzu a Clausewitz, a arte da guerra significa a instrumentalização da política pelos seus meios mais extremos. Dissuadir o inimigo significa fazê-lo repensar em sua estratégia de ataque. O que Trump proporcionou em seus quatro anos de mandato foi exatamente isso, quando transformou a diplomacia norte-americana que vinha cometendo erros crassos a partir das eleições e mandatos de Bush, Obama e Biden.

Publicidade

No cenário internacional contemporâneo, debater a participação ou não na globalização é irrelevante, pois esse processo já está incorporado no espírito do tempo de todos os lugares do planeta. Diante desse quadro, para além do debate identitário e superficial nas eleições acerca do homem branco contra a mulher negra, o que está em jogo é justamente quando e como o mundo viverá um tempo maior em paz.

Victor Missiato, professor de História do Colégio Presbiteriano Mackenzie Tamboré, analista político e Doutor em História.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]