Nós, economistas, somos obcecados por desvendar os fatores fundamentais na determinação do crescimento e desenvolvimento econômico. A razão para isso é que esse campo de pesquisa analisa o comportamento do ser humano enquanto indivíduo que se relaciona no mercado, ou seja: considerando todas as outras variáveis constantes, maior renda gera mais consumo, que, por sua vez, reflete-se em níveis mais elevados de satisfação e felicidade.
Essa relação entre renda, consumo e satisfação apontada pelos economistas não é tão restrita quanto possa parecer à primeira vista. As pessoas, em grande parte do mundo, inclusive no Brasil, têm uma grande demanda reprimida por moradia, vestimentas e alimentação, entre outros elementos básicos necessários à sobrevivência. Nessas regiões, uma pequena elevação da renda e do consumo tem um grande potencial em aliviar suas vidas sofridas.
Adicionalmente, a definição da palavra "consumo" é bem ampla. Por exemplo, a demanda por serviços de saúde que melhoram a vida da população de diversas maneiras é uma das que mais aumentam atualmente, sendo possível graças à elevação da renda per capita, pois o preço dessa categoria de serviços é bem elevado. Que cidadão não gostaria de chegar à terceira idade com saúde para aproveitar bem a aposentadoria?
O consumo também vem na forma de mais segurança não apenas de forma privada, ao contratar seguranças, instalar portões eletrônicos e cercas elétricas, mas sobretudo sob a forma de gastos em melhorias dos sistemas judiciário e de segurança pública. Em países onde esses sistemas têm um bom funcionamento, não é necessária a realização de gastos privados substanciais em segurança como na instalação de portões, grades e, muito menos, cercas elétricas e vigias.
Podemos pensar também na educação. Mesmo sendo um tipo de investimento, pois eleva a produtividade do trabalho, a educação também é uma forma de consumo. Não colocamos nossos filhos na escola pensando somente em seus retornos salariais futuros. Uma boa formação traz uma satisfação pessoal que vai muito além dos rendimentos, inclusive com potencial de redução da criminalidade quando existe um bom sistema educacional em nível nacional.
Poderíamos nos estender nos tipos de consumo que são decorrentes da elevação da renda e que levam a melhorias no nível de bem-estar social. No entanto, os exemplos citados são suficientes para entender o excesso de foco sobre os determinantes da renda (que gera consumo) por parte dos economistas.
O problema é que existem outros fatores tão importantes quanto a renda na determinação do nível de bem-estar social, mas que são praticamente desconsiderados nas análises econômicas, como aqueles ressaltados no relatório de felicidade global divulgado pela Organização das Nações Unidas (ONU). Alguns elementos considerados no relatório, além da renda per capita e saúde, são índices que tentam mensurar companheirismo (ter alguém em quem confiar), liberdade de escolhas, corrupção e generosidade. Poderíamos pensar também em fé em Deus e em vida após a morte, aceitação em relação às diferenças individuais e sociais, círculos de amizade, sustentabilidade ambiental, nível de estresse no trabalho, família e lazer, para citar alguns elementos importantes.
Portanto, os economistas, em suas análises voltadas para o nível de bem-estar social, precisam se concentrar mais em outros elementos importantes na sua determinação, visto que um dos nossos principais objetivos é justamente entender as determinantes do nível de bem-estar social, do qual a renda (que gera consumo) é somente um deles.
Luciano Nakabashi, doutor em Economia, é professor do Programa de Pós-Graduação em Economia Aplicada da FEA-RP/USP.