Sede do Ministério Público Federal do Paraná: força-tarefa da Lava Jato foi dissolvida em 1.º de fevereiro.| Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo
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Nesta semana a força-tarefa da Lava Jato foi oficialmente desfeita, e seus procuradores passaram a integrar outras frentes dentro do Ministério Público Federal. De alguma maneira, isso já era esperado e é até natural que forças-tarefas tenham prazo de validade. A realidade nos bastidores, porém, é mais cruel. Existe um bombardeio no modus operandi de combate à corrupção inaugurado pela Lava Jato que quer sepultar o legado da operação. Há sérios motivos para nos preocuparmos quando olhamos para o futuro do combate à corrupção no Brasil.

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Todos sabem que existe uma luta desigual no combate à corrupção em qualquer lugar do mundo: de um lado, corruptos e corruptores, que desviam anualmente bilhões do erário à custa do povo que sofre para pagar impostos. Do outro, quem luta para que isso não aconteça (prevenção) ou para trazer justiça aos que roubam (punição).

Depois de anos de força descomunal pró-persecução penal, entre 2014 e 2020, o pêndulo parece mudar de direção. Forças poderosas movimentam-se sorrateiramente nos bastidores, quase imperceptivelmente. A luta é desigual porque quem rouba paga os melhores escritórios de advocacia e tem as melhores estratégias de relações públicas e de comunicação. Relembremos apenas os últimos capítulos.

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Dias atrás, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski suspendeu o sigilo das supostas conversas entre procuradores e o ex-juiz Sergio Moro, trazendo à tona as discussões sobre a legalidade da Operação Lava Jato e, com ela, a gota d’água daqueles que querem sepultar o símbolo da luta contra a corrupção no Brasil. Também nesta semana, o líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), disse que um “casuísmo” da Lava Jato tirou a eleição de 2018 de Lula.

Há um necessário debate sobre garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa e, em última análise, do próprio Estado de Direito, que deve ser enfrentado sem paixões partidárias ou ideológicas. De fato, os fins não justificam os meios, e não faz o menor sentido combater a corrupção atacando a lei e a ordem. Porém, não acredito em qualquer mácula que leve a uma invalidação ou nulidade processual capaz de colocar em xeque a imparcialidade da Justiça, nem mesmo sobre as supostas conversas entre procuradores e o juízo da ação penal. As sentenças condenatórias passaram por um duplo (em alguns casos, quádruplo) grau de jurisdição, aferindo assim a lisura processual. E, se houver algum recurso aceito, que ótimo. Viva a democracia e as instituições!

Alguns ainda tentam deslegitimar a Lava Jato ao argumentar que a condução dos processos seguiu interesses político-partidários e atacou apenas um lado da corrente ideológica. Quem diz tal coisa certamente não compreende os princípios norteadores do direito processual penal, que determina que a jurisdição estabelecida na 13.ª Vara Criminal de Curitiba aplica-se a todos os processos conexos às denúncias na Petrobras, definindo assim a competência do juiz natural.

Além do mais, há aí uma questão lógica: se a Lava Jato supostamente atacou apenas um lado do espectro ideológico, não deveríamos ter mais forças-tarefas como a Lava Jato em vez de atacar a maior frente de combate à corrupção do país? Se ninguém em sã consciência defenderia a corrupção abertamente, por que tanta gente quer ver a Lava Jato sepultada?

Assim, repito: o que está em jogo é muito maior que questões pontuais de processualística penal. O legado da Lava Jato e o seu modelo de combate à corrupção estão em xeque. Se desejamos mitigar esse mal tão terrível que afeta a saúde pública, tira dinheiro da educação e de obras de infraestrutura, não podemos simplesmente ceder às estratégias de forças poderosas a quem a corrupção interessa. Caso contrário, a história da operação italiana Mãos Limpas se repetirá, transformando o cenário de corrupção de modo ainda mais desolador do que antes. Qualquer semelhança com a Mani Pulite não é mera coincidência.

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Daniel Lança é advogado, mestre em Ciências Jurídico-Políticas pela Universidade de Lisboa, professor convidado da Fundação Dom Cabral e foi um dos especialistas a escrever as Novas Medidas contra a Corrupção (FGV/Transparência Internacional).

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]