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Mediante doação em dinheiro aos fundos de proteção a crianças e idosos, os contribuintes do Imposto de Renda (IR) podem se beneficiar com redução do tributo, obedecendo ao limite de até 6% do imposto devido (3% para cada programa). Somente doações a instituições oficiais, fiscalizadas pelo Ministério Público, legitimam o incentivo fiscal, que deve ser pleiteado no formulário completo da declaração. A doação assegura redução do IR a pagar ou aumento do imposto a restituir do doador.
O assunto, de indiscutível importância social, ganhou mais relevância nos últimos dias em virtude dos trágicos eventos climáticos que devastaram o Rio Grande do Sul, atingindo milhares de gaúchos. Considerando que tais doações podem opcionalmente ser concentradas em uma determinada região do país, há um apelo maciço e crescente nas redes sociais para que esse gesto de solidariedade seja preferencialmente realizado em prol dos gaúchos. Concordo plenamente.
Urge que o governo federal edite uma norma incentivando os contribuintes do IR a um tipo extra de doação incentivada, visando exclusivamente à reconstrução do Rio Grande do Sul.
O espantoso flagelo no extremo sul brasileiro não se limita às imensuráveis perdas na agropecuária, no comércio, na indústria e nos setores habitacional e de serviços. O cenário apocalíptico do dilúvio é visto a olho nu. As perdas materiais serão sucedidas, de imediato e inevitavelmente, por outro drama severo, o social, envolvendo trabalhadores, empresários e as famílias dos gaúchos que, além de parentes, perderam a totalidade de seus bens.
Urge que o governo federal edite uma norma incentivando os contribuintes do IR a um tipo extra de doação incentivada, visando exclusivamente à reconstrução do Rio Grande do Sul. A legislação sobre as atuais doações com benefício fiscal aos fundos das crianças e dos idosos já compõe há muitos anos o conjunto das normas do IR. Não é novidade.
Esses recursos têm sua aplicação previamente estabelecida pelas entidades beneficiadas. Além disso, os resultados práticos da arrecadação por esses programas sociais não são expressivos. Há uma explicação óbvia para isso. Raros são os brasileiros que dispõem de renda para doar ou que apuram imposto elevado na declaração. Um contribuinte com imposto devido na casa de R$ 100 mil, por exemplo, no máximo seria incentivado a contribuir com apenas R$ 6 mil. Imposto devido é o resultado da soma dos rendimentos tributáveis menos as despesas dedutíveis.
Assim, sem prejuízo da manutenção das já referidas doações incentivadas, que contemplam programas espalhados pelo país, o drama gaúcho clama por um permissivo legal de caráter excepcional, com mais robustez na área do IR. No caso, seria bem-vinda uma medida eficaz à semelhança do que se fez em 1983, por ocasião das históricas enchentes no Vale do Itajaí, em Santa Catarina. À época, o governo federal criou um tipo específico de doação incentivada pelo IR, em socorro aos gaúchos. 80% dos municípios ficaram devastados pelas chuvas, principalmente Blumenau. Cidades ficaram ilhadas por mais de 30 dias. Foram registradas 49 mortes e 200 mil catarinenses desabrigados (64% da população).
O Brasil inteiro se irmanou com os catarinenses, como ocorre neste momento com o povo do Rio Grande do Sul. Pressionado por movimentos da população e campanhas da imprensa, destacando-se a Gazeta do Povo, o governo federal mandou a Receita Federal baixar uma instrução normativa (nº 72/83) nestes termos: “As contribuições e doações efetuadas em dinheiro, mediante depósito bancário, para socorro às vítimas das inundações, ocorridas no sul do País durante o corrente ano, podem ser admitidas como despesa operacional da pessoa jurídica ou abatimento da renda bruta da pessoa física doadora, na declaração de rendimentos do exercício de 1984”.
Note-se que a normativa acima transcrita não fez menção a limites. É o que hoje se impõe diante da tragédia que varreu o Rio Grande do Sul. Esse território fértil é a quarta economia do Brasil. Hoje, dia 13 de maio de 2024, as atividades economicamente vitais do estado estão seriamente comprometidas, incluindo a produção industrial e as operações aeroportuárias, com destaque para a interdição, há vários dias, do Aeroporto Internacional Salgado Filho, sem previsão de reabertura. Os registros oficiais apontam até aqui 147 mortes, 127 pessoas desaparecidas nas 447 cidades atingidas pelas cheias, centenas de feridos e quase 700 mil gaúchos fora de casa. Ao todo, são aproximadamente 2,1 milhões de seres humanos afetados.
Por tudo isso, cabe aqui mais um acréscimo no campo das doações incentivadas destinadas à recuperação econômica do Rio Grande do Sul. Na hipótese de contribuintes dispostos a doarem somas significativas à querência amada, superiores à renda bruta, de que forma o fisco poderia anuir a essa iniciativa? A resposta é simples e direta. Na área federal, inexistem empecilhos para considerar liberalidade dessa natureza como um empréstimo voluntário à União, convertendo-se o valor em bônus do Tesouro Nacional. Se no tempo da ditadura fiscal a nossa legislação fiscal era costumeiramente inundada com o famigerado empréstimo compulsório, exigindo-se dinheiro dos súditos para aliviar a secura das burras oficiais, hoje seria de lídima justiça permitir às pessoas físicas e jurídicas a liberdade de realizarem empréstimo voluntário ou emergencial à União, com tão nobre e salvadora finalidade.
José Alexandre Saraiva é advogado tributarista e foi colunista da Gazeta do Povo.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos