A nova legislação acaba com a figura do "laranja", ou seja, aquela pessoa que tem participação ínfima no capital social simplesmente para cumprimento das exigências legais
Foi sancionado pela presidente Dilma Rousseff, no último dia 12 de julho, o Projeto de Lei n.º 4.605/2009 que cria a empresa individual de responsabilidade limitada. O objetivo da nova legislação é criar uma empresa na qual uma única pessoa possa deter a totalidade do capital social, mantendo, contudo, sua responsabilidade limitada ao valor do capital social.
O projeto é de autoria do deputado federal Marcos Montes (DEM-MG) e a justificativa apresentada para a aprovação é a de que a responsabilidade ilimitada do empresário dificulta o desempenho eficiente da atividade econômica.
Além da segregação do patrimônio da empresa individual de responsabilidade limitada do patrimônio pessoal do empresário, esse novo tipo societário acaba com a necessidade da busca de sócios pelos empresários para a mera constituição de sociedade limitada.
Já existia forma societária semelhante à empresa individual de responsabilidade limitada, que é o empresário individual, mas na qual a lei não permite a segregação do patrimônio do empresário individual de seu patrimônio pessoal, o que, por si só, já é um desincentivo ao seu uso.
Nessa modalidade não há a distinção entre patrimônio pessoal e empresarial. Ambos se confundem, respondendo em conjunto pelas obrigações contraídas no exercício empresarial, seja ou não no interesse pessoal do empresário. Com a nova lei, essa confusão patrimonial deixará de existir, pois um dos pilares da nova legislação é justamente a divisão entre patrimônio pessoal e empresarial.
Dessa forma, a nova legislação acaba com a obrigatoriedade da pluralidade de sócios para que haja a responsabilidade limitada ao valor das quotas sociais, como acontece atualmente nas sociedades limitadas. Acaba com a figura do "laranja", ou seja, aquela pessoa que tem participação ínfima no capital social simplesmente para cumprimento das exigências legais necessárias à limitação da responsabilidade dos sócios à sua participação societária.
No entanto, cumpre observar que a empresa individual de responsabilidade limitada também estará sujeita à desconsideração da personalidade jurídica, para que possa vir o patrimônio do empresário a ser atingido nas hipóteses que a lei permite.
O instituto da personalidade jurídica vem sendo muitas vezes usado de forma arbitrária, expondo o patrimônio pessoal dos empresários de forma intempestiva e inadequada, já no ambiente legislativo atual, o que levou, inclusive, à criação do Projeto de Lei n.º 3.401/2008, que estabelece critérios mais objetivos para sua aplicação.
Existem certos requisitos para constituição da empresa individual de responsabilidade limitada. O empresário que esteja disposto a constituí-la deverá incluir a expressão EIRELI após a firma ou a denominação social da empresa. Além disso, a empresa deverá contar com um capital social igual ou superior ao valor de cem salários mínimos vigentes ao tempo de sua constituição. Por fim, o empresário poderá participar de apenas uma empresa individual de responsabilidade limitada.
Pairam dúvidas quanto aos fundamentos que levaram a restrições na nova legislação. A limitação do capital social a valor igual ou superior a cem salários mínimos se fundamentaria pelo fato de que uma empresa com capital inferior encontraria dificuldades em tomar crédito no mercado. Contudo, se o interesse do legislador é diminuir a informalidade que hoje toma conta de diversos setores da economia, seria mais eficiente que o governo criasse mecanismos que tornassem possível à empresa individual de responsabilidade limitada ter acesso a crédito, mesmo em um cenário no qual o seu capital social pudesse ser inferior a cem salários mínimos.
Da mesma forma, a limitação à participação do empresário a apenas uma empresa individual de responsabilidade limitada poderia ser mais bem explorada, já que, não raro, empresários possuem mais de um negócio. Da forma como a nova legislação foi aprovada, tais empresários estão fadados a constituir apenas uma empresa individual de responsabilidade limitada, deixando seus demais negócios no mesmo nível de informalidade em que se encontram atualmente.
Apesar das questões pontuais que ainda geram dúvidas com relação à nova legislação, o novo modelo é oportuno e poderá ter muitos adeptos, com destaque, principalmente, àqueles empresários que atuam de forma informal e sem a proteção conferida pela separação patrimonial e àqueles empresários que participam de sociedades limitadas pela mera obrigação legal da pluralidade de sócios para que haja segregação patrimonial.
Rafael Villac Vicente de Carvalho e Fernando Cavallaro Cruz são advogados do escritório Peixoto e Cury.
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