Para que não perca sua credibilidade entre a população e os dirigentes das universidades que lhe dão respaldo, o MEC deve dedicar máxima atenção à correção das falhas do Enem em suas próximas versões
Transformado em exame de ingresso às universidades públicas federais, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) continua sendo palco de infindáveis polêmicas. Em 2009 cadernos do Enem foram furtados poucos dias antes de sua aplicação, provocando a elaboração de nova prova e alteração nas datas de realização, com prejuízo de milhões de reais aos cofres públicos. Em 2010 a prova foi marcada por erros de impressão na folha de respostas, gerando uma inversão nos gabaritos que prejudicou todos os candidatos. Neste ano, alunos de uma escola de Fortaleza tiveram acesso antecipado a 14 questões da prova. O Ministério Público Federal do Ceará pediu a anulação dessas questões a todos os participantes, alegando o princípio da isonomia e o prejuízo causado aos milhões de estudantes que prestaram o exame. Entretanto, o Ministério da Educação (MEC) obteve decisão favorável da Justiça, conseguindo que as 14 questões fossem anuladas apenas para os 639 alunos do colégio envolvido no vazamento.
Na prática, tais disputas judiciais têm acarretado o adiamento da divulgação dos resultados, afetando o calendário de matrícula das instituições e, particularmente, gerando muita ansiedade e incertezas entre os vestibulandos. Perante os críticos, imprensa e pais de alunos, o MEC tem sido apontado como inexperiente e inepto em realizar o exame.
A dimensão do exame e sua logística, considerando sua aplicação a um universo de mais de 5 milhões de pessoas, têm sido apontadas como vilões. Especialistas afirmam que o processo deveria ser segmentado, com a aplicação do exame mais vezes durante o ano (isto deve ocorrer a partir de 2012, com o processo sendo realizado duas vezes), mas a um número menor de candidatos, o que diminuiria a ordem dos problemas. Deve-se ressaltar, entretanto, que tal segmentação não resolve, infelizmente, o problema de eventuais vazamentos, que prejudicam todo o contingente de candidatos.
Um outro aspecto ainda não muito debatido, mas de igual importância, diz respeito ao conteúdo e número de questões das provas. O Enem privilegia o raciocínio lógico na solução de suas questões, mais do que o conhecimento específico sobre um determinado assunto. Isso significa que um candidato com amplo conhecimento geral e bom raciocínio lógico seria capar de resolver boa parte das questões. Contudo, muitas instituições advogam uma prova mais dissertativa e com questões que cubram, de fato, conteúdos disciplinares específicos.
Apesar da preocupante situação é necessário, entretanto, apontar as vantagens do Enem, a começar pelo fato de os candidatos poderem agora realizar uma única inscrição e prova (com custo menor) e concorrerem a uma vaga em universidade pública em qualquer lugar do país. A mobilidade tem permitido aos estudantes optarem por cursos originalmente não disponíveis em seus estados. Além disso, o número candidatos/vaga aumentou significativamente entre as universidades que adotaram essa forma de seleção. Na UTFPR, por exemplo, de uma relação média candidato/vaga de 6,4 em 2008 verifica-se uma relação de 19,2 em 2011. Essa concorrência também é benéfica para as próprias universidades federais, pois obrigam seus dirigentes a melhorar seus indicadores com o objetivo de atrair os melhores alunos. Além disso, tal mobilidade abre espaço para a diversidade sociocultural no ambiente de estudos, permitindo aos próprios alunos, através da convivência com seus colegas, o contato com novas realidades, antes restritas ao âmbito local ou regional.
Apesar dos problemas, o MEC corajosamente tem insistido na continuação da aplicação do Enem. Entretanto, o próprio ministro da Educação, em recente pronunciamento na Câmara Federal, afirma que as fraudes continuarão a existir e que as autoridades e a Justiça devem tomar medidas rigorosas para restringir os problemas aos locais em que ocorreram. Finalmente, deve-se considerar que o exame ainda é um recém-nascido entre as formas de seleção de acesso ao ensino superior. Assim, para que não perca sua credibilidade entre a população e os dirigentes das universidades que lhe dão respaldo, o MEC deve dedicar máxima atenção à correção de suas falhas em suas próximas versões.
Alexandre de Almeida Prado Pohl, doutor em Engenharia Elétrica pela Universidade Técnica de Braunschweig, Alemanha, é professor associado da UTFPR.
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