Presidente Lula é recebido pela ex-presidente Dilma Rousseff ao desembarcar em Xangai, nesta quarta-feira (12)| Foto: Ricardo Stuckert
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Recentemente, Dilma, a ex-presidente que foi cometeu crime de responsabilidade, foi “impeachmada” e que destruiu a economia do país, virou presidente do banco político de desenvolvimento dos BRICS (NBD). Alguns dias depois, o ex-governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel, condenado a 10 anos por tráfico de influência e lavagem de dinheiro e que deixou o estado em dívida e os funcionários públicos sem receber o salário, foi nomeado presidente da empresa estatal EMGEA vinculada ao Ministério da Fazenda.

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Não se trata de casos novos e isolados e quem olha a composição das empresas estatais, ministérios, agências reguladoras, organizações internacionais, secretárias, conselhos etc. sabe muito bem disso. É o que o cientista político Raffaele De Mucci chama de "luxury parking", estacionamento de luxo. Uma prática comum no mundo inteiro, o "luxury parking" ocorre quando um político, ou um ajudante de políticos, em um período de baixa na carreira, que não consegue um emprego, que não ganha mais é premiado com um cargo de luxo. Nos casos citados, Dilma perdeu as eleições ao Senado por em Minas Gerais em 2018 e Pimentel não conseguiu se eleger deputado federal em 2022.

Depois de muitos anos em política, é difícil achar um emprego produtivo no privado e voltar a ser comuns mortais, trabalhar muito e ganhar pouco.

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Na União Europeia, muitos dos europarlamentares usam o Parlamento Europeu exatamente dessa forma. Popularmente, se fala “caíram para cima” ou “cabide de emprego”. Agora está se pensando em criar a figura dos “senadores vitalícios” exatamente para os ex-presidentes como Dilma e Bolsonaro. Similar à antiga prática romana do promoveatur ut amoveatur, promover para remover, quando um político, ou um técnico cometeu algum erro político, é preciso lhe dar alguma punição, tirá-lo dos holofotes e colocar outra pessoa no lugar e aí se dá uma "promoção", para acalmar a população, mas ao mesmo tempo reservando-lhe um tratamento glorioso.

É um termo muito usado em âmbito eclesiástico, ao ponto que o papa Francisco, em 2016, criticou a prática do promoveatur ut amoveatur do Vaticano. Foi também o caso do ex-ministro do Ensino, Weintraub, que foi mandado para o Banco Mundial depois de duras críticas ao STF. Nas províncias romanas, quando os governadores cometiam algum erro político, eram nomeados senadores para removê-los e liberar o cargo.

Às vezes, depois de passado o clamor da situação, esses políticos voltam no cargo original ou à sua pátria, reaparecendo nos holofotes ao passar de um cargo a outro. São as "portas giratórias". Coisa também comum no Parlamento Europeu, onde alguns ficam estacionados por um ou dois mandatos e depois voltam à política de seus países. Daqui o termo “estacionamento”, ou seja, temporário. "De luxo" porque os salários e o status são tais. Dilma ganha 290 mil reais por mês, Pimentel ganhará 42 mil reais e os parlamentares europeus recebem 54 mil reais por mês.

Esses três fenômenos (Luxury parking, promoveatur ut amoveatur e portas giratórias) se intersecam e fazem parte de uma questão mais ampla que é a profissionalização da política. A maioria dos políticos é ou se transforma em político de profissão, vivem daquilo, fazem isso para a vida toda. No mundo todo. Depois de muitos anos em política, é difícil achar um emprego produtivo no privado e é difícil voltar a ser comuns mortais, trabalhar muito e ganhar pouco. E aí querem/precisam de salário, cargos e poder. E em política a lealdade è recompensada mais que o "mérito". O mérito está exatamente em terem sido leais. Esse é o mérito da política, sempre foi e sempre será.

É um problema de accountability, a responsabilidade em política é muito mais diluída. Cometem erros, crimes, destroem a economia, mas não sofrem muitas consequências individuais. É porque as eleições são multidimensionais (tipo uma venda casada), votaram um candidato à Presidência da República pensando na democracia e nos pobres e levam o luxury parking junto. Não são os primeiros casos e não serão os últimos.

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Adriano Gianturco é coordenador do Curso de Relações Internacionais do IBMEC de Belo Horizonte.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]