Com o início da validade da Resolução 798 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), que proíbe a instalação de radares fixos ou portáteis novos em locais escondidos, gostaria de expor o contraditório. De maneira alguma quero defender, de forma contundente, que esses radares permaneçam escondidos – como muitos podem pensar –, mas creio que devemos praticar o exercício de dialogarmos, de forma sensata, sobre a maneira e o porquê de os radares permanecerem ocultos.
Em uma rodovia e nas vias expressas existem placas indicativas que informam a velocidade máxima permitida naquele trecho. Antigamente, a única forma de garantir a redução de velocidade em determinada via eram as lombadas físicas. Atualmente, vejo vias de limite máximo de 70 km/h, como a Avenida das Torres, em Curitiba, por exemplo, com grande parte dos veículos circulando muito acima do limite permitido, fora do horário de pico, quando não há congestionamento, é claro.
O que acontece na Avenida das Torres é o retrato do que ocorre em todo o Brasil – dentro das cidades ou nas estradas. Sabendo onde estão localizados os radares e lombadas eletrônicas, os motoristas diminuem as velocidades de seus veículos apenas ao passar por esses limitadores. Voltando ao contraditório, os radares ocultos obrigariam os motoristas a manter uma velocidade próxima da permitida, nem que seja por precaução, pois, para muita gente, infelizmente, a educação só acontece quando dói no bolso.
Na verdade, a questão vai muito além da educação no trânsito, pois envolve conceitos de honestidade e consciência da população. O mundo ideal seria aquele onde os motoristas entendessem que, quando está especificado em uma via que a velocidade máxima permitida é de 70 Km/h, todos devem trafegar constantemente nessa velocidade. É claro, estamos diante de um dilema, pois, se o objetivo é reduzir acidentes e atropelamentos, essa resolução do Contran ainda não é suficiente, pois são inúmeros os fatores que influenciam neste cenário, como condições das vias públicas, sinalização, passarelas, viadutos e condição dos veículos que trafegam nessas vias.
O questionamento que faço é se realmente a população está preparada para acatar as velocidades indicadas nas placas de trânsito. Esse questionamento leva a uma reflexão profunda de analisarmos, à luz do que presenciamos no nosso cotidiano, se a população está realmente preparada para esta nova realidade. Repito: não podemos deixar de avaliar se todas as pessoas envolvidas neste modelo proposto realmente interpretarão a resolução de maneira correta. No modelo de livre arbítrio, somos responsáveis por nossas escolhas e escravos das consequências.
Vejo como salutar a discussão deste modelo e levo sempre em conta o consenso. Precisamos encontrar na sociedade, na visão de especialistas e, principalmente, nas autoridades, um modelo realmente justo que consiga detectar o infrator e premiar os cidadãos que cumprem as leis de trânsito estabelecidas para, realmente, não se passar a percepção do que hoje denominamos de “indústria da multa”.
Cabe muito, hoje, a definição de parâmetros aceitáveis de condução desta transição – primeiramente, pela segurança da população, pois podemos, sim, abrir precedentes instáveis que poderão ocasionar muitos acidentes. Solicito a reflexão de todos para algo mais importante: a forma como os condutores interpretarão essa medida. Se houver, por parte da população, o entendimento de que se pode individualmente se manter a salvo o trânsito – seja ele urbano ou rodoviário – de forma sustentável, retiro as afirmações e me desculpo com o leitor.
Sady Ivo Pezzi Júnior, engenheiro civil, é consultor da SP Soluções Empresariais e professor da pós-graduação da Universidade Positivo.
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