A grande discussão que se inaugurou para as eleições de 2018 diz respeito à possibilidade de a Justiça Eleitoral indeferir sumariamente o registro de candidaturas daqueles candidatos, digamos assim, notoriamente ou sabidamente inelegíveis.
A questão nem é bem essa, na verdade, haja vista que é pacífica a orientação do TSE no sentido de que “As causas de inelegibilidade podem e devem ser examinadas de ofício pelo juiz, enquanto na instância ordinária, razão pela qual não há falar em decisão extra petita, ao argumento de que a impugnação ao registro não teria tratado da questão, sobretudo, porque garantidos os direitos constitucionais à ampla defesa, ao contraditório e ao devido processo legal” (Recurso Ordinário 152815, de 2014). O ponto nodal da discussão reside em outro aspecto, a saber: a possibilidade de, inobstante a previsão legal do artigo 16-A da Lei 9.504/1.997, se cassar o direito do candidato inelegível de fazer campanha.
A inelegibilidade decorrente de condenação criminal se aperfeiçoa automaticamente a partir da prolação da decisão condenatória colegiada
No caso de condenações criminais, a resposta deve ser positiva. É que, diferentemente das demais hipóteses de inelegibilidade mais recorrentes, a inelegibilidade decorrente de condenação criminal se aperfeiçoa automaticamente a partir da prolação da decisão condenatória colegiada, inexistindo a necessidade de o magistrado eleitoral proceder à cognição, ainda que mínima, do título judicial para se aferir outros requisitos. Ou seja, se o candidato não conseguir, até o momento do registro de candidatura, uma decisão suspensiva ou reformadora da condenação, à luz da sistemática do artigo 26-C da Lei das Inelegibilidades, arcará com a rejeição in limine de seu registro, o que pode ser feito em decorrência do artigo 332 do Código de Processo Civil, eis que existe jurisprudência consolidada a propósito da inelegibilidade da alínea “e” (condenação criminal), já não bastasse a clareza de sua redação.
Com o indeferimento, deve ser cassado o direito a fazer campanha. Isto porque, a prosperar tal cenário, no qual a inelegibilidade é indiscutível, a campanha se limitaria à condição jurídica do candidato impugnado. Mais que isso: significaria, em muitos casos, a utilização de dinheiro do contribuinte para a realização de uma eleição majoritária que necessariamente será renovada, haja vista a impossibilidade de assunção do segundo colocado, devido ao que prevê o artigo 224, parágrafo 3.º, do Código Eleitoral. Imagine-se tal cenário em eleições presidenciais, com a convocação do corpo eleitoral para um novo pleito em razão da inelegibilidade chapada do candidato eleito. Seria no mínimo escalafobético.
A sistemática da Lei das Inelegibilidades, no que decorre de imperativo constitucional categórico (artigo 14, § 9.º) e cuja redação foi avalizada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento das ADCs 29 e 30 e ADI 4.578, deve prevalecer sobre a redação do artigo 16-A da Lei 9.504/1997, o qual, inclusive, é anterior à vigência da Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar 135/2010), de modo a ser preservada a normalidade e legitimidade do pleito, reclamando, portanto, a sua interpretação conforme nesse caso específico, sob pena de violação ao princípio da proporcionalidade. Ou seja: o artigo 16-A da Lei Geral das Eleições, sobretudo por ser anterior à Lei da Ficha Limpa, não foi pensado para a hipótese da alínea “e” (condenação criminal), a evidenciar a necessidade de seu afastamento nesse tipo de situação.
Daí, portanto, ser possível falar, sim, em candidatos “irregistráveis”.