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Estudos mostram que crianças criadas fora do casamento estão mais propensas a abandonar a escola, usar drogas e envolver-se em violência. O Child Trends, um instituto de pesquisa norte-americano, resumiu: “Filhos em famílias com um só dos pais, filhos nascidos de mães solteiras e filhos criados na nova família de um dos pais ou em relações de coabitação enfrentam riscos maiores de ficarem pobres.” Família não é problema. Funciona. Resolve. É uma baita solução. Contra fatos não há argumentos.
Não sou juiz de ninguém. Mas minha experiência profissional indica a presença de um elo que dá unidade às manifestações antissociais de inúmeros adolescentes: o esgarçamento das relações familiares. Há exceções, é claro. Desequilíbrios e patologias independem da boa vontade dos pais. A regra, no entanto, indica que a criminalidade infanto-juvenil costuma ser o corolário de um silogismo que se fundamenta em premissas bem concretas. A desestruturação da família está, de fato, na raiz de inúmeros problemas.
Os conflitos familiares são, por exemplo, a principal causa que leva os jovens para o mundo das drogas. Embora exista uma série de fatores que podem fazer com que os jovens experimentem as drogas e se viciem (predisposição genética, fatores de personalidade, pressão do narcotráfico), a estruturação familiar é decisiva.
Sobre a importância social da família há volumes alentados, análises e estudos muito ponderáveis. Eu desejaria hoje, concretamente, frisar apenas uma das razões que, a meu ver, evidenciam o nexo de causalidade existente entre família sadia e sociedade civilizada e democrática.
Refiro-me ao fato de que, na sociedade, não há nenhum âmbito de crescimento humano e ético, nenhum ambiente educativo, nenhum “coletivo” tão propício e eficaz para o cultivo das virtudes como a família bem estruturada. E isso é de suma importância, levando em consideração que, no mundo atual, cada vez aparece mais evidente que a sociedade precisa do oxigênio vital das virtudes. Decadência social e ignorância ou desprezo pelas virtudes são a mesma coisa.
A valorização do sucesso sem limites éticos e a consagração da impunidade têm colaborado para o aparecimento do crime precoce. A sociedade atual, com suas mazelas, com os preocupantes desvios de comportamento (basta pensar na escalada da violência, na epidemia da corrupção e no inferno das drogas) é de molde a reacender uma autêntica “saudade das virtudes”.
Pois bem, onde é que a juventude aprende a virtude, que deve ser, acima de tudo, um valor reconhecido pela criança, pelo adolescente e pelo jovem, uma convicção enraizada, uma prática exercitada com empenho, da qual depende o bem da pessoa e da sociedade? A família, sim, a família já foi e deveria ser agora o caldo de cultura mais propício para a descoberta, a valorização, o aprendizado e a prática das virtudes. Mas em que pé está a família entre nós? Será que há algum empenho real dos Poderes do Estado em fortalecê-la como estrutura vital e ética indispensável para a construção do bem da sociedade?
Não terá chegado já o momento em que os responsáveis pelos destinos do Brasil, sobretudo os parlamentares e alguns integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF), em vez de se dedicarem a lançar lenha na fogueira onde se incineram os valores familiares, voltem a sua atenção para a família, conscientes de que está – em boa parte por culpa deles mesmos – frágil e doente. Eu não duvido de que é na família, na autêntica família, mais do que em qualquer outro quadro de convivência, o “lugar” onde podem ser cultivados os valores, as virtudes e as sábias “tradições”, que constituem o melhor fundamento da educação para cidadania. Só assim, não duvidemos, construiremos uma sociedade justa e democrática.
A crise ética que castiga amplos segmentos da vida pública brasileira tem seu nascedouro na crise da família. É preciso pôr o dedo na chaga e dar nome aos bois. A ausência de valores e princípios éticos no âmbito da educação familiar deixa marcas profundas. Os homens públicos não são fruto do acaso, mas de sua história. A virada ética, consistente e verdadeira, começa na família.
Carlos Alberto Di Franco é jornalista.