| Foto: badski007/Pixabay
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Jovens de classe média e média alta têm frequentado o noticiário policial. Crimes, vandalismo, consumo e tráfico de drogas deixaram de ser marca registrada das favelas e da periferia das grandes cidades. O novo mapa do crime transita nos bares badalados, vive nos condomínios fechados, estuda nos colégios da moda e não se priva de regulares viagens ao exterior. O fenômeno, aparentemente surpreendente, é o reflexo de uma cascata de equívocos e de uma montanha de omissões. O novo perfil da delinquência é o resultado acabado da crise da família, da educação permissiva e do bombardeio de setores do mundo do entretenimento que se empenham em apagar qualquer vestígio de valores.

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Os pais da geração transgressora têm grande parte da culpa. Choram os desvios que cresceram no terreno fertilizado pela omissão. O delito não é apenas reflexo da falência da autoridade familiar. É, frequentemente, um grito de revolta e carência. A pobreza material castiga o corpo, mas a falta de amor corrói a alma. Os adolescentes, disse alguém, necessitam de pais morais, e não de pais materiais. A grande doença dos nossos dias tem um nome menos técnico, mas mais cruel: a desumanização das relações familiares.

Reféns da cultura da autorrealização, alguns pais não suportam ser incomodados pelas necessidades dos filhos. O vazio afetivo, imaginam na insanidade do seu egoísmo, pode ser preenchido com carros, boas mesadas e consumismo desenfreado. Acuados pela desenvoltura antissocial dos seus filhos, recorrem ao salva-vidas da psicoterapia. E é aí que a coisa pode complicar. Como dizia Otto Lara Rezende, com ironia e certa dose de injusta generalização, “a psicanálise é a maneira mais rápida e objetiva de ensinar a odiar o pai, a mãe e os melhores amigos”. Na verdade, a demissão do exercício da paternidade está na raiz do problema. A omissão da família está se traduzindo no assustador aumento da delinquência infanto-juvenil e no comprometimento, talvez irreversível, de parcelas significativas da nova geração.

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Se a crescente falange de adolescentes criminosos deixa algo claro, é o fato de que cada vez mais pais não conhecem os próprios filhos. Não é difícil imaginar em que ambiente afetivo se desenvolvem os integrantes das gangues bem-nascidas. As análises dos especialistas em políticas públicas esgrimem inúmeros argumentos politicamente corretos. Fala-se de tudo. Menos da crise da família. Mas o nó está aí. Se não tivermos a firmeza de desatá-lo, assistiremos, acovardados e paralisados, a uma espiral de crueldade sem precedentes. É uma questão de tempo. Infelizmente.

O inchaço do ego e o emagrecimento da solidariedade estão na origem de inúmeras patologias. A forja do caráter, compatível com o clima de verdadeira liberdade, começa a ganhar contornos de solução válida. A pena é que tenhamos de pagar um preço tão alto para redescobrir o óbvio. A sociedade precisa de um choque de bom senso. O erro deve ser condenado e punido. A solidariedade deve ser recuperada. É preciso ensinar à moçada que o ser está acima do ter. Gastamos muito tempo no combate à vergonha e à culpa, pretendendo que as pessoas se sentissem bem consigo mesmas. O resultado é uma geração desorientada, vazia e imatura.

O pragmatismo e a irresponsabilidade de alguns setores do mundo do entretenimento estão na outra ponta do problema. A era do mundo do espetáculo, rigorosamente medida pelas oscilações da audiência, tem na violência um de seus carros-chefes. A transgressão passou a ser a diversão mais rotineira de todas. A valorização do sucesso sem limites éticos, a apresentação de desvios comportamentais num clima de normalidade e a consagração da impunidade têm colaborado para o aparecimento de engomadinhos do crime. Apoiados numa manipulação do conceito de liberdade artística e de expressão, alguns programas de TV crescem à sombra da exploração das paixões humanas. Ao subestimar a influência perniciosa da violência ficcional, levam adolescentes ao delírio em shows de auditório que promovem uma grotesca sucessão de quadros desumanizadores e humilhantes.  A guerra pela conquista de mercados passa por cima de quaisquer balizas éticas. Nos Estados Unidos, por exemplo, o marketing do entretenimento com conteúdo violento está apontando as baterias na direção do público infantil.

A onipresença de uma televisão pouco responsável e a transformação da internetnum descontrolado espaço para manifestação deatividades criminosas (pedofilia, racismo e oferta de drogas, frequentemente presentes na clandestinidade de alguns sites, desconhecem fronteiras, ironizam legislações e ameaçam o Estado de Direito     democrático)estão na origem de inúmeros comportamentos patológicos.

É preciso ir às causas profundas da delinquência. Ou encaramos tudo isso com coragem ou seremos tragados por uma onda de violência jamais vista. O resultado final da pedagogia da concessão, da desestruturação familiar e da crise da autoridade está apresentando consequências dramáticas. Chegou para todos a hora de falar claro. É preciso pôr o dedo na chaga e identificar a relação que existe entre o medo de punir e os seus dramáticos efeitos antissociais.

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Carlos Alberto Di Franco é jornalista.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]