O leitor, na mídia tradicional e nas redes sociais, é o melhor termômetro para medir a temperatura da sociedade. Tomar o seu pulso equivale a uma pesquisa qualitativa informal. Aos que há anos me honram com sua leitura neste espaço opinativo, transmito uma experiência recorrente: família, ética e valores aumentam o índice de leitura. Dão ibope. Há uma forte demanda de pautas positivas. As pessoas estão cansadas do bombardeio politicamente correto, da interdição do debate. Querem reflexão aberta, sem tabus ideológicos.
Escreva algo, sublinhavam alguns dos e-mails que recebi, a respeito da desorientação da juventude. Não faço coro com os pessimistas. Meu olhar é essencialmente positivo. Tem uma molecada fantástica, batalhadora e idealista, fazendo muita coisa boa, sobretudo no contexto da cultura digital.
A erotização descontrolada está apresentando pesada fatura
Reconheço, no entanto, que nem tudo são luzes. A tecnologia trouxe imensos benefícios. Mas deixou os jovens mais vulneráveis. A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) acendeu o sinal amarelo durante o 39.º Congresso Brasileiro de Pediatria.
Termos como “sexting” e “cyberbullying” foram o foco de uma palestra de Marco Antônio Chaves Gama, presidente do Departamento Científico de Segurança da SBP. O “sexting”, troca de mensagens ou imagens de teor sexual, é o campeão no universo dos adolescentes. A garotada se expõe com facilidade através de nudes ( imagens da pessoa nua) e, ingenuamente, acredita que a pessoa do outro lado vai mantê-la consigo. Isso normalmente não acontece. A disseminação dessas fotografias pode causar outros dois problemas: a sextorsão e o cyberbullying. O primeiro, explica Gama, é quando a pessoa que detém a foto passa a chantagear ou extorquir o fotografado. Em sua apresentação, o médico destacou que esse ciclo de abuso pode perdurar no decorrer dos anos, contribuindo, muitas vezes, para o suicídio. Já o segundo, é a versão digital da violência, humilhação e agressão cometida contra outra pessoa. Crianças e adolescentes não estão preparadas para lidar com frustrações e decepções. Isso pode levar à tristeza, à ansiedade e, em casos extremos, ao suicídio.
A erotização descontrolada está apresentando pesada fatura. Segundo um especialista, situações delicadas estão acontecendo com adolescentes e são mascaradas pela tecnologia. Hiperssexualização, cyberbullying e abusos podem passar desapercebidas pelo fato de que os adolescentes estão o tempo todo "quietos" diante da tela. Transmitem, assim, a impressão de que tudo está bem. Nem sempre é assim. Por dentro, inseguros e solitários, graves problemas de ordem afetiva podem estar fermentando e levando a situações críticas.
O problema é serio. E a culpa não é só do entretenimento permissivo ou da TV. É de todos nós – governantes, formadores de opinião e pais de família –, que, num exercício de anticidadania, aceitamos que o país seja definido mundo afora como o paraíso do sexo fácil, barato, descartável. É triste, para não dizer trágico, ver o Brasil ser citado como um oásis excitante para os turistas que querem satisfazer suas taras e fantasias sexuais com crianças e adolescentes. Reportagens denunciando redes de prostituição infantil, algumas promovidas com o conhecimento ou até mesmo com a participação de autoridades públicas, crescem à sombra da impunidade.
- A sociedade livre está aberta aos conservadores (artigo de Luiz Guilherme de Medeiros, publicado em 25 de setembro de 2017)
- Erotização e gravidez precoce (artigo de Carlos Alberto Di Franco, publicado em 13 de março de 2017)
- Identidade de gênero nas escolas: debater e discutir não é o mesmo que induzir (artigo de Camille Vieira da Costa, Dhyego Câmara de Araujo e Rafael Kirchhoff, publicado em 11 de novembro de 2017)
Atualmente, graças ao impacto da TV e da internet, qualquer criança sabe mais sobre sexo, violência e aberrações do qualquer adulto de um passado não tão remoto. Não é preciso ser psicólogo para que se possam prever as distorções afetivas, psíquicas e emocionais dessa perversa iniciação precoce. Com o apoio das próprias mães, fascinadas com a perspectiva de um bom cachê, inúmeras crianças estão sendo prematuramente condenadas a uma vida “adulta” e sórdida. Por isso, a multiplicação de descobertas de redes de pedofilia não deve surpreender ninguém. Trata-se, na verdade, das consequências criminosas da escalada de erotização infantil promovida por alguns setores do negócio do entretenimento.
Carlos Alberto Di Franco é jornalista.