O FGTS é uma proteção social, um seguro-desemprego, para o trabalhador do setor privado quando fica desempregado. E uma compensação à estabilidade de emprego que os servidores públicos têm. Normalmente, as nações criam contribuições sociais compulsórias porque a maioria dos cidadãos não tem a disciplina de poupar, nem a visão estratégica de futuro. Antes de se tornarem um peso social para governos, melhor prevenir.
São 112,5 milhões de contas e R$ 325 bilhões de patrimônio. Uma poupança forçada e a principal reserva financeira dos assalariados que rende uma miséria: TR mais 3% ao ano. A TR, um indexador importante da inflação nos anos 90, é irrisória hoje. Quem a define é o governo e, no ano passado, deu 0,29%. Isso, mais os 3%, chegou a 3,29%, diante de uma inflação de 5,84%. Tal rendimento não preserva nem o poder aquisitivo dos depósitos originais. O desempenho pífio não é conjuntural. Na última década, o FGTS rendeu apenas 69,15%, contra uma inflação de 103%.
O governo, gestor dessa imensa riqueza, usa o dinheiro do trabalhador para outras finalidades e para pagar suas dívidas. Curioso é que as centrais sindicais nunca trataram desse relevante tema. Uma clara falta de visão estratégica. Só agora a Força Sindical quer processar o governo pelo esbulho do FGTS.
Por outro lado, desemprego é "sem emprego", e aposentadoria é "desemprego" permanente. Logo, não é de todo despropositado sugerir que uma parte do FGTS seja usada para aposentadoria, porém na previdência privada. A finalidade das reservas é a mesma. Uma parte dos 8% do FGTS poderia, gradativamente, até a aposentadoria, ser destinada à previdência privada, capitalizando adequadamente suas reservas, trocando uma rentabilidade na casa dos 3% ao ano por uma na casa dos 11% o que, em 20 anos, daria uma diferença de 366%. Melhoraria a renda do aposentado e diversificaria suas fontes, complementando a aposentadoria do INSS. Para quem acha este benefício suficiente, um alerta: em 25 anos ele vai pagar, no máximo, três salários mínimos, ou só R$ 2.034 em dinheiro de hoje, mantida a atual política de reajuste do salário mínimo.
Anos atrás, permitiu-se o uso de parte do FGTS para comprar ações da Petrobras e da Vale, e a porteira já foi aberta. Aliás, quem entrou ganhou muito. Além disso, a previdência privada, por meio dos fundos de pensão, investe muito em imóveis, a destinação prioritária dos recursos do FGTS. Finalmente, crescimento econômico é necessário em um país que quer dar aos seus filhos riqueza, emprego e o bem mais duradouro: educação.
O crescimento potencial do Brasil é muito baixo, pois depende de poupança interna de longo prazo e da taxa de investimento, que são baixas. Poupar e investir não são a mesma coisa. De 201 milhões de brasileiros, só 14 milhões que têm previdência privada poupam e investem para o longo prazo. Os demais só consomem. Um chinês poupa US$ 54 de cada US$ 100 que ganha. A maioria de nós gasta 100% do que ganha e empresta outro tanto para consumir mais. Por isso, somos eternos candidatos ao desenvolvimento e a potência emergente; um permanente quase.
O ex-ministro Roberto Campos dividia os países em duas categorias: os naturalmente pobres, mas vocacionalmente ricos, como o Japão, a Coreia do Sul e Taiwan; e os naturalmente ricos, mas vocacionalmente pobres, como o Brasil e a Argentina. Não dá para entender nosso país, imenso e naturalmente rico, persistir em ser vocacionalmente pobre de ética, de justiça, de visão estratégica, de planejamento, de poupança de longo prazo e de investimento. Poderíamos começar a mudar esse cenário e nossa cultura, deixando os trabalhadores brasileiros usarem seu FGTS para poupar mais, enriquecer mais e construir um futuro melhor, para si mesmos e para o país. E, de sobra, educá-los financeira e previdenciariamente.
Renato Follador é especialista em previdência social, pública e privada.
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