A automedicação é uma realidade presente em nossa sociedade, que reflete o aumento do desenvolvimento humano em uma de suas faces e em outra paradoxalmente a crescente desigualdade social que limita o acesso ao profissional médico.
Dessa forma as principais organizações internacionais, como a Organização Mundial de Saúde (1998), entendem a automedicação responsável como uma prática relacionada ao tratamento de sintomas e males menores, através do uso adequado e moderado de medicamentos isentos de prescrição médica e aponta um importante papel do farmacêutico nesse tipo de autocuidado, ao destacar suas funções de comunicador, dispensador qualificado de medicamentos e suas habilidades como promotor, protetor e recuperador da saúde coletiva.
Nesse sentido, o Conselho Federal de Farmácia vem discutindo com a sociedade a regulamentação da prescrição farmacêutica por meio da Consulta Pública n.º 01/2010, possibilitando a partir dessa regulamentação que o cidadão beneficiado por esse serviço tenha a garantia de que o ato foi realizado por um profissional capacitado e habilitado para tal, por meio da emissão da Declaração de Serviços Farmacêuticos ao usuário.
Importante ressaltar que a prescrição farmacêutica ou aos que preferirem a indicação farmacêutica, que deverá ser regulamentada, englobará os medicamentos não tarjados, os ditos de venda livre. Contudo no Sinitox (Sistema Nacional de Intoxicações) aparecem medicamentos isentos de prescrição médica com potenciais riscos à saúde do ser humano. Fato este que por si só já justificaria a intervenção direta de um profissional com o perfil do farmacêutico para garantir ao paciente seu uso seguro e racional.
Se entendermos que assistência farmacêutica é direito do cidadão e dever do profissional farmacêutico, vislumbra-se neste ambiente o terreno propício para que o farmacêutico repactue, consolide e aprofunde suas funções sociais e culturais com a nação brasileira, mobilizando seu conhecimento técnico e científico no equacionamento ético de um grave problema nacional que é a "empurroterapia" por parte daqueles que veem a farmácia ainda como um mero entreposto comercial.
Para isso é necessário que o farmacêutico e as suas entidades de classe desmistifiquem a automedicação à luz do conhecimento técnico e científico enfocados no contexto social econômico e cultural brasileiro, assumindo uma posição corajosa de responsabilidade pela automedicação e a propriedade por meio da prescrição farmacêutica de transformar este problema em solução.
Atualmente o farmacêutico tem se posicionado de forma tímida sobre a matéria, expondo sua minoridade profissional, ao permitir que outros definam estratégias de ação no que seria seu campo de atuação.
A atuação do farmacêutico nas farmácias diante da automedicação é de grande importância social, pois em diversas circunstâncias ele é o primeiro, o último e muitas vezes o único profissional de saúde que entra em contato com o paciente.
Sendo, portanto, um estratégico agente de triagem do Sistema Único de Saúde, que irá contribuir de forma substancial para a otimização de suas ações e investimentos.
Ainda de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio financiada pelo Ministério da Saúde em 1998, a Farmácia é um dos principais serviços utilizados pela população em caso de necessidade.
Portanto é necessário que farmacêuticos e autoridades sanitárias estabeleçam critérios consensuais para que o imperativo categórico da prescrição farmacêutica seja a garantia do uso seguro e racional dos medicamentos isentos de prescrição médica, objetivando a melhora da qualidade de vida do cidadão.
E que, por meio deste ponto de vista diferenciado e esclarecedor sobre a automedicação e prescrição farmacêutica, o farmacêutico como perito construa uma realidade que seja aceita por toda a sociedade, ajudando-a na melhor forma possível na utilização deste importante produto social que é o medicamento e simultaneamente possibilite a este profissional milenar o seu tão merecido prestígio social.
Roberto Amatuzzi Franco, farmacêutico, é conselheiro do CRF-PR