Quando vamos à feira ou ao supermercado, por exemplo, é recorrente nos defrontarmos com preços diferentes daqueles que encontramos então da última vez. O sobe e desce dos preços significa que as leis da oferta e da demanda estão em pleno funcionamento. E isso é natural, pois advém das condições de produção e de consumo. Nesse caso, não há muitas medidas a serem tomadas, a não ser o consumidor substituir o bem mais caro por um bem mais barato.
Essas variações tão frequentes nos preços não se relacionam em nada com a inflação, é um processo normal de alteração dos preços relativos da economia. Por sua vez, a inflação é o aumento generalizado e contínuo de todos os preços dos produtos de uma economia. Num ambiente de inflação, como dos anos 1980 e parte dos anos 1990, ir à feira ou ao supermercado implica encontrar necessariamente preços superiores ao encontrados na última vez. E a substituição por produtos mais baratos não resolve, pois todos estão mais caros. É o governo, por meio da autoridade monetária, que deve adotar medidas econômicas para controlar a inflação.
Saindo do âmbito puramente econômico, podemos perceber que o Brasil está se deparando com um problema semelhante à inflação, mas no contexto social. É normal e legítimo grupos de pessoas se organizarem e reivindicarem algumas questões. Se tais reivindicações são legítimas ou não é outra discussão, mas o ato de reivindicar faz parte de sociedades democráticas. Sendo assim, conviver, principalmente nas grandes cidades, com manifestações de qualquer natureza é inerente ao desenvolvimento social. Se um grupo de trabalhadores decide realizar uma paralisação para discutir melhores condições de trabalho, isso deve ser uma decisão entre trabalhadores e a empresa. Não há necessidade de o governo intervir em um assunto privado dessa natureza, a não ser quando há desdobramentos em outros campos.
No entanto, o que se pode observar atualmente no Brasil é uma erupção de manifestações e de reivindicações sem precedentes. É algo preocupante e indica que há algo errado com a estrutura social. E isso se relaciona diretamente com o governo brasileiro, pois ele não tem demonstrado a habilidade necessária para convergir os diversos interesses sociais.
Em uma sociedade, as pessoas reconhecem a importância da cooperação, mas diferentemente de alguns animais, não temos o instinto natural de cooperar. E sempre ficamos tentados a burlar qualquer ação cooperativa, ou seja, ao contrário de valorizarmos a coletividade, tomamos ações baseadas no nosso instinto egoísta, priorizando ganhos imediatos.
É justamente este o ponto central do governo: estabelecer as regras nos diversos âmbitos para harmonizar o convívio de pessoas que naturalmente pensam e agem distintamente. De maneira simplificada, estabelecer regras para uma sociedade é como implantar um semáforo em duas ruas que se cruzam. Quando o semáforo entra em pane há vários tipos de transtornos: o trânsito se torna imensamente mais complicado, a agressividade surge entre inúmeros motoristas e a insegurança e os riscos de acidente aumentam. E no contexto atual, podemos perceber justamente que o semáforo que orienta o "tráfego" brasileiro está com problemas. E é particularmente esse ponto que o governo precisa se articular para conseguir coordenar as ações necessárias para estabelecer regras que visem harmonizar os interesses tão plurais e desiguais como os da sociedade brasileira.
Rodolfo Coelho Prates, doutor em Economia pela USP, é professor do programa de mestrado e doutorado em Administração da Universidade Positivo.
Dê sua opinião
Você concorda com o autor do artigo? Deixe seu comentário e participe do debate.