Novamente, as concessões surgem como a grande – e talvez única – alternativa para equacionar as urgentes e indispensáveis melhorias no transporte no país. Isso ocorre, especialmente, em um momento de severas restrições de recursos públicos para novos investimentos, bem como para a conservação e manutenção da infraestrutura já existente. Porém, muito pouco tem se falado sobre as históricas fragilidades das concessões da infraestrutura e de serviços de transporte público que, em muitos casos, têm deixado a sociedade refém do interesse privado.
Uma primeira fragilidade é a modelagem superficial. As concessões de rodovias no país realizadas nos últimos 20 anos, em sua grande parte, apresentaram distorções. No Paraná, o primeiro grande programa de concessões rodoviárias previu a duplicação de mais de 2 mil quilômetros sem nenhuma indicação de sua viabilidade econômica. Os reflexos negativos desse fato surgiram já nos primeiros meses contratuais, originando demandas judiciais, reclamações da sociedade e discursos políticos de toda sorte.
Fragilidades também ocorreram em concessões rodoviárias promovidas pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), como as dos trechos da BR-040, BR-060 e BR-101. Há indícios de que os investimentos em obras, ampliação de capacidade e outras intervenções não teriam sido adequadamente avaliados em relação à arrecadação prevista. Além disso, em alguns casos, a falta de licenças ambientais impossibilitou investimentos nos prazos contratados. Assim, para as concessionárias, além de economia na execução de obras, abriu-se a possibilidade para pedidos de reprogramação dos investimentos e até de eventuais reequilíbrios econômico-financeiros.
É necessário acabar com as fragilidades existentes para que a sociedade possa contar com serviços adequados
Ainda no tocante à modelagem, até hoje é um grande desafio encontrar nos marcos regulatórios e, principalmente, nos contratos de concessão de transporte parâmetros detalhados para a fiscalização dos “serviços adequados” conforme estabelece o artigo 6.º da Lei das Concessões (Lei 8.987/1995). Com isso, o poder público enfrenta sérias, e talvez intransponíveis, dificuldades contratuais para cobrar que os serviços prestados pelas concessionárias tenham “regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas”.
Outra fragilidade é a gestão precária. Em muitos entes federativos, nos três níveis de governo, faltam estruturas com pessoal permanente e especializado, bem como recursos suficientes para a adequada gestão, fiscalização e regulação dos serviços públicos concedidos. Mesmo no âmbito federal, com marcos legais definidos, cerca de 84% dos recursos das agências reguladoras em 2016 foram destinados a cobrir déficits da União.
Na esfera estadual, a Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados de Infraestrutura do Paraná (Agepar), 15 anos após sua criação, ainda “está em fase de projeto de estruturação”, conforme informação atual de seu site. Outro exemplo dessa precariedade é a Resolução 003/2017, através da qual a Agepar determina ao DER a implantação de um sistema de auditoria independente nas praças de pedágio para coletar dados de tráfego e de arrecadação. Além de o poder público depender há duas décadas dos dados fornecidos pelas concessionárias, há cerca de quatro anos a própria agência já havia determinado ao DER tal providência.
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Também há de se considerar a fragilidade imposta ao regime de concessões pela insegurança jurídica. O exemplo mais recente é a edição da Medida Provisória 800/2017, que estabeleceu “diretrizes para a reprogramação de investimentos em concessões rodoviárias federais”. Esse novo instrumento permite a reprogramação de investimentos da fase inicial dos contratos, considerando, entre outros elementos, a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro.
Porém, facultar tal reprogramação de investimentos durante a vigência da concessão, cujos editais de licitação e contratos não contemplaram tal possibilidade, representa um grande risco para o interesse público. Além dos indícios de que tal medida afronta as disposições legais em vigor, ela altera as regras iniciais do processo licitatório, possibilitando demandas por parte de outros interessados, alguns que talvez até tenham desistido em razão das regras iniciais em vigor.
Finalmente, há de se considerar a transparência incipiente. Cabe destacar que, além das disposições constitucionais aplicáveis, mais recentemente a Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011) promoveu novos avanços em termos de promoção da transparência ativa. Porém, ainda hoje é frustrante verificar a pobreza das informações sobre as concessões nos sites públicos paranaenses como os da Agepar, do DER e da Coordenação da Região Metropolitana de Curitiba (Comec), esta última responsável pelo transporte público intermunicipal no âmbito dessa região.
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Devem ser públicos os dados e as informações sobre as concessões, especialmente através dos sites governamentais. Com maior transparência a sociedade poderá conhecer os contratos e seus aditivos, acompanhar os investimentos previstos e realizados, os volumes de tráfego e de usuários, os relatórios de fiscalização, ações judiciais e outros aspectos relacionados à gestão e fiscalização das concessões. Assim, seriam ampliadas as possibilidades de participação e controle social, com inquestionáveis benefícios para a preservação e defesa do interesse público.
As limitações do Estado para prestar os serviços essenciais à sociedade podem ser superadas através de concessões à iniciativa privada. Entretanto, é necessário acabar com as fragilidades existentes para que a sociedade possa contar com serviços adequados. Isso exige muita determinação para promover os arranjos e ajustes que contribuam, principalmente, com o aprimoramento dos sistemas de gestão e fiscalização das concessões.
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