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Fragilização do crédito no Brasil

Em meio a um clima de discreta retomada da confiança dos agentes econômicos, fortemente influenciada pela expectativa de confirmação do impeachment da presidente afastada, Dilma Rousseff, pelo Senado da República, no fim de agosto, estatísticas do Banco Central (BC) referentes ao saldo de operações de crédito efetuadas pelas entidades financeiras no Brasil atestam deterioração da mola propulsora dos negócios, por aqui, desde o final de 2008, como forma de abrandamento da internalização da instabilidade financeira global no front doméstico.

Tanto é assim que o montante de crédito desembolsado pelos bancos, em relação ao produto interno bruto (PIB), saltou de 35,5%, em janeiro de 2008, para o pico de 54,5% do PIB, em dezembro de 2015. Desde então, essa variável ingressou em rota cadente, chegando a 51,9%, em junho de 2016, o que evidencia o delineamento de situação de colapso no mercado de haveres financeiros, público e privado, para pessoas físicas e jurídicas, em face, fundamentalmente, do aprofundamento da recessão.

A retração da alocação e utilização de crédito revelou-se mais acentuada nas modalidades direcionadas, como as atreladas ao sistema financeiro da habitação (SFH), incluindo as linhas populares subsidiadas para bancar a aquisição da casa própria – operadas predominantemente com fundos provenientes das cadernetas de poupança –, aos aportes do BNDES e ao crédito rural.

Em paralelo, as taxas de juros cobradas pelas entidades intensificaram a trajetória ascendente, alcançado média de 71,4% ao ano e 30,3% a.a. para consumidores e empresas, respectivamente, em junho de 2016, ante 58,2% a.a. e 27,5% a.a., respectivamente, em junho de 2015.

A subida dos encargos reflete principalmente a contração da oferta, por parte das instituições, fruto da combinação entre impulsão da inadimplência dos tomadores e elevação da demanda por rolagem da dívida do governo,

A subida dos encargos reflete principalmente a contração da oferta, por parte das instituições, fruto da combinação entre impulsão da inadimplência dos tomadores e elevação da demanda por rolagem da dívida do governo, ancorada em títulos, o que, inclusive, vem multiplicando os ganhos de tesouraria auferidos notadamente pelos grandes bancos.

O expediente de não recompra do passivo em papéis mobiliários do governo, em carteira – que atingiu R$ 2,8 trilhões, em junho de 2016, correspondendo a 47,1% do PIB – no prazo acordado com os entes financeiros, absorve mais de 70% dos recursos creditícios disponíveis no mercado, minguando as destinações para consumo, giro e investimentos, o que contribui para o encolhimento dos níveis de atividade.

Não por acaso, a taxa de desocupação chegou a 11,3% da população economicamente ativa (PEA), no trimestre móvel abril-maio-junho de 2016, contra 8,3% da PEA, no mesmo período de 2015, equivalendo a 11,6 milhões de pessoas sem emprego a procura de trabalho, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Já o rendimento médio real decresceu -4,2%.

Na mesma linha, pesquisa da Confederação Nacional do Comércio (CNC) constatou que, a despeito da diminuição do endividamento, de 62% do total das famílias, em junho de 2015, para 58,1%, em junho de 2016, houve elevação das contas de atraso, situação que atinge 23,5% dos consumidores, em junho de 2016, contra 21,3%, em idêntico mês de 2015, e, sobretudo da menção à completa incapacidade de pagamento, que subiu 7,9% para 9,1%, do total de consumidores, no intervalo em pauta.

Na verdade, em um ambiente de apreensão das famílias, motivada pela queda da renda real, decorrente da conjugação entre a fragilização do mercado de trabalho e da escalada inflacionária, e o temor do fantasma do desemprego, parece razoável supor a reduzida probabilidade de recolocação do crédito bancário como protagonista da desejada recuperação da economia brasileira, em médio prazo.

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