No fim de 2017, a Superliga feminina de vôlei passou por uma situação inédita. Foi quando Tiffany entrou em quadra pelo Bauru, em partida contra a equipe do São Caetano, marcando, pela primeira vez, a presença de uma jogadora transgênero na competição. A situação trouxe à tona muitos debates e a questão maior não é a inclusão, absolutamente obrigatória e assegurada para toda e qualquer pessoa que deseje seguir a profissão de atleta, mas de que forma essa inclusão deva acontecer.
A polêmica levantada com a jogadora Tiffany nos mostra que, em modalidades esportivas disputadas por mulheres, a questão surge de maneira bastante séria e importante. Quando pensamos no esporte – que, em sua essência, é eminentemente competitivo –, é possível entender e imaginar uma série de fatores ligados à geração de condições de igualdade competitiva, visando à justiça do jogo. E é justamente neste ponto que se concentra a discussão. Qual é, afinal, o limite de vantagem genética que determinado ser humano pode ter em relação a outro para que estejam na mesma categoria ou competição?
Essa questão é extremamente ampla. Michael Phelps, por exemplo, poderia ser considerado teoricamente em vantagem genética para a natação, esporte que o consagrou, por ser mais alto, ter mãos maiores e tornozelos mais flexíveis. Ainda sobre diferenças genéticas, vale lembrar que nas competições paralímpicas pessoas com acometimentos absolutamente diferentes são colocadas em condições de disputa através de tabelas classificatórias de limitações, com um alto grau de subjetividade. E o uso de próteses, repositores ou inibidores hormonais, acessórios etc. também não significaria vantagem individual?
A simples categorização em masculino e feminino é falha
Somam-se ao cenário de subjetividade itens como alimentação diferenciada, condições de treino, dedicação exclusiva ao esporte, entre outras peculiaridades que viram diferenciadores e fazem do esporte um balaio em que as melhores condições financeiras claramente levam vantagens – embora isso não se discuta.
Tudo isso nos faz observar que, aparentemente, não há igualdade de competitividade em nenhum momento dentro do esporte, independentemente de gênero. Há tantas variáveis envolvidas no ser humano que a categorização da competição esportiva em masculino e feminino não basta para o alcance da justiça plena no esporte.
De que forma, então, conseguiríamos alcançá-la? Com a categorização por desempenho? Mas, nesse sentido, entraria na análise, por exemplo, o uso de medicamentos e hormônios ou inibidores hormonais por pessoas em fases anteriores à sua entrada como atleta? Isso não geraria diferenciais de performance? Mais além: com inúmeras características genéticas do ser humano, há como se chegar a uma plena justiça e equilíbrio competitivo?
Competição desleal: Uma violação de princípios e postulados do esporte (artigo de André Tisi, advogado especialista em Direito Desportivo)
Enquanto não se chega a uma resposta definitiva, alguns princípios não devem ser questionados: a inclusão total das pessoas ao esporte e o respeito têm de ser obrigatórios, e vão muito além das questões de gênero; a simples categorização em masculino e feminino é falha; existe uma necessidade urgente de se abrir os olhos e ampliar a visão sobre vantagens e desvantagens genéticas no esporte.
Possivelmente, a categorização por desempenho recorrente medido, independentemente de todo o resto, seja uma das alternativas mais justas e que precisa ter a viabilidade logística estudada e planejada para acontecer, principalmente, nas modalidades individuais, onde o papel das capacidades físicas tenha interferência na possibilidade de resultados. Já nas modalidades coletivas, outras medidas, ainda não claras, também precisam ser consideradas para que haja a inclusão obrigatória de todos no esporte de maneira justa.
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