Como se tivesse acabado de descobrir a salvação da Petrobras, a presidente Graça Foster anunciou a criação de uma diretoria de governança corporativa e mais algumas dezenas de medidas com a missão de estancar os desvios de recursos da empresa que, segundo a operação Lava Jato, da Polícia Federal, já passa dos R$ 20 bilhões.
A governança é reconhecidamente um moderno conjunto de instrumentos de gestão tanto de empresas privadas como públicas; vem sendo adotada por companhias e governos em todo o mundo, podendo, sem dúvida, evitar processos corrosivos como o instalado na estatal brasileira, por implantar e alimentar mecanismos de apuração de informações correntes no sistema, cobrar ética e eficiência dos gestores na tomada de decisões em relação aos acontecimentos e exigir transparência na relação entre os dirigentes, o conselho de administração, os acionistas e clientes.
Chega a surpreender que uma empresa tão grande, tão bem estruturada, de nível internacional, como a Petrobras, já não tivesse sistemas, processos, ferramentas capazes de identificar com rapidez e objetividade o que o seu pessoal anda fazendo e de detectar falhas, erros, furos e ações criminosas.
Há anos, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) recomenda a governança para estatais para: assegurar marco regulatório legal nas empresas, que jamais podem ser confundidas com o Estado, devendo atuar sempre como organizações do setor privado e manter relações empresariais com outras empresas e instituições; observar rigorosa transparência, procedimentos eficientes de auditoria interna e externa, confiabilidade nas informações contábeis, entre muitas outras diretrizes.
O próprio governo brasileiro, considerando a importância desse instrumento de gestão, assimilou as regras e orientou, por decreto, em 2007, a adoção da governança corporativa em suas unidades, segundo as normas, para otimizar o desempenho das estatais, maximizar os resultados econômico-financeiros e proteger os direitos das partes interessadas, com transparência e equidade, etc. Consta ainda a criação de um departamento exclusivo de Coordenação e Governança das Empresas Estatais (Dest), subordinado ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, e à Comissão Interministerial de Governança Corporativa e de Administração de Participações Societárias da União.
Posto isso, a partir das declarações dos envolvidos nas investigações, e em particular pelo bate-boca entre a presidente Graça Foster e a ex-gerente Venina Velosa da Fonseca, a governança chega tarde à Petrobras. Pagamentos por serviços não prestados, contratos aparentemente superfaturados, negociações em que eram solicitadas comissões para as pessoas envolvidas e outras posturas que ferem o código de ética, entre as principais denúncias feitas por Venina, não acrescentam nenhuma novidade ao que já foi apurado pela Polícia Federal e pelo Ministério Público.
Denúncias muito mais antigas até dão conta de que a Petrobras há muito vem sendo minada por fraudes. Quando o Congresso quis investigar a empresa com uma CPI, o governo Lula condenou a iniciativa como ação político-ideológica interessada apenas em privatizar a Petrobras um ícone nacional e em manchar a imagem da sua gestão. Na época, o Tribunal de Contas da União e a Polícia Federal já reuniam farto material apontando irregularidades diversas em contratos, licitações, pagamentos indevidos, superfaturamento, operações contábeis duvidosas...
Antes, portanto, da Operação Lava Jato vieram as operações Águas Profundas, Royalties, Castelo de Areia, cada uma revelando algum tipo de malfeito, sugerindo que o mal transcende os limites da Petrobras; deriva de uma cultura que se alastrou em nosso país, misturando negócios escusos com política. Quando uma empresa, que deveria ter controle absoluto das suas atividades, admite em seus quadros de poder apadrinhados políticos em vez de profissionais especializados, o resultado não poderia ser diferente.
Lucelia Lecheta é presidente do Conselho Regional de Contabilidade do Paraná (CRCPR).
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