O ano de 2023 chegou ao fim com safra recorde de grãos no Brasil, com colheita estimada em 300 milhões de toneladas, 16,5% a mais que no ano passado, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento, a Conab. O saldo positivo é que, além de ajudar a controlar a inflação, o cenário contribuiu de forma significativa para equilibrar as exportações. No entanto, apesar da comemoração por grande parte dos agricultores e produtores rurais, nos deparamos com um desafio a ser vencido com urgência: a infraestrutura de armazenagem.
Ao longo do ano, tivemos safra recorde de grãos, cereais, leguminosas e oleaginosas. O agronegócio está pujante novamente, depois de enfrentar percalços com o início da guerra entre Rússia e Ucrânia, em fevereiro de 2022, e os quase três anos da pandemia da Covid-19. O volume recorde na produção das lavouras é fruto da maior produção prevista para a soja (19,1%), milho primeira safra (16,8%), algodão herbáceo em caroço (2%), sorgo (5,7%) e para o feijão primeira safra (4,9%). A soja e o milho primeira safra também devem ter aumento na área colhida, de 1,2% e 0,9%, respectivamente.
Não consigo ver um mercado agro competitivo, saudável e rentável sem o setor resolver isso conjuntamente com o governo.
Se no campo as lavouras – mesmo que afetadas por graves ondas de calor no Centro-Oeste e chuvas torrenciais no Sul do país – estão indo de vento em popa, a capacidade de armazenagem agrícola também teve aumento, chegando a 201,4 milhões de toneladas no primeiro semestre, um percentual 4,8% superior ao semestre anterior. Apesar da pequena melhora, na prática é pouco para nossa realidade.
O armazenamento de grãos é questão de extrema relevância para a agricultura, pois é um gargalo do setor. Isso porque tudo o que o produtor colhe ele precisa escoar imediatamente, pois não tem como estocar. Nem de terceiros. Com isso, além de não conseguir negociar precificação dos produtos, ele escoa tudo pelo valor estabelecido pelo mercado, deixando seu negócio pouco competitivo. Os silos são essenciais para o equilíbrio do mercado, ou seja, a gente colher os grãos na safra e vendê-los na entressafra. É um olhar mercadológico, principalmente para os produtores que têm investido em bioinsumos em suas lavouras com o objetivo de reduzir os insumos químicos e recuperar a sanidade do solo.
Fato é que o Brasil não tem investimento em armazenagem. Para se ter ideia, um silo – de concreto armado ou aço – capaz de armazenar 60 mil sacas, custa entre R$ 7 milhões a R$ 8 milhões. É um custo inviável para a maioria dos produtores. Geralmente, as estruturas são projetadas pelo tamanho da propriedade e pela estimativa média de produção. Dados de 2021/2022 indicavam que os estados do Rio Grande do Sul e o Mato Grosso detinham as melhores estruturas de armazenagem: o RS tinha o maior número de estabelecimentos (2.183), enquanto o MT liderava com a maior capacidade de estocagem (46,9 milhões de toneladas). Muitos produtores têm usado como alternativa de baixo investimento o silo bolsa, uma espécie de bexiga, de plástico, que fica no chão, rente ao solo. Mas essa estrutura é descartável e para pequenos volumes de armazenagem.
O que vem sendo discutido no setor do agronegócio é um incentivo melhor do governo federal, com taxas menores de juros, isenção de impostos, pois a questão do armazenamento de grãos influencia diretamente na cadeia logística do país dentro do agro. O BNDES já tem linhas exclusivas para a montagem de silos, com taxas diferenciadas, o que me parece ainda insuficiente para atender uma massa maior de produtores.
Os Estados Unidos são o maior produtor de milho do mundo e segundo maior produtor de soja. Nós estamos em primeiro lugar na soja e em segundo na produção de milho. Os EUA têm uma safra apenas, nós temos duas, por isso nos tornarmos o número um em soja e estamos num cenário bastante favorável e competitivo no mercado. Mas os EUA têm mais armazenagem e esse déficit entre nós certamente poderá influenciar na cadeia produtiva brasileira, uma vez que estamos aumentando a capacidade produtiva, como prevê a Conab para as safras de 2023. Não consigo ver um mercado agro competitivo, saudável e rentável sem o setor resolver isso conjuntamente com o governo.
Bruno Sampaio é gestor das fazendas BMG Agro.