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Opinião do dia 1

Grandes projetos que transformam as cidades

Há algumas décadas, cidades em diferentes partes do mundo vêm propondo grandes obras de arquitetura para alterar a história da cidade, buscando modernizá-la e fazê-la mais conhecida. Bilbao, no norte da Espanha, é uma cidade industrial, e era pouco conhecida no resto do mundo, e pouco visitada. Cidade mais importante do país basco, como se chama essa região espanhola, era conhecida mais pelo grupo terrorista ETA. Em 1997 inaugurou o seu museu, com formas arrojadas em titânio, de autoria do arquiteto Frank Gehry, em um projeto de modernização de sua área portuária, e entrou no mapa turístico europeu. A Espanha já tinha passado por momento similar quando para os Jogos Olímpicos de 1992, Barcelona remodelou diversas áreas urbanas e criou grandes edifícios de forte impacto, que se tornaram cartões-postais da cidade. As transformações urbanas marcadas por grandes projetos urbanos foram a tônica europeia nos anos 1990 e 2000, passando por Paris, Berlim, Lisboa.

Raras vezes esses projetos estão isolados. Formam parte de um projeto de transformação urbana mais amplo, e servem como referência e como dínamo para que as diversas partes envolvidas se motivem a participar dessa transformação. Em vários casos, esses grandes edifícios tinham funções culturais, como o Museu de Arte Contemporânea em Barcelona ou o complexo para a Expo de Lisboa. Esse boom do turismo cultural fez com que aumentasse o número de cidades candidatas a serem capitais culturais da Europa, em um fenômeno que dá sinais de saturação – talvez pela crise econômica, talvez pelo enfado: difícil repetir o efeito surpresa de Bilbao, difícil competir em atratividade com Berlim. Um grande edifício não faz uma grande cidade.

Na América Latina, o Rio de Janeiro já quis ter seu Guggenheim. Não levou – mas com a chegada da Olimpíada, terá vários projetos grandiloquentes para não reclamar. Mas será que em nossas cidades é desse tipo de grande projeto que precisamos? Acho que não. E exemplos disso vêm da Colômbia.

Na capital, Bogotá, já há uma década várias grandes bibliotecas, de arquitetos conhecidos, são construídas em bairros periféricos. Elas recebem adultos, jovens e crianças diariamente, dia e noite, que se entretêm com leitura, teatro, internet, cinema. Uma delas foi construída onde antes funcionava um incinerador de lixo, em um bairro muito pobre. Seu projeto é de alta qualidade, construção de excelente qualidade, que transformou a vida da população do bairro – e recebe turistas encantados tanto pelo projeto quanto pela mudança de vida que trouxe ao bairro.

Medellín, também na Colômbia, fez duas revoluções ao mesmo tempo. Suas favelas, como no Rio de Janeiro, ficam nos morros, íngremes, com difícil acesso para ônibus. A cidade resolveu o problema instalando um teleférico de alta capacidade, chamado metrocable. Algo similar o Rio de Janeiro fez recentemente no Complexo do Alemão. E no terminal do metrocable, no alto da favela, instalou uma grande biblioteca e centro de atividades, que vão de teatro a área para recreação infantil, onde as mães podem deixar seus filhos parte do dia. O projeto é não só grandioso, como de excelente qualidade construtiva e arquitetônica. Tornou-se uma referência para o bairro, que vem ajudando a transformar. Tornou-se uma referência para a cidade. Poderia se tornar uma referência e exemplo para América Latina: de um grande projeto urbano construído onde mais se precisam deles, onde efetivamente estão nossos problemas.

Este texto faz parte de uma rodada quinzenal de discussões sobre a cidade. Também integram o grupo os arquitetos Clovis Ultramari, Salvador Gnoato e Irã Dudeque. Tema desta rodada: Grandes obras na cidade.

Fábio Duarte, urbanista, é professor da PUC-PR.

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