Os dados apurados pelo IBGE sobre o comportamento do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro no primeiro trimestre de 2014 apenas confirmam as expectativas pessimistas sobre a evolução da economia. O crescimento do PIB, quando comparado com o quarto trimestre de 2013, foi de apenas 0,2%. Os investimentos, fundamentais para o crescimento de longo prazo, recuaram (-2,1%) e até os gastos com consumo das famílias, motor da expansão em anos anteriores, registraram leve queda (-0,1%). Repete-se o fraco resultado dos anos anteriores num cenário de inflação próxima ao teto da meta e de ampliação nos desequilíbrios nas contas externas.
O cenário é perfeito para as críticas dos opositores do governo. No limite, irão sustentar que o governo Dilma não deixa nenhuma herança positiva. No lado oposto, existem aqueles que insistem na tese esdrúxula de que tudo não passa de uma conspiração da "direita conservadora" e que tudo anda bem no país das maravilhas.
Apesar dos frágeis resultados macroeconômicos, Dilma deixa alguma herança positiva? Certamente deixa menos que o prometido e o esperado de seu governo. Há, no entanto, aspectos positivos que são menosprezados em boa parte das análises. Para enxergar esses aspectos é preciso assumir uma premissa, a de que é papel do governo buscar reduzir a miséria e os desequilíbrios na distribuição da renda, problema historicamente grave em nossa sociedade.
Dilma manteve e ampliou, num contexto de baixo crescimento, o conjunto de políticas de proteção e inclusão social inauguradas em 2003. Foram essas políticas que permitiram ao país promover avanços significativos na distribuição da renda e na redução da miséria, avanços amplamente reconhecidos em nível internacional. Apenas um dado para ilustrar. Em 2002, 34,7% da população brasileira encontrava-se abaixo da linha de pobreza. Em dezembro de 2012 eram classificados como pobres 15,3% da população, de acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad/IBGE).
Dilma tentou (equivocadamente) mudar a política econômica conduzida no governo Lula, mas manteve e ampliou sua política social. Distribuir renda e reduzir a pobreza é uma tarefa complexa, mas relativamente mais simples num cenário de crescimento. Quando a economia está exibindo forte crescimento, tal como entre 2004 e 2008, a distribuição da renda em grande parte se dá através da distribuição da (nova) riqueza gerada pelo crescimento. O conflito distributivo é menos pronunciado nesse cenário. Distribuir renda num contexto de baixo crescimento significa de fato transferir renda de uma classe para outra, o que acirra o conflito distributivo.
O maior mérito de Dilma foi manter as políticas de proteção e inclusão social, ainda que num contexto de restrição de recursos. Para tanto foi preciso ter clareza sobre a prioridade dessas políticas. Para aqueles que adotam a premissa de que é papel do governo reduzir a miséria e melhorar a distribuição da renda, o governo Dilma apresenta um conjunto de resultados positivos. Os críticos das políticas sociais e distributivas, aqueles que acreditam que programas como o Bolsa Família servem apenas para "sustentar vagabundos", nada encontrarão de positivo nestes últimos quatro anos. Gregos e troianos nunca chegarão a um ponto em comum, seus interesses são antagônicos.
Marcelo Curado é professor do programa de pós-graduação em Desenvolvimento Econômico da UFPR.
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