Na economia, início do terceiro mandato de Lula tem sido marcado por iniciativas voltadas para o curto prazo, relançamento de antigos programas, revogação de medidas dos antecessores e “fogo amigo” do PT sobre iniciativas na área fiscal.| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
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A eleição presidencial de 2018 foi um marco na história política brasileira no que diz respeito à influência das redes sociais – e dos meios digitais em geral – nas campanhas e, consequentemente, no resultado do pleito. Com a vitória de Jair Bolsonaro naquele ano, aliada à defesa incansável de seus pares e eleitores pela liberdade de utilização sem filtro dessas ferramentas, criou-se um senso comum de que os influenciadores da direita são massivamente mais presentes nas redes sociais. Ou que esse grupo “sabe usar melhor” os mecanismos de engajamento. Recentemente, o vídeo publicado pelo deputado federal Nikolas Ferreira (PL), criticando a fiscalização do PIX, que ultrapassou 300 milhões de visualizações em pouco mais de dois dias, reforçou essa percepção.

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Acontece que o segundo aspecto carrega uma meia verdade, enquanto o primeiro não encontra comprovação na realidade. Um estudo de 2024 feito pela Pew Research Center revelou que, em nível global, de fato há mais criadores de conteúdo de direita do que de esquerda, mas as diferenças não são tão grandes (27% contra 21%), e a maioria dos criadores de conteúdo não se diz partidário à nenhuma ala política.

Uma discordância não é razão, para os conservadores, para excluírem um membro do seu grupo, pois possuem mais pilares morais com o qual julgar uma questão política/social ou cultural

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Já as estratégias de direita e esquerda não são diferentes nas redes sociais e na vida real. São estratégias que passam pelos dois mundos. Aliás, um vídeo feito pela deputada federal Erika Hilton (PSOL) contra-argumentando a publicação do parlamentar mineiro, utilizando estética semelhante, ultrapassou 30 milhões de visualizações em apenas sete horas, além de quase dois milhões de curtidas no Instagram e 9 milhões no X, antigo Twitter. Ou seja, apesar da ainda clara diferença de alcance, a conclusão é óbvia: criadores de conteúdo progressistas também possuem o “know-how” de engajamento nas redes sociais. A grande diferença está no fogo amigo bastante comum entre militantes de esquerda.

O filósofo Jon Haidt institui a teoria de sistemas morais. A esquerda usa muito a estratégia de monitoramento de seus grupos – ou seja, qualquer discordância, por mínima que seja – para excluir um membro de seu próprio grupo. Isso se deve ao fato de que liberais constroem seus sistemas morais principalmente sobre apenas dois fundamentos psicológicos: Dano/cuidado e Justiça/reciprocidade. Já os conservadores, mais à direita, possuem sistemas morais de forma mais equilibrada sobre cinco fundamentos psicológicos, incluindo Lealdade ao grupo, Respeito à autoridade e Pureza/santidade, além dos dois valorizados pelo outro espectro.

Ou seja, uma discordância não é razão, para os conservadores, para excluírem um membro do seu grupo, pois possuem mais pilares morais com o qual julgar uma questão política/social ou cultural. Já os progressistas/esquerda, por terem uma visão mais estreita dos mesmos eventos, podem acabar se quebrando em várias facções e não construírem um movimento realmente popular.

Não há, inclusive, evidências que comprovem que os conteúdos de direita estejam sendo amplificados pelos algoritmos das redes sociais. Pelo contrário, a mesma pesquisa da Pew Research sobre percepções de usuários sobre qual tipo de conteúdo eles veem mais em seus feeds, as redes sociais Instagram, Facebook, e TikTok são, majoritariamente, divulgadoras de conteúdos de esquerda. O X/Twitter, por incrível que pareça, é, na percepção dos usuários, a rede social mais balanceada de todas as pesquisadas.

Essa “intolerância interna” mais acentuada entre grupos e influenciadores digitais de esquerda é, sem dúvidas, a grande influência negativa nos números de engajamento. Afinal, um criador de conteúdo com viés mais radicalizado ao socialismo, por exemplo, dificilmente vai compartilhar ideias ou medidas que ele considera “pelegas” por parte de um governo petista, historicamente conciliador. Enquanto na direita, os conservadores lidaram tranquilamente com a estratégia de utilizar o alcance e a fama de um ex-ator de filmes adultos para somar seguidores à sua causa, a partir do momento em que ele deixou de lado seu passado e se comprometeu com os valores morais do grupo. A esquerda se perde no “fogo amigo”, enquanto na direita “o inimigo do inimigo sempre será um amigo”.

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Lilian Carvalho é PhD em Marketing, coordenadora do Centro de Estudos em Marketing Digital da FGV/EAESP e fundadora da Método Lumière.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]