Ouça este conteúdo
O Brasil surge como um dos possíveis líderes de um futuro mercado global de hidrogênio verde, dado o seu potencial para produzi-lo em grande escala por meio de processos envolvendo fontes renováveis e agrícolas, sem prejuízo do uso de biomassa e biogás. Mais que promessa ou ficção científica, avanços regulatórios e acordos firmados neste ano mostram iniciativas já saindo do papel.
Considerado fonte de energia com grande potencial e um canal disruptivo, o hidrogênio se tornou um objetivo estratégico em grande parte do globo. Embora com desafios tecnológicos e de mercado significativos, ganhou destaque no pós-pandemia para promover a retomada econômica e acelerar a transição energética. Neste sentido, novas fronteiras podem ser desenvolvidas em transporte, geração de eletricidade, armazenamento de energia e processos industriais. O armazenamento de energia, por sua versatilidade, é capaz de promover o acoplamento setorial entre os mercados de combustível, elétrico, industrial e outros. Estudos indicam que isso poderia contribuir para a descarbonização da economia mundial e promoção para um mercado mais competitivo.
O Hydrogen Council, que reúne CEOs de 92 empresas globais, estima que o hidrogênio verde responderá por quase 20% da demanda de energia no mundo até 2050 – um mercado estimado em US$ 2,5 trilhões e 30 milhões de empregos. No Brasil, desde fevereiro de 2021, foram assinados ao menos seis memorandos de entendimento entre os estados do Ceará, Pernambuco e Rio de Janeiro com multinacionais. Os investimentos em projetos de produção de hidrogênio verde a partir de fontes renováveis são estimados em US$ 22,2 bilhões.
Governo e atores relevantes têm se engajado em iniciativas e parcerias internacionais para acelerar a formalização da estratégia nacional de hidrogênio, o que resultou na inclusão do hidrogênio no Plano Nacional de Energia 2050, aprovado em dezembro de 2020 pelo Ministério de Minas e Energia (MME). Para endereçar os riscos, desafios e explorar o potencial da produção de hidrogênio verde, em agosto de 2021 o MME apresentou ao Conselho Nacional de Política Energética as diretrizes do Programa Nacional do Hidrogênio do Brasil (PNH2).
Como a indústria de hidrogênio requer investimentos pesados, uma das principais preocupações é o financiamento para estudos de desenvolvimento, treinamento e construção de projetos. Esses recursos podem vir de financiamentos locais, internacionais e do mercado de capitais. O próprio PNH2 prevê que se identifiquem fontes e instrumentos de financiamento internacional, como fundos verdes, agências de cooperação internacional, bancos multilaterais de desenvolvimento e fundos de investimento.
No entanto, para atração de investimentos externos a este incipiente setor, é importantíssima a criação de um arcabouço legal e regulatório sólido e confiável. Iniciativas como os projetos de lei 7.063/2017 e 5.387/2019, atualmente em análise no Congresso Nacional, certamente seriam benéficos para endereçar claramente certos riscos de moeda. Neste contexto, e independentemente de alterações legais, as chances de sucesso no incremento do espectro de possíveis credores e investidores estrangeiros podem aumentar caso utilizadas abordagens criativas na estruturação de projetos locais de hidrogênio verde, de modo a abordar, do ponto de vista legal e contratual, certos riscos, como a flutuação cambial (incluindo possivelmente a indexação em moeda estrangeira nos contratos de fornecimento locais).
Com as condições legais favoráveis e uma melhoria do cenário econômico e ambiental, é possível esperar para breve mais notícias sobre o desenvolvimento da indústria de hidrogênio verde no país – uma tendência muito alinhada com demandas e necessidades globais.
Thiago Vallandro Flores é mestre em direito (LL.M. em International Legal Studies) pelo Georgetown University Law Center (Estados Unidos) e especializado em Direito Internacional. Rodrigo Murussi é pós-graduando em Direito dos Mercados Financeiro e de Capitais.