A proposta de criar um novo imposto, a Cide municipal para subsidiar o transporte coletivo, acenando inclusive com uma espetacular redução da tarifa do transporte coletivo urbano com base em um "estudo" do Ibre, órgão de pesquisa ligado à FGV, veio do prefeito Fernando Haddad, de São Paulo. Com base nesse "estudo", Haddad defende que se crie uma sobretaxa fiscal sobre a gasolina, no valor de R$ 0,50 por litro – quase 20% do preço atual. E já disserta com desenvoltura sobre os efeitos sociais e ambientais benéficos dessa política.

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Ocorre que o tal "estudo" foi classificado pelo seu próprio autor como preliminar, para ser entendido com grandes reservas e cautelas. Ele próprio aponta para uma fragilidade crítica: "[Ele, o estudo] tem uma hipótese que deixa todo economista desconfortável, porque leva em conta a elasticidade zero de resposta da demanda". Em português claro: considera-se que a demanda de transporte coletivo e do transporte individual não cresçam nem diminuam quando a passagem cair para menos da metade do preço atual e o litro da gasolina subir 20%. No mundo real, essa hipótese é absolutamente irreal.

Mas, para contrariar o modelo e prosseguir com os devaneios do prefeito Haddad, vamos imaginar que haja uma migração em massa para o transporte coletivo, o qual já está saturadíssimo, com ônibus superlotadíssimos transitando em vias entulhadíssimas (tudo no superlativo) de outros ônibus. Vai-se colocar mais veículos nelas? Como será aplicada a verba, diretamente ou subsidiando os concessionários atuais? E outras questões indigestas, embora inevitáveis.

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Então, construam-se linhas de metrô, de VLT, de monorail, bradará o nobre prefeito. Se o povo não tem pão, coma brioche! Pergunta perturbadora e desestruturante do raciocínio: quantos anos leva para que uma linha de metrô ou de VLT ou de monorail fique pronta? E como a população encararia o aumento brusco da gasolina para arrecadar a tal Cide municipal? A resposta de Haddad é um primor daquilo que os ingleses chamam de "gobbledigook", o emprego de frases rebuscadas para não dizer absolutamente nada de útil: "Perguntado se a população estaria disposta a arcar com o acréscimo de R$ 0,50 no preço da gasolina, Haddad defendeu um amplo debate sobre a proposta. ‘Não penso que seja a decisão de um prefeito, governador ou da própria presidente. A população precisa ser consultada, esclarecida. Não é para ser feito um debate açodado, porque isso vai acabar prejudicando a ideia em vez de favorecer’, propôs", segundo a imprensa.

De sólido nessa história toda só existe uma coisa: a velha sanha de querer tirar um pedaço a mais da renda da população sob a forma de tributo, de colocar mais um monte de palha no lombo do camelo já derreado por uma carga fiscal que lhe subtrai quase 40% do que ganha a cada ano. O resto é mais uma ideia lançada ao vento sem qualquer análise prévia e realista da realidade a ser enfrentada.

Modelos matemáticos, econométricos ou quaisquer outros são representações simplificadas de situações complexas, ensinava o mestre Karl Popper. O duro é quando um administrador público acredita que resolverá problemas complexos simplesmente acreditando em um modelo aparentemente brilhante. Isso corresponderia ao ministro da Fazenda ficar jogando Banco Imobiliário e acreditar que está gerenciando a economia real. O que, aliás, até parece acontecer com desconcertante frequência neste país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza.

Belmiro Valverde Jobim Castor é professor do doutorado em Administração da PUCPR.