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Imagens póstumas: quem pode explorar imagens de artistas já falecidos

Cena da propaganda que recriou Elis Regina com uso de Inteligência Artificial (Foto: Reprodução / Youtube Wolkswagen do Brasil)

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A recente veiculação de uma publicidade com a imagem da cantora Elis Regina ensejou a instauração pelo Conselho Nacional Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária (Conar) de um processo ético, que tem como foco o debate relacionado aos limites da inteligência artificial para recriar a imagem de uma pessoa morta, bem como a proteção à imagem da cantora. Além disso, artistas internacionais, como a atriz Whoopi Goldberg e a cantora Madonna já divulgaram que, via testamento, deixaram proibidos os usos de suas respectivas imagens após a morte, por meio recriações por inteligência artificial ou hologramas. A partir desses casos concretos é possível analisar a problemática envolvendo a preservação do direito de imagem após a morte e a possibilidade de disposição deste direito via testamento no Brasil.

Os direitos de imagem, voz e nome, por exemplo, integram o rol dos direitos da personalidade. A proteção a esses atributos da pessoa humana consta no art. 5º, V e X, da Constituição Federal, que assegura a sua inviolabilidade. O direito à imagem é um direito personalíssimo, mas, diferente de outros direitos desta natureza, que apenas vigem durante a vida de seu titular, persiste ao seu falecimento. Além disso, pode deter um viés econômico (como ocorre com o caso de artistas, modelos, influenciadores digitais, profissionais reconhecidos, entre outros), sendo passível de cessão e licenciamento.

Nossos tribunais entendem que seria indevido o uso de imagem para fins publicitários e econômicos de pessoa falecida sem a autorização expressa de seus herdeiros.

O art. 12 do Código Civil fornece o instrumental para que o interessado exija, em juízo, que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclame perdas e danos. Não apenas o uso indevido de imagens ou gravações já existentes, mas também a produção de novos materiais com o uso de tecnologia (hologramas, deep fake etc.) pode caracterizar o dano e ensejar o direito indenizatório. Diante de injusta violação póstuma dos direitos da personalidade, o espólio ou os sucessores legais podem agir contra o agente causador do dano. E as providências a serem adotadas para que cesse a lesão são bastante amplas, contemplando todos os mecanismos processuais e ferramentas tecnológicas para a cessão imediata do uso indevido dos atributos da personalidade.

Isso porque, mesmo o Código Civil sendo omisso sobre a exploração do direito de imagem de pessoas falecidas, prevê que os herdeiros detêm legitimidade para propor ação de indenização post mortem em razão da violação de direitos de personalidade. Assim, compreende-se que a titularidade do direito de imagem da pessoa falecida será transmitida aos seus herdeiros. Diante disso, nossos tribunais entendem que seria indevido o uso de imagem para fins publicitários e econômicos de pessoa falecida sem a autorização expressa de seus herdeiros.

Quanto ao viés sucessório do direito de imagem, tal como ocorre com outros direitos que podem ser inclusos no inventário da pessoa falecida, se a pessoa titular deste direito nada dispuser via testamento sobre a funcionalização ou delimitação do uso de sua imagem, seus herdeiros poderão fazer uso ilimitado desta – persistindo apenas freios constitucionais e sociais.

Vale destacar que nossa legislação admite que os testamentos podem deter conteúdo patrimonial ou extrapatrimonial, possibilitando que qualquer pessoa, famosa ou não, possa dispor em seu testamento sobre o uso de sua imagem após a morte. As pessoas que detêm um valor econômico agregado à sua imagem, por fatores pessoais ou profissionais, podem (e é altamente recomendável  que o façam) elaborar um testamento com a previsão de: i) como deverá ocorrer o uso de sua imagem após a morte – sendo possível delimitar expressamente as finalidades; ii) se ela ocorrerá por meio oneroso ou gratuito; iii) quem serão os herdeiros que deverão receber a titularidade deste direito e seus frutos (na hipótese de haver a permissão da exploração onerosa) e; iv) permissão ou não de sua recriação por inteligência artificial/ hologramas. Essa providência, bastante simples, sinaliza claramente a intenção de preservação dos seus atributos da personalidade, reassegurando aos herdeiros o direito de adoção das providências legais cabíveis para a cessação da injusta violação.

Diana Geara é sócia do Núcleo de Direito de Família e Sucessões da Dotti Advogados; Lais Bergstein é sócia e integrante do Núcleo de Direito Civil da Dotti Advogados.

Conteúdo editado por: Jocelaine Santos

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