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Opinião do dia 1

Importar lixo, um erro

O aterro sanitário da Caximba recebe cerca de 2.400 toneladas de resíduos sólidos por dia. Os moradores de Curitiba enviam cerca de 61% desse total, enquanto outros municípios da região metropolitana respondem por 25%. Outros 14% vêm de grandes geradores do comércio, dos serviços e da indústria, que, legalmente, são responsáveis pela coleta e o destino final de seus resíduos. Ou seja, quase mil toneladas de resíduos aterrados diariamente na Caximba não são da competência do município.

À parte outras questões relacionadas à gestão dos resíduos, critica-se o fato de que nossa capital é uma das únicas dentre as grandes do Brasil que importam resíduos de toda a região metropolitana para dentro de seu território. As outras fazem exatamente o contrário: exportam os resíduos para aterros de municípios vizinhos ou, quando dispõem de aterros próprios, não recebem resíduos de fora, de qualquer fonte geradora, para preservar a valiosa vida útil deles. Porto Alegre, Florianópolis, São Paulo, Rio de Janeiro, e Belo Horizonte, por exemplo, adotam este procedimento, pois os impactos socioambientais da instalação de aterros nas áreas mais adensadas são maiores e mais complexos.

A Caximba foi projetada para operar por ínfimos 11 anos, a partir de 1989. Mesmo assim, ao invés de preservar sua vida útil, já no início da operação acolheu os resíduos de São José dos Pinhais. Em 1993, já recebia os resíduos de mais seis municípios. Com a crescente pressão para a eliminação de lixões, o município passou a receber e a subsidiar praticamente mais um município por ano até atender toda a região metropolitana, exceto Lapa e Balsa Nova, que dispõem de aterros próprios.

Após várias ampliações emergenciais complexas e 19 anos de operação, mais uma vez surge o risco de colapso pelo encerramento da Caximba. O anacrônico modelo concentrador de Curitiba se constituiu, ao longo dos anos, em total desestímulo aos vizinhos no que se refere à não geração, ao reaproveitamento, à seleção, à reciclagem e à implantação de um ou mais novos aterros de menor dimensão, em local apropriado, para atendimento de demandas regionais.

A Região Metropolitana de Curitiba (RMC) é ambientalmente complexa, com grandes áreas de mananciais protegidas que inviabilizam a implantação de aterros. Em 1996, fracassou a tentativa de se implantar o aterro metropolitano em Rio Branco do Sul. Estudos técnicos posteriores apontaram para a região sul e sudoeste da RMC, com nítida vantagem para Araucária. A Câmara de Vereadores deste município apressou-se então a criar legislação restritiva, impedindo a importação de resíduos. Hoje, os municípios de Araucária, Campo Largo e Mandirituba, têm leis que impedem a destinação de resíduos provenientes de fontes geradoras externas em seus territórios. Enquanto isso, a Caximba vê esgotar rapidamente sua capacidade e ações desesperadas para a derrubada da Lei e em Mandirituba são empreendidas ao mesmo tempo em que se considera uma solução emergencial como o transporte dos resíduos até Ponta Grossa, por trem. Nesse panorama de iminente catástrofe ambiental e de saúde pública, como a que assolou Nápoles, na Itália, em 2007, onde os resíduos eram espalhados pelas vias públicas, soluções como o transporte temporário de resíduos "in natura" a Ponta Grossa se apresentam como paliativas, mesmo a custos elevados. Mas a correção definitiva de rumos se fará através de mudança de atitude: a prefeitura de Curitiba precisa impedir imediatamente ou conceder 30 dias de prazo para que a parcela de resíduos que não é de sua competência seja encaminhada a outro destino, temporário ou definitivo. Essa é a forma mais eficaz de viabilizar o consórcio, por meio de soluções eficazes, sem exclusão de responsabilidades. Após 13 anos de tentativas infrutíferas para a solução deste grave problema, é incompreensível a adoção de soluções "menos ruins", considerando a longa vida útil que se espera de um empreendimento desse porte.

Fernando Salino Cortes é engenheiro civil especializado em Engenharia Sanitária e Ambiental pela UERJ e mestre em Saúde Pública pela USP.

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