O país insiste no erro de políticas para destruir a competitividade nacional e o potencial social e econômico do petróleo brasileiro. Monteiro Lobato já criticava o “não perfurar e não deixar que se perfure”. Após lançar o Escândalo do Petróleo, há quase um século, discordou de Getúlio Vargas. Como resultado, o livro foi censurado. Algum tempo depois, Monteiro escreveu uma carta ao ditador, defendendo a existência de petróleo no Brasil e a importância de permitir a entrada de investimentos, mas acabou preso.
O Estado Novo de Vargas, numa visão míope e controladora, afirmava que não existia e nem poderia existir petróleo no Brasil, bloqueou avanços e investimentos. Enquanto isso, naquela época, descobertas petrolíferas se multiplicavam nos demais países americanos. Getúlio preferiu a negação e perdemos o primeiro boom mundial do petróleo.
A tendência é a sociedade brasileira pagar ainda mais caro pelo petróleo e pelos combustíveis. Saímos do ciclo virtuoso, para entrar no ciclo vicioso.
Agora, o país volta a insistir em errar, com a criação do imposto de exportação sobre petróleo. Ao invés de trilhar o caminho correto, iniciado a partir da abertura do setor e da flexibilização do monopólio estatal, na década de 1990, promove-se o retrocesso com a Medida Provisória 1.163, de 2023.
Tributar a exportação possui duas vertentes muito ruins. A primeira é pôr em risco o futuro da exploração do Pré-sal e das demais bacias petrolíferas brasileiras e, como consequência negativa, matar a galinha dos ovos de ouro, uma riqueza da população. Entre janeiro e outubro do ano passado, os produtores de petróleo pagaram R$ 94,5 bilhões de participações governamentais para os municípios, os estados e a União, de acordo com os dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Diversas ações e políticas públicas, em áreas como saúde e educação, dependem dessas participações originárias do petróleo. Além disso, em 2022, em função da exportação do óleo cru, entraram no país cerca de 43 bilhões de dólares bilhões em divisas, equivalente a R$ 220 bilhões em um único ano, sendo, portanto, uma importante contribuição para a nossa balança comercial.
Não podemos esquecer que, em um mundo em transição energética, na direção de um futuro mais sustentável, o petróleo tem data de validade. Se não for aproveitada a janela de oportunidade que está cada vez mais estreita, a sociedade brasileira não aproveitará os recursos financeiros e sociais advindos dessa riqueza.
Imposto de exportação desestimula investimentos e empregos, destrói a renda da sociedade. Em qualquer área, quando as exportações são tributadas, os produtores têm menos incentivos para produzir. Logo, estimula a redução na produção e a demissão. No médio prazo, além de menos empregos e investimentos no setor de petróleo, assim como no setor de gás natural e também de biocombustíveis, todos somos afetados pela crise de confiança, a medida estimula o desabastecimento interno. A tendência é a sociedade brasileira pagar ainda mais caro pelo petróleo e pelos combustíveis. Saímos do ciclo virtuoso, para entrar no ciclo vicioso.
Além disso, o imposto de exportação, através de Medida Provisória, da noite para o dia, vai de encontro à previsibilidade e à estabilidade das regras, afetando diretamente a credibilidade. No médio e longo prazo, as empresas brasileiras e as multinacionais vão explorar e produzir petróleo em outros países, eventualmente até mesmo em nossos vizinhos, do que gerar renda no país. A arrecadação do governo nos próximos leilões de petróleo ficará igualmente comprometida. Isso porque a instituição do imposto, ainda que temporariamente, afeta a percepção e a confiança de quem investe. Haverá, certamente, menos interessados nos próximos certames, a concorrência será menor, o Brasil produzirá menos petróleo. Ainda, é uma medida que prejudica as relações comerciais, expõe o país ao risco de sofrer retaliações externas.
A segunda vertente é a jurídica. A decisão é frágil e pode ser questionada, uma vez que o imposto de exportação tem natureza regulatória e extrafiscal. Isso significa que a função primordial deste tributo é regular mercado e não pode ter finalidade meramente arrecadatória. Contudo, na Exposição de Motivos da Medida Provisória 1.163, fica transparente que o objetivo foi essencialmente arrecadar, em quatro meses, R$6,65 bilhões. Não há função regulatória, tampouco poderia existir, acerca de um produto que é uma commodity mundial e cujo imposto de exportação não trará qualquer reflexo no aumento da produção brasileira de combustíveis. Ademais, não vivemos uma crise de desabastecimento de petróleo.
Nessa vertente jurídica, o Código Tributário Nacional (CTN) tem status de lei complementar e, constitucionalmente, não pode ser alterado por Medida Provisória. O Código estabelece claramente que a faculdade do Poder Executivo aumentar o imposto de exportação deve atender aos objetivos da política cambial e do comércio exterior, que não é o caso da finalidade puramente arrecadatória. A Lei Geral do Imposto de Exportação diz a mesma coisa.
A decisão de criar imposto de exportação é ruim e perigosa. Ainda que temporária, abre o precedente para o governo prorrogar o imposto como bem quiser, ou mesmo replicar a medida para outros segmentos. Aí se incluem o minério de ferro, soja, açúcar, carnes, automóveis, aeronaves, celulose e muitos outros produtos que exportamos. Toda a sociedade está em risco, o benefício imediatista da arrecadação de curto prazo é aceitar o malefício de menos investimentos e menos empregos para as gerações futuras.
Ricardo Borges Gomide é mestre em Engenharia Mecânica e especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental. Desde 2001 trabalha no setor de combustíveis e energia.
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