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In varietate discordia

Fenômenos caóticos existem em abundância. Mudanças fundamentais acontecem nas sociedades provocando temores ante o caos (interferências de ordens diferentes). Todavia, sempre há meios para alcançar harmonia entre situações antagônicas. Crises prenunciam caos que não é per si negativo, nem a ordem de per si positiva.

A permanência do Reino Unido na União Europeia está susceptível ao resultado de plebiscito a ser realizado em 2017. O farfalhar das asas britânicas pode desencadear tornado na União Europeia, fazendo ruir a ordem semifederal, reavivando a babel cacofônica do passado.

O desconforto dos ilhéus com a ascendência de Bruxelas sobre o British way of political life é antigo. Nas incongruências típicas da política, lutaram para que a Escócia não se desligasse do Reino Unido; hoje os eurófilos falam baixo e os eurófobos rugem, afirmando que a União é fonte de problema, não de soluções.

O divórcio pode ser a cereja do bolo para David Cameron, que aposta no velho modelo dos anos 60, quando a Europa tinha laços um pouco mais fortes do que os ectoplasmas do fantasmagórico Mercosul.

O desconforto dos ilhéus com a ascendência de Bruxelas sobre o British way of political life é antigo

Ao abrir o baú da Europa à cata das fotos de família para ver as pessoas que estão na árvore genealógica do mais amplo e complexo projeto democrático da história, como inimigos tornam-se amigos – talvez nem tão amigos assim –, não surgem nomes da língua de Shakespeare. Jean Monet, Robert Schuman, Konrad Adenauer estão em todos os retratos e cartões de aniversário, mas nenhum súdito de Sua Majestade dá o ar da graça.

A arquitetura da edificação política apta a superar a eurofagia não é hostil à soberania nacional. Contudo, para industriar a esperança, indica horizonte de federação ao modelo norte-americano. Não chegaram a tanto, mas houve spill over de cooperação, reduzindo custos de transação com ganho de competitividade e vantagens no comércio mundial, moeda única, mercado sem fronteiras, no qual pessoas, bens, capitais e serviços circulam livremente.

A União Europeia está na zona hachurada entre confederação e federação. Um quase lá nas duas direções, mas os casmurros da ilha não participam do euro!

Inteligência e vontade diplomática construíram a família política europeia para superar história dramática de guerras cruentas. Foram o sopro divino que transformou o caos em ordem onde havia aleatoriedade, irregularidade e imprevisibilidade, causadas por visão reducionista de mundo. A ilha é o meu mundo, diziam em Lilliput!

Os eurocéticos bradarão que a história está no fim. Os eurotimistas, que será o momento de redirecionar as relações políticas e econômicas e que a compreensão dos novos acontecimentos depende de teorias adequadas e novas hermenêuticas, preferencialmente as do bem. Destruição criativa, pensaria Schumpeter.

Parece que não há convivência perene que compense fragilidades e potencialize as forças se a premissa da reciprocidade não existir. O presente foge, o passado esmaece irrecobrável e o futuro torna-se incerto. Mesmo numa democracia é necessário antever os episódios e mostrar claramente o trade-off entre o céu de brigadeiro, estabilidade democrática e tempo de turbulências, resultado de decisões hedonistas.

Quiçá, a marcha fúnebre de Chopin substitua a Ode à Alegria de Beethoven porque the British choice envolve riscos e nem sempre é possível jogar todos os dados novamente. In extremis, obitus veneris e a almejada unidade na diversidade poderá ser sucedida pela adversidade na diversidade.

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