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Quando o Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou tese a respeito da cobrança de Imposto de Renda (IRPJ) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) dos ganhos obtidos com incentivos estaduais de ICMS, o entendimento inicial foi de que essa decisão ocorreu em favor da União. No final de abril, o próprio ministro da Fazenda, Fernando Haddad, comemorou o resultado, considerando o julgamento “exemplar”, com impacto de R$ 90 bilhões nas contas públicas. Mas será que essa narrativa se sustenta?
O assunto voltou a dominar a pauta tributária com a publicação do acórdão, especialmente no que se refere à apuração do lucro real e o que foi decidido pelos magistrados ao julgar o tema 1.182. Recentemente, a própria Receita Federal identificou e notificou 5 mil CNPJs, que teriam apresentado sinais de redução imprópria dos valores de IRPJ e CSLL. Fixou prazo de autorregularização para 31 de julho. Na mensagem, o órgão reforça que essas empresas deverão revisar e apresentar uma série de documentos, para comprovar que “as exclusões mencionadas estejam em conformidade com a legislação em vigor”.
Não é exagero afirmar que o Ministério da Fazenda contou vitória maior do que obteve. Importante destacar que as teses fixadas no julgamento não deram passe livre para a União cobrar de todo mundo.
Causa ainda mais estranheza o fato desse movimento ocorrer antes mesmo do início do processo de fiscalização da própria Receita. Segundo o órgão, o objetivo é permitir a redução do litígio, com “uma solução mais eficiente e proveitosa para as empresas e para a população brasileira”. No governo federal, essa é considerada uma das principais iniciativas da área econômica para aumentar a arrecadação em 2023 e nos próximos anos. Está sendo considerada, ainda, como a melhor alternativa para viabilizar o ajuste das contas públicas.
Cabe resgatar que após os dez votos dos ministros, o STJ decidiu que os benefícios fiscais relacionados ao ICMS não devem ser excluídos da base de cálculo do IRPJ e da CSLL. Fazem parte dessa equação reduções de base de cálculo, diminuição de alíquota, isenção, imunidade e diferimento, entre outros. Há exceções — desde que atendidos os requisitos previstos no artigo 10 da Lei Complementar 160/2017 e no artigo 30 da Lei 12.973/2014. Tais normas estabelecem que os ganhos com os incentivos têm de ser registrados em reserva de lucros. Isso significa que só podem ser utilizados na própria empresa, não sendo permitido, por exemplo, distribuir aos sócios como dividendos.
Ou seja, ficou claro que os contribuintes continuarão usufruindo dos benefícios fiscais na medida em que preencherem os pressupostos legais. Em momento algum, portanto, o STJ tolheu o direito das companhias de excluir esses benefícios da apuração do IRPJ e CSLL. Diante disso, não é exagero afirmar que o Ministério da Fazenda contou vitória maior do que obteve. Importante destacar que as teses fixadas no julgamento não deram passe livre para a União cobrar de todo mundo. Pelo contrário: com a decisão, empresas contribuintes terão mais segurança para direcionar o planejamento tributário e aproveitar os benefícios.
Nesse contexto, a Receita Federal poderá fiscalizar e cobrar os tributos se verificar que os valores dos incentivos foram utilizados para finalidade estranha à garantia da viabilidade do empreendimento econômico. Agora, se a União promover cobrança generalizada dos tributos mencionados sobre as empresas que usufruem dos incentivos fiscais, haverá uma nova onda de contenciosos, administrativos e judiciais, sobre o assunto. Trata-se de um novo cenário, a partir do qual as organizações precisarão estar mais atentas e com o devido planejamento tributário em dia.
Rafael Marin é coordenador da Área Tributária da Biolchi Empresarial.