A recente indicação de Flavio Dino, Ministro da Justiça, ao Supremo Tribunal Federal (STF) reacende o debate sobre a independência judicial e a estabilidade política no Brasil. A escolha de Dino, ex-deputado, ex-governador, senador licenciado e lulista de longa data, não só perpetua a prática de indicações políticas para o STF, mas também contradiz as promessas de pacificação nacional feitas pelo presidente durante a última campanha eleitoral.
Na última década e meia, no país do futebol, tornou-se mais fácil escalar os 11 ministros do Supremo Tribunal Federal do que o time titular da Seleção Brasileira. E as coisas não deveriam ser assim. O STF transformou-se em um dos principais atores do cenário político nacional. Decisões polêmicas, declarações públicas questionáveis, e inquéritos problemáticos, como das fake news, ampliaram a presença e o poder dos ministros da corte na sociedade, mas também abriram espaço para questionamentos sobre seus limites.
As indicações feitas por Lula sugerem uma tendência de transformar o STF em um campo de batalha político, em vez de um pilar de justiça imparcial.
A crescente percepção do STF como uma entidade politizada ameaça a estabilidade da democracia brasileira. As intervenções frequentes de seus membros em questões políticas diminuíram a autoridade institucional da corte, expondo-a a um escrutínio público tipicamente reservado a figuras políticas. O resultado da simbiose justiça-política foi o arrasto do tribunal para a vala comum da desconfiança popular. Em uma pesquisa divulgada no último trimestre, o Supremo aparece como uma das instituções menos confiáveis para os brasileiros, à frente apenas das duas casas do Congresso Nacional e dos partidos políticos.
Se estivesse disposto a pacificar a sociedade – e aliviar a politização a corte constitucional do país –, Lula deveria ter dispensado atenção especial às suas indicações ao Supremo. É nele que se concentram algumas das atribuições fundamentais para a preservação do nosso arcabouço institucional. Além disso, as características da posição de ministro do STF, principalmente a estabilidade na função até a aposentadoria mandatória, favorecem a indicação de um perfil que olhasse para o Brasil do médio e longo prazo, para além dos efêmeros mandatos eletivos e das disputas eleitorais.
Mas eleito presidente pela terceira vez, não foi esse o caminho que Lula escolheu. Ele ignorou suas promessas, mesmo as feitas para as câmeras de televisão, e indicou seu advogado pessoal, Cristiano Zanin, para a primeira vacância no STF. A indicação de Flávio Dino reforça a tendência personalista das decisões do presidente. Não foram suficientes a pressão da oposição política contrária à indicação do ministro socialista ou a pressão identitária contrária à indicação do ministro do sexo masculino.
A nomeação de ministros da Justiça para o STF não é novidade; o exemplo de Alexandre de Moraes, indicado enquanto ocupava o ministério da Justiça durante a gestão de Michel Temer, é notório. No entanto, o contexto atual, especialmente após os eventos de 8 de janeiro de 2023, exige uma abordagem mais cautelosa.
O Supremo deve manter-se acima das disputas políticas diárias, garantindo equidade nos julgamentos e uma distância saudável das polêmicas. A nomeação de Dino não fortalece o processo de redução de ruídos entre a corte e parte da sociedade, e coloca ainda mais em risco a já enfraquecida percepção de independência dos seus julgamentos frente os interesses políticos de ocasião.
As indicações feitas por Lula sugerem uma tendência de transformar o STF em um campo de batalha político, em vez de um pilar de justiça imparcial. A pacificação e o fortalecimento das instituições democráticas requeriam indicações baseadas em competência jurídica, imparcialidade e independência, mas, além disso, o momento exigia prudência por parte do presidente. E, infelizmente, essa foi uma qualidade que Lula não demonstrou em suas indicações para o Supremo Tribunal Federal.
Magno Karl , cientista político e diretor executivo do Livres, é bacharel em Ciências Sociais, mestre e doutorando pela Universidade de Erfurt (Alemanha), e PhD fellow da Fundação Naumann (Alemanha). Também é pesquisador do Instituto Cato (EUA), e cofundador do antigo Instituto Ordem Livre.
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