Alguns fatores contribuíram para elevar a participação do produto importado no consumo interno: sobrevalorização do real, disponibilidade de financiamento, emprego em alta associado a padrões de remuneração média mais elevados, maior poder aquisitivo. Dentre os efeitos dessa combinação está a queda do desempenho da indústria brasileira.
Dados de 2011 apontam uma participação de 20% de produtos importados no total do consumo interno brasileiro. Acrescentando-se a participação de importados com entrada não legalizada, próxima a 5%, chega a 25% a fatia do exterior no consumo interno.
A produção nacional teria, então, uma participação ao redor de 75% no consumo interno, ou seja, um desempenho que implica queda na produção industrial, substituída pela demanda de bens de origem externa.
Por um lado, esse perfil tem criado limitações à indústria brasileira, obrigada a suportar uma pesada carga de ônus: trabalhistas, tributários, previdenciários e outros, que repercutem sobre o preço final e limitam a competitividade, diante da globalização nas economias. Por outro lado, existe uma extensa estrutura do setor empresarial privado, na qual parte expressiva dos negócios ocorre via importados que entram legalmente no país, pagam tributos e atendem consumidores dispostos a adquirir produtos gerados do exterior.
Justifica-se a adoção de políticas de expansão da produção industrial interna e ampliação da utilização da capacidade produtiva instalada, importantes para iniciar um processo de recuperação industrial. A interdependência cada vez maior entre setores, países e economias, justifica a adoção de precauções necessárias a fim "não desvestir um santo para vestir outro".
No contexto das adequações possíveis, o governo brasileiro anunciou um pacote de providências econômicas no valor de R$ 60 bilhões, de cunho tributário, alfandegário, trabalhista e previdenciário, destinadas a melhorar o desempenho da indústria. Algumas das providencias não deverão produzir efeitos imediatos. Os entraves burocráticos permanecem intocáveis. Existe ainda um espaço para enrijecer a fiscalização nas entradas de aeroportos, no sentido de conter o volume elevado de gastos do turista brasileiro no exterior.
A expectativa é de que as providências divulgadas possibilitem melhorar a competitividade industrial, a entrada de novas empresas, e iniciem um redirecionamento que possa beneficiar o setor. O governo deu um passo importante, mas ainda não suficiente.
No entanto, numa economia cada vez mais interdependente, com extensa rede de interações e efeitos multiplicadores diretos e indiretos, surge uma pergunta: e os demais setores como ficam?
Dentre os demais setores, cabe destacar o comércio, atividade detentora de crescimento persistente e significativo no triênio 2009-2011 na composição do PIB, sendo o segundo maior gerador de empregos de 2008 a 2011 (dados do Ministério do Trabalho e Emprego). O comércio disponibiliza e faz chegar ao consumidor os bens produzidos pela indústria e agricultura.
Neste momento estratégico de tomada de decisões destinadas a estimular o sistema produtivo, o governo brasileiro não pode se arriscar a comprometer os demais setores, focando benefícios, isenções e desonerações apenas para um segmento. As demais atividades econômicas legalmente instaladas, recolhedoras de impostos, geradoras de emprego e renda, que se submetem a pesada carga dos inúmeros componentes do "Custo Brasil", também se fazem merecedoras da atenção das autoridades governamentais.
Não se reivindica o "passar a mão na cabeça". Num processo de diálogo com as autoridades federais, é importante que outros setores sejam ouvidos e possam levar ao governo as dificuldades do dia a dia.
Darci Piana é presidente do Sistema Fecomércio Sesc Senac Paraná.