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A Lei de Biossegurança que regulamenta, entre outras coisas, a liberação de embriões humanos para a pesquisa no Brasil, continua provocando debates em nossa sociedade. Gostaríamos de afirmar claramente que o debate em questão, neste momento, sobre o início da vida humana, não esgota toda a problemática das questões éticas que surgem ao redor do uso de embriões para a pesquisa. Entendemos que outras indagações seriam mais pertinentes às questões provocadas pela Lei de Biossegurança brasileira, a saber: é aceitável congelar embriões? É aceitável produzir embriões, no contexto das clínicas de reprodução assistida, sabendo da grande probabilidade de que muitos se tornarão excedentes? Dada a existência de embriões crio-preservados, é aceitável o seu descarte em pesquisas científicas? Muitos estudiosos têm afirmado que vigora, no Brasil, uma lei que só poderia ser aprovada após muitas outras leis no setor, ou seja, precisamos urgentemente regulamentar no Brasil a Reprodução Assistida, e não presumir que a prática, já de mais de duas décadas, seja entendida como aceitável jurídica e moralmente.

Nos aproximando do debate em questão, sobre o início da vida humana, precisamos reconhecer a diversidade de opiniões e a complexidade do tema. Entendemos que boa parte das dificuldades ocorre porque diferentes setores estão fazendo diferentes perguntas. Para a pergunta sobre o momento em que o humano deverá ser respeitado como um cidadão, a resposta se encontra na consulta aos códigos jurídicos e poderá ser diferente de um país para outro. Para a pergunta sobre o momento da vida em que humana em que se deve reconhecer a plena dignidade, a resposta nascerá de um juízo de valor – e a resposta de uma pessoa religiosa poderá ser bem diferente da de um ateu.

Outras perguntas ainda poderiam ser feitas, mas, para não nos estendermos, vamos à pergunta que está sendo feita pela sociedade neste momento: quando se inicia a vida humana? Neste caso a pergunta é feita à biologia e equivale a dizer: quando se inicia a vida (definida biologicamente com o surgimento de um novo organismo) humana (com características genômicas próprias da espécie Homo sapiens)? Neste sentido a resposta nos parece clara, e se estende ao início de qualquer organismo de qualquer espécie sexuada. Toda vez que temos um zigoto (após a fecundação), temos um novo organismo de uma determinada espécie que está vivo (caso contrário estaria morto). É neste momento que a vida deste novo organismo se inicia.

No caso da espécie humana, e de todas as espécies placentárias, este novo ser vivo depende radicalmente do organismo da mãe. Poderíamos tirar disto uma lição: fora do ambiente adequado, o ser humano e todos os outros seres vivos fenecem. Lição esta que estamos aprendendo com sofrimento, destruindo nosso ambiente maior – a Terra. Todos nós corremos riscos de ver nossas vidas se tornarem também inviáveis. Estamos assim cobrando responsabilidade excessiva da mulher? Talvez, mas este é um fato, muitas vezes a vida humana – e a de outros animais – estará à mercê de nosso compromisso e responsabilidade. Ou cuidamos da vida ou ela perece.

Que dignidade atribuímos a este ‘novo organismo’, membro da espécie humana? Muitas serão as respostas da sociedade, mas a de um cristão deverá ser uma só e clara: dignidade plena. Isto porque a dignidade é entendida, para um cristão, como um dom de Deus, não uma conquista humana. O valor da vida humana – e de todos os seres – tem um fundamento maior: é criação de Deus, obra de Deus. É contraditório, para um cristão, dissociar o fato da criação, da atribuição de dignidade. Cada ser vivo, passando a existir, o faz como conseqüência de um chamado divino e é este chamado que torna cada ser digno, segundo sua espécie.

A Igreja Católica e muitos outros grupos religiosos, aceitam o evolucionismo, como resposta científica a seguinte pergunta: Como surgimos? Ao mesmo tempo, insiste que cada novo ser é sustentado, amparado, querido, ou seja, criado por Deus. A fé na criação é a primeira resposta teológica cristã, e das outras religiões bíblicas, para afirmar a dignidade de cada ser vivo, a partir do momento de sua própria existência.

Mário Antonio Sanches é professor de Bioética e Teologia Moral, coordenador do Núcleo de Estudos em Bioética da PUCPR e diretor do curso de bacharelado em Teologia da PUCPR.

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