Ouça este conteúdo
Embora sempre em confronto com uma herança cultural patrimonialista e burocratizante profundamente arraigada, o Brasil, desde o período anterior à sua independência, tem sido berço de ilustres defensores do liberalismo. No século XIX, eles se fundamentaram nas principais referências bibliográficas e conceituais da tradição liberal nos Estados Unidos e na Europa para construir o sistema representativo no país.
No entanto, em uma reversão dessa tendência, ao longo do século XX, muitos desdobramentos teóricos e vertentes do liberalismo permaneceram acessíveis apenas a um círculo muito limitado de pensadores brasileiros. A Escola Austríaca de Economia, por exemplo, hoje tão mencionada por um número crescente de jovens engajados, era referenciada por personalidades como o economista Eugênio Gudin e o empresário Adolpho Linderberg, mas não encontrava aderência em setores mais amplos da população, mesmo no meio intelectual.
O Instituto Liberal já nasceu instado ao esforço praticamente inglório de sustentar que a abertura política brasileira deveria se fazer acompanhar de uma abertura econômica.
Esse contato com a tradição liberal exterior foi retomado principalmente graças à iniciativa pioneira do empresário Donald Stewart Jr., que, há exatos 40 anos, em 16 de janeiro de 1983, trouxe à luz a primeira instituição fundada no Brasil exclusivamente para disseminar o ideário do liberalismo: o Instituto Liberal. Inspirado no gesto do britânico Antony Fisher, que fundou o Institute of Economic Affairs, Stewart liderou o processo de inserção dos brasileiros no universo dos inúmeros institutos internacionais dedicados a difundir princípios como o Estado de Direito, a propriedade privada, a responsabilidade individual e a economia de mercado.
A iniciativa de Stewart estimularia, ao longo destas últimas quatro décadas, o surgimento de diversas outras instituições com objetivos similares, embora cada uma delas seguindo sua vocação específica. A popularização desse novo e vicejante movimento liberal, que ganhou expressão nos anos derradeiros do primeiro ciclo de poder lulopetista – com direito a expressões como “Menos Marx, mais Mises” aparecerem em cartazes e faixas de manifestações de rua –, não teria sido possível sem o trabalho duradouro da instituição criada nos anos 80 no Rio de Janeiro.
Vivenciando a transição entre o regime militar e a Nova República, o Instituto Liberal já nasceu instado ao esforço praticamente inglório de sustentar que a abertura política brasileira deveria se fazer acompanhar de uma abertura econômica. Em sua primeira década, o instituto foi responsável pelas traduções de obras inéditas no país, de autores como os próprios economistas austríacos, seus colegas da Escola de Chicago e da Teoria da Escolha Pública, entre outras correntes que enriqueceram o debate no Brasil e no mundo. Também editou autores nacionais e serviu como ponto de convergência institucional para liberais brasileiros de diferentes correntes, como Meira Penna, José Guilherme Merquior e Roberto Campos.
Já adentrando os anos 90, o instituto se dedicou a organizar publicações que analisavam projetos de lei e grandes questões nacionais, como a série Políticas Alternativas e a histórica revista Notas, além de apoiar palestras de grandes nomes ao redor do país e servir de anfitrião, em 1993, à reunião anual da Sociedade Mont Pèlerin, uma entidade que reúne pensadores liberais de todo o mundo. Tais ações prestaram uma histórica contribuição para que pautas de interesse do liberalismo, como as políticas de privatizações, avançassem no Brasil, mesmo sendo semeadas em um terreno de prevalência social-democrata.
Nas duas primeiras décadas do século XXI, a organização se dedicou a divulgar as teses liberais no ambiente virtual, promovendo amplo debate entre as diferentes escolas do liberalismo. Prossegue com perseverança em sua missão de realizar publicações, conferências, seminários e cursos que ajudem a oferecer à sociedade brasileira uma alternativa no mercado de ideias capaz de conduzir o Brasil ao caminho da prosperidade.
Olhando para trás, devemos nos inspirar na intrepidez dos fundadores do Instituto Liberal para conduzir seu legado adiante, enfrentando um cenário que não é menos desafiador do que aquele com que eles se defrontaram. Nossos votos são de que venham mais 40 anos e, ao término deles, nossos sucessores possam dizer que avançamos na promoção de nossa agenda, que, como diria o liberal espanhol Ortega y Gasset, é a “suprema generosidade” e a melhor novidade dos últimos séculos.
Lucas Berlanza é presidente da Diretoria Executiva do Instituto Liberal.