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Aqueles que não estão muito envolvidos no setor de tecnologia, ou se atentam apenas naquilo que poderiam ajudar no seu dia a dia – como, por exemplo, ampliar o tempo de bateria do celular – devem acreditar que a Inteligência Artificial é um recurso muito novo – e não é bem assim. Existe IA em quase todos os lugares, desde a chave do carro que destrava à distância, até robôs que operam horas na mesa de cirurgia com altíssima performance.
A dor crônica é um problema de saúde que afeta milhões de pessoas no mundo todo, causando sofrimento físico e emocional, além de reduzir a qualidade de vida. Muitas vezes, os métodos tradicionais de medir e tratar a dor são insuficientes ou ineficazes, deixando os pacientes sem alívio adequado. Segundo um estudo de 2021 da Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor, estima-se que três em cada dez indivíduos sofram com algum tipo de dor crônica. Atualmente, 190 milhões de adultos convivem com esse tipo de dor – que se caracteriza pela permanência superior a três meses –, e que pode ter relação direta à crises de ansiedade, depressão e dependência de opióides.
Na contramão da maioria de nós, leigos tecnológicos, no final do ano passado, Elon Musk, dono da Tesla, declarou que chegará um ponto em que empregos não serão necessários, e que as pessoas poderão ter emprego apenas por satisfação pessoal, ressaltando, ainda, que a IA será capaz de fazer tudo. Resta saber o que ele quis dizer com “fazer tudo”.
Para endossar, um levantamento recente do Fundo Monetário Internacional (FMI), aponta que o crescimento da inteligência artificial poderá atingir 40% dos empregos, podendo colocar em risco milhões de postos de trabalho em todo o mundo. Acredito que há um viés de conceito, onde a possível eliminação de empregos são transformadas em novas oportunidades de trabalho – natural do mundo moderno.
Trazendo esse contexto para o plantão médico, a questão requer uma abordagem mais cuidadosa. Um tênis pode ser produzido por robôs, embalado e distribuído com uso de IA em todos os processos, e, se algo não der certo, recalcula-se a rota e corrige. No âmbito da medicina não funciona bem assim, pois a área médica não admite falhas.
A inteligência artificial é fundamental, e chegou para somar. Não há dúvidas que muitos dispositivos gerenciados pela inteligência artificial contribuem para uma melhor análise de nós, médicos. A IA é uma grande aliada, com a vantagem, ainda, de sempre vir coisas melhores no futuro.
Um exemplo é o projeto Gabby, um programa de software que usa inteligência artificial para conversar com pacientes que sofrem de dor crônica e depressão, oferecendo apoio emocional, informações e orientações. O aplicativo reconhece o humor, a personalidade e as necessidades dos pacientes, e adapta o seu discurso e o seu tom de voz de acordo.
Juntas, a Boston Scientific – empresa líder em tecnologia de dispositivos médicos – e a gigante Microsoft estão criando um novo parâmetro para médicos e pacientes, baseado em biomarcadores coletados de até 1.700 pessoas que participam de dois estudos clínicos sobre terapia de estimulação da medula espinhal.
A estimulação da medula espinhal é um procedimento minimamente invasivo que consiste em implantar um dispositivo que envia impulsos elétricos para o local lesionado, alterando ou bloqueando a percepção da dor. Com a inteligência artificial, é possível ajustar os parâmetros do dispositivo de acordo com as necessidades e preferências de cada paciente, além de acompanhar a evolução do tratamento por meio de dados coletados de relógios inteligentes, sensores de sono, monitores de frequência cardíaca e registros de voz.
Embora existam programas e projetos avançados como esses, entendo que o feeling com o paciente e a técnica do médico humano, neste momento, são insubstituíveis. Muitos pacientes me procuram depois de tentarem diversos especialistas, entre outras alternativas. Acredito na evolução das máquinas e dos dispositivos inteligentes, e torço para que isso aconteça. No entanto, uma entrevista eficaz com o paciente poderá trilhar, já na sua primeira consulta, os próximos capítulos da sua jornada sem dor.
Diego Daibert Salomão, neurocirurgião, membro titular da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia, é formado em Fonoaudiologia pela Universidade Católica de Petrópolis e em Medicina pela Universidade Federal de Juiz de Fora.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos