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Exposição versus reputação: o povo contra Sergio Moro?

Bolsonaro e Moro em jogo do Flamengo em Brasília. (Foto: Alex Farias/Photopress/ESTADÃO CONTEÚDO)

Uma denúncia caiu como uma bomba sobre o governo Bolsonaro dias atrás, atingindo um de seus principais conselheiros, o ministro da Justiça, Sergio Moro. Uma denúncia do blog de esquerda The Intercept Brasil, que revelou uma série de trocas de mensagens entre membros do Ministério Público do Paraná e o então juiz da 13.ª Vara de Curitiba, colocou em xeque a Operação Lava Jato. Essa narrativa, sem dúvida, foi amplamente utilizada em boa parte da imprensa. Finalmente uma denúncia para escarnecer de uma das figuras mais notórias e controversas na história recente do país. Tomando coro político, a cobertura jornalística mais efusiva já prega uma sentença: Moro é culpado, a Lava Jato deve ser anulada e todos os condenados, soltos.

O enredo catastrófico, que coloca Sergio Moro no centro de uma trama de vingança cujo personagem principal tem uma personalidade que mistura Joseph Dredd de O Juiz, Frank Underwood de House of Cards, Edmond Dantès de O Conde de Montecristo e Carminha de Avenida Brasil, sem dúvida nenhuma, teria potencial para destruir a reputação de qualquer mortal.

Apesar da ampla exposição do assunto na imprensa, o que se observa é que a imagem do ministro segue praticamente inabalada entre o naco da população que se identifica com ele. Essa constatação faz parte de uma análise realizada pela agência Eight, especializada em avaliação de impacto e planejamento estratégico por meio de Big Data, sobre o comportamento do usuário de internet diante de todo esse debate. A agência analisou os mecanismos de busca, especificamente sobre a denúncia apontada pelo blog, para entender de que forma a opinião pública foi impactada. A equipe observou que, apesar de ter sido nomeado ministro da Justiça, as pesquisas pelo nome de Sergio Moro continuam muito associadas à Operação Lava Jato – trata-se de uma correlação positiva de 88%. Quando analisadas isoladamente, as buscas realizadas em nome do ministro superam as pesquisas pelo termo Lava Jato.

Há alguns anos, para se analisar a reputação de uma figura pública, uma empresa ou entidade, bastava avaliar sua exposição na imprensa. Esse retrato foi fiel durante muito tempo, mesmo com o surgimento das redes sociais. Era natural a repercussão de um determinado assunto ser replicada em outros meios. Hoje, no entanto, em um cenário de consolidação das plataformas digitais, o que se observa é que a imprensa continua sendo um meio importante de informação, mas não é mais decisiva para formação de opinião. Desta forma, não basta saber o que se fala sobre algo ou alguém para se avaliar o conceito de reputação. É fundamental analisar a reação da população a esses estímulos.

A imagem do ex-juiz da Lava Jato foi fortalecida entre as pessoas que o apoiam

Isso não quer dizer que reação e formação de opinião sejam a mesma coisa. Compartilhar, curtir ou comentar um determinado assunto muitas vezes expressa apenas uma reação, algo instantâneo, quase mecânico. No entanto, a forma como as pessoas pesquisam sobre determinados assuntos diz muito mais sobre como se forma uma opinião. Se antes o interlocutor era passivo diante do conteúdo, agora passa a utilizá-lo como ponto de partida para um processo de aprofundamento, de pesquisa, inclusive sobre a fonte dessas informações. Isso acontece, sobretudo, quando o consumidor de notícias – seja leitor, espectador ou ouvinte – não se sente plenamente informado diante da exposição de um tema.

Nos últimos dias, o nome do jornalista norte-americano Glenn Greenwald, idealizador do blog The Intercept Brasil, apresentou um crescimento no volume de buscas. No entanto, as buscas envolvendo seu nome e o do ex-presidente Lula apresentam uma correlação de 93,3%, de acordo com o levantamento da Eight. Já a correlação entre os termos "Lula" e "The Intercept Brasil" têm uma correlação de 75,6%. Isso quer dizer que o usuário que pesquisa sobre o jornalista ou seu blog é o mesmo que está em busca de informações sobre o ex-presidente Lula, condenado à prisão por corrupção na Lava Jato.

Por outro lado, embora as notícias envolvendo o ministro tenham gerado ampla exposição negativa, as pesquisas sobre o assunto não chegam a aparecer nem entre os 25 tópicos principais relacionados ao nome de Moro num histórico de dois anos.

Pode-se dizer que a repercussão tem causado um efeito oposto. A imagem do ex-juiz da Lava Jato foi fortalecida entre as pessoas que o apoiam. O arcabouço de dados aponta um cenário, e que foi imediatamente constatado em situações práticas. Três grandes exemplos traduzem essa situação claramente: o primeiro deles é o crescimento da hashtag #EuToComMoro, que liderou os trending topics do Twitter entre os dias 10 e 11 de junho, no ápice da repercussão do assunto, seguido de uma convocação de manifestação a favor do ministro marcada para o próximo dia 30. Por último, literalmente, um teste de campo: quando o ministro esteve no Estádio Mané Garrincha para a partida entre Flamengo e CSA pelo Campeonato Brasileiro, vestindo a camisa do time rubro-negro, Moro foi ovacionado pela torcida. Basta lembrar que seis anos atrás, a então presidente Dilma Rousseff, no mesmo Mané Garrincha, foi vaiada em seu discurso de abertura da Copa das Confederações. Michel Temer passou pela mesma situação durante a abertura dos Jogos Olímpicos de 2016, no Maracanã.

Entre as hipóteses para o fato de as supostas mensagens não surtirem efeito sobre a reputação do ministro diante da população estão fortes indícios quanto ao modus operandi do blog. Embora o The Intercept Brasil se identifique como uma agência de notícias que exerce jornalismo combativo, com a missão de exibir a corrupção e responsabilizar poderosos, o que se observa na prática é um modelo panfletário, típico de jornais sindicais ou fanzines universitários, por exemplo. Quando se refere a poderosos, pelo acervo publicado no blog, o que se percebe é uma nítida vocação para seletividade. Obviamente, parte da população discorda desse modelo de narrativa e irá se opor a ela. Efeito semelhante é observado em grupos que peregrinam e acampam em frente à sede da Polícia Federal, em Curitiba, clamando pela liberdade do ex-presidente enquanto atacam a cobertura da imprensa. A diferença entre os dois pontos é que um reporta fatos e o outro, apenas a suspeita.

Um veículo deve preservar sua fonte. É da natureza do jornalismo. No entanto, quando opta pela divulgação de conteúdo de fonte sob condição de anonimato, cabe a esse veículo a responsabilidade de verificar a autenticidade das informações que publica, sobretudo quando se trata de material investigativo. Hacking é a invasão de sistemas com a finalidade de gerar algum tipo de interferência. É considerado crime cibernético.

De toda essa situação, o que fica nítido é que Moro já fora acusado em função das mensagens que supostamente teria trocado com a equipe que conduz a Lava Jato. Curiosamente, há três anos, boa parte da imprensa que agora assumiu o papel de promotora atacou a decisão de um juiz de primeira instância de divulgar um grampo – autorizado pela Justiça – em que fora flagrado um diálogo no mínimo suspeito entre um civil – investigado pela Polícia Federal – e a então presidente da República. Naquele momento, a contundência da mensagem foi tratada como tema secundário, uma vez que a notícia era a audácia e intempestividade do magistrado.

Se parte da imprensa transformou uma suposta denúncia em tribunal de acusação, a evidência da análise de dados aponta que, no que depender do júri popular, o ministro nunca fora suspeito.

Leandro Bortolassi é jornalista com MBA em Gestão Empresarial e sócio-fundador e CEO da agência Eight.

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