Um belo exemplo do uso da internet vem do casal Bill e Melinda Gates: para a filha mais velha de 10 anos, os dois estabeleceram o limite de 45 minutos por dia. Sábados, domingos e feriados um pouco mais: uma hora. Ao proferir uma palestra no Canadá, Bill Gates conta que a filha protestou:
"Mas pai, vou ter esse limite por toda a minha vida?"
"Não. Quando sair de casa, você poderá definir seu próprio tempo de uso do computador" responde Bill Gates, arrancando risos do auditório.
Uma atitude de pais zelosos e com autoridade. Porém, isso aconteceu há 7 anos. Hoje Jennifer está com 17 anos, é uma adolescente e, nesse curto período, houve imensos avanços tecnológicos e nos costumes. Tampouco o Dr. Google consegue responder à atual postura do casal em relação aos três filhos os outros dois têm 14 e 11 anos , pois residem numa cibermansão de US$ 45 milhões, às margens do lago Washington, próximo de Seattle. É consensual que a internet representa uma ruptura em relação aos consagrados modelos educacionais e pedagógicos, justificando a divisão a.w. (antes da web) e d.w. (depois da web). Diante de nós, descortina-se o fascinante e falacioso mundo do www. A bem da verdade, em nenhum momento da história se ofereceu acesso ao conhecimento de maneira tão ampla e democrática. A contrapartida é que metade de seus bites é descartável, fútil ou perniciosa, especialmente para nossas crianças e adolescentes. Pesquisa divulgada pela CGI em junho de 2013 comprova que 47% dos brasileiros de 9 a 16 anos utiliza o sedutor mundo digital todos os dias, porcentual que na faixa etária dos 15 a 16 anos sobe para 83%. O mesmo Instituto CGI publicou que 62% dos alunos das escolas públicas têm computador em casa, e o índice sobe para 94% nas residências dos estudantes das escolas privadas.
No ano passado, a empresa digital Symantec pesquisou o tempo gasto on-line pelos adolescentes em 14 países, resultando uma média de 11,4 horas semanais. Os brasileiros foram campeoníssimos com 18 horas. Há os que vão além de 3,5 h diárias, sacrificando a sociabilização, horas de sono, cooperação doméstica, compleição física e, sobretudo, os estudos e as boas leituras. Conectam-se com pessoas de Chicago, Amsterdã ou Sydney e mal cumprimentam os vizinhos de porta. Queixume recorrente dos pais, os filhos, mesmo presentes, não param de dedilhar o smartphone; aos professores das faculdades, o que mais aborrece não é mais a indisciplina e sim a displicência do aluno com seu tablet ou notebook, alheio ao tema da aula. É a denominada ausência presencial.
À onipresente interação dos jovens com as telas dos gadgets se faz oportuna a frase do filósofo e epistemologista francês Michel Serres, que mesmo com seus 83 anos é docente da Universidade de Stanford: "A pedagogia modificou-se completamente com as novas tecnologias". A jornalista da Gazeta do Povo, Marleth Silva, sintetiza o último livro deste filósofo: "O ambiente mudou tanto que dá para afirmar que esses jovens são novos seres humanos". Quanto à conduta, isso é inegável e talvez dentro do cérebro humano também, pois pesquisas de neurocientistas já sinalizam que a era digital está alterando as conexões neuronais.
O ciberespaço é simultaneamente virtuoso e pernicioso. Prevalece a popular alegoria da lua cheia: sedutora e brilhante, mas que tem o seu lado oculto. Há apenas 15 anos era inimaginável que, ao alcance de um teclado, teríamos acesso a um democrático e gigantesco conjunto de informações, hoje gerenciados por 3 milhões de computadores do Google distribuídos em mares e terras.
Educar é uma árdua tarefa certamente a mais nobre e requer vigilância, controle, diálogo. Os pais devem conhecer os sites e os games que os filhos usam e orientá-los dentro dos conceitos de segurança e ética. Há softwares gratuitos e pagos que permitem o filtro e bloqueio de sites, histórico e controle do tempo de navegação e até monitoramento a distância. Vivemos em um mundo cada vez mais complexo, porém, nenhuma tecnologia suplanta ou dispensa a presença cuidadora, afetiva e disciplinadora dos pais, mormente no repasse de valores e modelos.
Jacir J. Venturi, professor aposentado da UFPR e da PUCPR e professor da Universidade Positivo.
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