Apesar de todas as atenções estarem voltadas para a crise financeira, iniciou-se mês passado um debate bilateral Paraguai-Brasil que pode afetar diretamente a vida de ambos os países, sobre as demandas paraguaias em relação a Itaipu. Assim, consideramos importante, para brasileiros e paraguaios, entendê-las, principalmente em dois aspectos: a livre disponibilidade e o preço justo da energia.

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Quanto à livre disponibilidade, lembremos que, na época da assinatura do Tratado de Itaipu, nenhum país da região, à exceção do Brasil, tinha possibilidades de consumir a metade paraguaia da energia produzida na usina. O consumo conjunto de Argentina, Bolívia, Chile, Paraguai e Uruguai, equivalia a 80% da futura produção paraguaia de energia elétrica. Dessa forma, não havendo possibilidades de venda a terceiros mercados, o Brasil assumiu o compromisso de adquirir 100% da energia não consumida pelo Paraguai, mesmo sem precisar dela. O que dava segurança de pagamento da dívida por Itaipu, em conjunto com o aval do governo brasileiro.

Hoje o Paraguai reivindica a livre disponibilidade de venda de seu excedente a outros mercados, afirmando que, até então, vem sendo "obrigado" a vender a preço "vil" seu excedente, e que países como Argentina, Chile e Uruguai pagariam "muito mais". Esquecem que, ainda hoje, nenhum país, à exceção do Brasil, possui condições de consumir seu excedente, equivalente, em 2007, a 37 bilhões de KW/hora, ou 41% do consumo argentino.

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Também se esquecem que, em uma situação de livre disponibilidade para venda a terceiros mercados, o Estado guarani terá de entrar como co-avalista da dívida. O que não ocorre na atualidade.

Imaginemos a seguinte situação: o Paraguai passa a vender seu excedente no mercado argentino. A empresa compradora não paga a fatura (em 20 anos, a Argentina declarou moratória duas vezes), e os paraguaios não conseguem, assim, pagar sua metade da dívida de Itaipu, cuja credora é a Eletrobrás. Quem paga a conta? Na atualidade, o Tesouro Nacional do Brasil, único avalista da dívida.

Desta forma, para que o Paraguai possa vender livremente sua energia a terceiros mercados, o governo brasileiro certamente exigirá que o país vizinho passe a ser avalista da metade da dívida que corresponde à Itaipu Paraguai. Assim, a dívida pública externa paraguaia, que hoje é de US$ 2,1 bilhões, passaria a US$ 12,1 bilhões.

Outra reivindicação é que o Brasil pague um "preço justo" pela energia. Consideram que o "preço de mercado" é muito superior ao que recebem. Para saber se o valor pago corresponde ou não a "preço de mercado", temos de realizar uma simulação. Imaginemos que o Paraguai é dono de uma usina capaz de produzir 37 bilhões de KW/hora anuais, e deseje vendê-los, livremente, no mercado brasileiro. Como sabemos, a venda de energia elétrica é feita, obrigatoriamente, por leilões.

De acordo com informações do Ministério das Minas e Energia, desde o primeiro leilão, o preço médio de venda do MW/hora é de US$ 41,10, e vem caindo a cada leilão.

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Isso significa que o Paraguai conseguiria, vendendo desta forma, o equivalente a US$ 1,5 bilhão. Desse valor, o pagamento do empréstimo para a construção da Itaipu Paraguai seria de US$ 1,05 bilhão/ano, ficando livres para uso US$ 450 milhões.

Quanto ganha o Paraguai hoje? Em 2008, Itaipu vem pagando ao Paraguai o equivalente a US$ 46 por MW/hora. Desse total, 61% são utilizados para amortização da dívida, ficando livres para uso US$ 600 milhões ao ano. Ou o equivalente a 20% da pressão tributária guarani.

Este valor pago é 10% superior ao preço médio de outras usinas hidroelétricas brasileiras, 80% superior ao pago no mercado argentino, de US$ 25,60 o MW/hora em agosto de 2008, e o mesmo do mercado chileno.

Conclusão: por falta de melhor estudo sobre a real situação, o governo paraguaio pode terminar com um acordo muito mais desfavorável do que imagina em uma eventual renegociação. Aumentando a dívida externa em 500%, sendo obrigado a conseguir, a qualquer custo, dinheiro para pagar suas obrigações, correndo o risco de não receber pela venda.

Já o Brasil, além de diminuir sua dívida externa em US$ 10 bilhões, pode, aproveitando-se do desespero paraguaio por conseguir fundos, adquirir seu excedente a preço muito melhor do que o atual.

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E se isso ocorrer, a quem irão culpar?

Wagner Enis Weber é autor de "Itaipu e o Paraguai: o renascer de uma nação" e editor da revista Enfoque Económico, do Paraguai.wagner.enis@terra.com.br