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Qualquer que seja o rumo que tome uma reforma tributária, não se pode deixar de ter em mente uma preocupação com a ética da tributação e com a justiça fiscal. Sempre haverá uma disputa por bens escassos na sociedade e deve-se buscar o equilíbrio adequado para o tratamento de contribuintes em posições sociais e econômicas diferentes.

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A nossa Constituição estabelece que compete aos estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre a propriedade de veículos automotores (IPVA), e também que metade do produto dessa arrecadação pertence ao município em cujo território o veículo for licenciado. Veículo automotor é aquele dotado de força motriz própria, seja ele terrestre, aéreo, aquático ou uma combinação destas modalidades, o que inclui obviamente iates, jet skis, aviões e helicópteros, por exemplo.

Quando pessoas com capacidade contributiva deixam de cumprir seu dever fundamental de pagar impostos, porque a lei não lhes exige, as políticas públicas minguam

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No entanto, o Supremo Tribunal Federal decidiu, no ano de 2007, que não há incidência de IPVA sobre embarcações e aeronaves (RE 379.572). Por quê? Em apertada síntese, o STF assim decidiu porque o IPVA sucedeu a antiga taxa rodoviária única (TRU), cuja incidência não incluía – naturalmente – embarcações e aeronaves, e ainda porque somente os veículos terrestres estariam sujeitos a licenciamento nos municípios de domicílio de seus proprietários. Vale dizer que tal decisão não foi unânime e naquela ocasião foram analisados dispositivos da Lei 948/1985, do estado do Rio de Janeiro, mas tais normas também estão previstas na legislação de outros estados.

Precisamos refletir a respeito, pois não parece haver uma intenção da Constituição de excluir veículos automotores náuticos e aeronáuticos da incidência do IPVA.

Como a extinta TRU era uma taxa, ela era um tributo contraprestacional usado na remuneração de uma atividade específica do Estado relativa ao contribuinte. Mas isso não ocorre com o IPVA, que é um imposto e, portanto, tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica. Assim, o IPVA não se destina especificamente à conservação de vias públicas utilizadas por carros e motocicletas, mas sua destinação depende, assim como a dos demais impostos, do que for alocado pela lei orçamentária para o atendimento das políticas públicas em geral.

Ademais, como o IPVA é um imposto sobre a propriedade, e não uma taxa, para fins de incidência não importa quem atua na fiscalização ou no registro de aeronaves e embarcações no território nacional, seja a Anac, seja a Capitania dos Portos, ou até mesmo o Tribunal Marítimo, conforme o caso. Sempre será possível identificar o estado e o município onde está domiciliado o proprietário ou o armador.

O Brasil tem uma imensa frota que possibilitaria a estados e municípios uma arrecadação de bilhões de reais por ano com o IPVA. É dinheiro que faz muita falta. Quando pessoas com capacidade contributiva deixam de cumprir seu dever fundamental de pagar impostos, porque a lei não lhes exige, as políticas públicas minguam por falta de recursos e as pessoas com menor capacidade contributiva são mais oneradas na tentativa de equilibrar as receitas e as despesas públicas.

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Adriano Sant’Ana Pedra, procurador federal, doutor em Direito do Estado, pós-doutor em Direito pela Universidade de Coimbra, professor da FDV.