O ministro da Educação, Abraham Weintraub, na Câmara dos Deputados para detalhar como será feito o bloqueio de verbas de universidades públicas e institutos federais.| Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

No fim de abril, o governo Bolsonaro propôs a contenção de custos em áreas como filosofia e sociologia, ressaltando a importância de habilidades relacionadas à leitura, à escrita e à matemática. O presidente da República sustentou, ao lado do ministro da Educação, Abraham Weintraub, algo que merece reflexão além das críticas superficiais pautadas por paixões políticas.

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O Brasil, como é notório, apresenta dados preocupantes em termos de educação básica da população. Os conhecimentos de língua portuguesa e de cálculos matemáticos, fundamentais na formação de qualquer brasileiro, não são dominados com profundidade pela sociedade, conforme demonstrado por exames internacionais, como o Programme for International Student Assessment (Pisa, ou "Programa Internacional de Avaliação de Estudantes"), além da evidente deficiência nacional no aprendizado do idioma inglês, essencial em um mundo globalizado. Tal panorama ressalta a urgência com que o país deve tratar tais tópicos de ensino, dado que o conhecimento de língua e a habilidade com números são instrumentos para o desenvolvimento da pessoa em diversas áreas da vida.

Em um país que pretende crescer não apenas do ponto vista financeiro, mas, sobretudo, em termos de vida digna, a reflexão crítica sobre a realidade é indispensável

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A declaração oficial no sentido de diminuir o investimento em áreas como filosofia e sociologia parece grave inicialmente, pois são campos de conhecimento relevantíssimos no desenvolvimento do espírito crítico do cidadão. O aprofundamento da visão de mundo de uma pessoa com base em questionamentos acerca da realidade é força motriz das mudanças necessárias para o desenvolvimento da comunidade e a correção de eventuais distorções observadas concretamente. Mais do que formação para o exercício de uma profissão, o estudo de ciências humanas ajuda a desfrutar de modo pleno a própria personalidade, pois permite a análise precisa do respectivo meio circundante.

A melhor compreensão do tema pelo governo aparentemente deveria basear-se em dois aspectos. Primeiramente, cumpre à gestão pública esmerar-se no uso racional das verbas destinadas para a Educação, uma vez que correspondem a percentual satisfatório das riquezas produzidas no país. A questão a ser analisada é a forma como o dinheiro vem sendo aplicado, dado que os resultados não demonstram estar à altura dos respectivos investimentos. Em segundo lugar, a hierarquização das necessidades educacionais, existente em qualquer país, deve ser feita sem que haja desprezo por determinadas áreas do conhecimento que, embora não tragam necessariamente o mesmo retorno financeiro de outras, são fundamentais no aprimoramento do espírito crítico do indivíduo. Para que um texto de filosofia seja bem compreendido, por exemplo, o leitor deve estar corretamente alfabetizado, com o campo linguístico minimamente desenvolvido e com adequado repertório vocabular. Em um país com número preocupante de analfabetos funcionais, a leitura de Gilberto Freyre e Aristóteles por grande parte da população não passará de quimera. O raciocínio crítico continuará a ser privilégio de diminuta parte da sociedade, restando aos demais a reprodução de atitudes que, muitas vezes, provocam prejuízo a si mesmos.

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Devem ser concedidos os instrumentos necessários ao cidadão para o pleno desenvolvimento da respectiva personalidade, algo possível com o estímulo do espírito crítico. A primazia dos conhecimentos linguísticos e matemáticos é indiscutível, pois são meios para o aprofundamento dos demais campos científicos. Não é correto, entretanto, menosprezar áreas como filosofia e sociologia, uma vez que fornecem instrumental teórico para a análise da vida e sociedade, fortalecendo, em última análise, os fundamentos da democracia. Pensamento e existência são termos inseparáveis, como lembra a máxima de Descartes: "penso, logo existo". Em um país que pretende crescer não apenas do ponto vista financeiro, mas, sobretudo, em termos de vida digna, a reflexão crítica sobre a realidade é indispensável. Afinal, como dizia Immanuel Kant, o ser humano é um fim em si mesmo.

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Elton Duarte Batalha, advogado e doutor em Direito, é professor de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie.